Senta que lá vem História! – Fascismo, educação, redes sociais e luta pela democracia

Sobre a barbárie, Claudia, Amarildo, Eduardo e o filho de Tati Quebra Barraco

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Não sei se quem defende “bandido bom é bandido morto!” sabe ler, e não reclamem da forma como essas pessoas são tratadas neste texto dado como elas tratam a questão e as pessoas,mas se souberem ler e pensar, o que duvido, espero que ententam uma coisa:
 
É óbvio que uma pessoa que diz “Não vai ocorrer comigo” pra justificar violência policial, abuso de autoridade e homicídio, que são crimes e tornam o policial um criminoso, esquece de mortes com o a de Amarildo, que foi preso, assassinado e sumiram com o corpo sem que ele tivesse qualquer envolvimento com o crime, ou do Dançarino do Esquenta, o DG, que foi assassinado pela polícia enquanto voltava pra casa.
Esse tipo de pessoa tá com tanta fome de justificar violência policial e com tanta ausência de empatia pelo outro que transforma a realidade em conto de fadas.
Alguns chamam isso de burrice,mas acho que é crueldade mesmo.
 
Pior é que defende crime cometido por policiais pra justificar que “bandido bom é bandido morto”.
Quem é bandido?
A Claudia Silva Ferreira foi assassinada pela polícia e arrastada, tentaram transformá-la em criminosa para justificar sua morte, e é o que fazem com todos os mortos pela polícia.
O menino Eduardo, de 10 anos, foi transformado em “bandido” porque foi assassinado por policiais.
Todo assassinado pelo Estado, todo assassinado por policiais vira bandido, seja ele ou não um.
E isso acontece como se bandido morto não fosse homicídio e significasse que a polícia mandou pro cacete qualquer tipo de respeito às leis.
 
O fato de criminosos serem bárbaros e desobedecerem as leis e matarem pessoas é inerente ao fato de , tcharam, serem criminosos.
Criminosos não obedecem as leis, por isso existem punições, que são determinadas por juízes a partir de peças de acusação feitas pelo ministério público.
A polícia NÃO PODE ultrapassar o limite dela que é o de apurar e prender os criminosos. Quando ela se torna juiz e juri ela comete, tcharam, crime, portanto se torna bandida e ai, se reaça pensasse, o que duvido, entraria pro cálculo de “bandido bom é bandido morto”.
 
Mas independente disso tudo existe o fato óbvio que uma pessoa perdeu um filho porque a PM co-me-teu um cri-me, CONSEGUEM ENTENDER? A PM matou uma pessoa.
Se fosse em legítima defesa, o que as circunstâncias apontam para o fato de que não foi, o policial não responderia por crime, mas a ostentação da morte,etc, a forma como ocorreu indica execução, que é crime.
E ainda assim independente disso,s e houvesse justificativa existe um mínimo de empatia, um mínimo de noção de entender que criminosa ou não a vítima tem mãe, a mãe da vítima não é criminosa por ser mãe e não merece ser tripudiada em sua dor.
 
Se essa direita “de bem” tivesse um mínimo de inteligência, honra, decência, e até coragem nessa cabecinha de soldadinho de cumbo pouco menos válida pra vida humana que nitrato de pó de merda entenderiam isso.
A barbárie chega pra todos, e em especial pro sujeito que naturaliza a violência policial e do Estado. Porque apenas os que vivem nas mais altas esferas estão praticamente livres da barbárie, da classe média pra baixo não existe niguém que seja poupado dela.

Quantas mortes serão necessárias para quebrar o silêncio do poder público de Pelotas?

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Por Gilson Moura Henrique Junior

Historiador

Com cerca de cento e dez homicídios em 2015, Pelotas vive um momento de calamidade pública e entra em 2016 com indícios que o recorde tem tudo para ser batido.

É uma taxa de homicídios a cada cem mil habitantes superior a Porto Alegre (que já supera Rio de Janeiro e São Paulo neste quesito).

Entre os homicídios há um grave índice de feminicídios que impactam sensivelmente a cidade em todas as classes sociais, que atingem desde uma Professora da UFPEL a uma funcionária de loja, passando por uma Guarda Municipal.

A quantidade de homicídios apontados pelos jornais como fruto de motivação fútil também é alarmante.

Há uma cultura de violência da cidade auxiliada pela cultura “bandido bom é bandido morto”.

O combate a essa cultura de violência não ganha nada com saídas retóricas fáceis como a de deixar de investigar mortes causadas por guerra entre facções. A sociedade não ganha nunca com a naturalização da barbárie.

A naturalização da barbárie só alimenta ganhos de quem atua com a barbárie como método, como parte de uma ideia que gera problemas para vender soluções.

A naturalização da barbárie é o combustível para o nascimento de quem lucra com segurança (Legal ou não) e atua no limite da irresponsabilidade, e da legalidade.

Cada homicídio ou feminicídio não são crimes contra as vítimas apenas, mas contra a sociedade, toda ela,mesmo se as vítimas forem também homicidas. O homicídio é a ruptura do aparato legal do estado democrático de direito no que tange à proteção à vida. Se a vida deixa de ser protegida, mesmo a vida de criminosos, o estado democrático de direito rasga a base de sua manutenção.

E o que fazer em caso de tantas mortes em Pelotas?

É inconcebível que Prefeitura e Câmara assistam impassíveis a escalada de violência sem sequer manifestarem-se a respeito nem para cobrar do Governo do Estado providências.

É inconcebível que a esquerda e quem se coloca como alternativa se mantenha reativa,apenas apontando o número de mortes e o aspecto racista e misógino delas.

Cabe ao poder público pelotense buscar soluções para a cultura de violência nem que seja por via indireta, como atuar através de programas de inclusão educativa na discussão da violência nas escolas e comunidades.

Cabe à militância honesta agir propondo alternativas.

Podemos sugerir o combate à cooptação de parte da juventude pelas facções criminosas para além do uso de programas de educação, é pensando em frentes de trabalho que unam educação e trabalho, com remuneração e acompanhamento social, com assistência social, psicológica, médica,etc.

É fundamental também reincluir pessoas que cumpriram pena e voltaram ao convívio da sociedade no mundo do trabalho.

O combate ao feminicídio também ocorre por programas de educação que incluam o debate de gênero e discutam preconceitos que alimentam a violência que descamba para o feminicídio, como também as violências psicológicas que nascem do Bullying contra indivíduos LGBT, pessoas acima do peso, transgêneros e mulheres.

Uma educação cidadã é também combate à crescente violência urbana e atua no longo prazo para a redução dos índices de homicídio e feminicídio.

Além de tudo, medidas municipais de fomento ao desarmamento,com campanhas educativas e convênios para a troca de armas por benefícios, objetos de consumo ou brinquedos, são muito bem vindas.

Mas o que faz o poder público municipal? O que faz a Prefeitura? Sequer debate a violência, atua de forma reativa, quando e se atua, ou finge que nada acontece, comemora com promoção de festas e propaganda feliz que entregou a saúde para organizações sociais sem sequer resolver o problema do atendimento nas UBS existentes.

Pior, tem como medida o armamento da guarda municipal, o que é notório problema porque não basta treinamento para saber atirar pra tornar um Guarda Municipal armado um instrumento de segurança pública.

Segurança pública é cosia séria, não basta dar armas para tornar um agente em um ente pronto para atuar na segurança. Se a Brigada Militar, com todo treinamento, tem problemas sérios de atuação, pelo perfil de treinamento,imagina a Guarda municipal cujo treinamento sequer tem o mesmo período que o dos brigadianos?

E a câmara, por que não cria a CPI da violência urbana em Pelotas para investigar se os poderes públicos estão atuando de forma eficiente no combate à escalada de violência e cobre a divulgação pormenorizada dos dados sobre os homicídios na cidade de Pelotas? Quantos homicídios são crimes de ódio? Quantos são guerra entre facções? Quantos são os feminicídios?

Os Movimentos Sociais como GAMP (Grupo Autônomo de Mulheres de Pelotas) e o Movimento Negro corretamente atuam denunciando a violência e seu caráter racista e misógino,porém (ai,porém) falta ir além, falta um amplo fomento ao debate sobre a violência e medidas integradas de combate à ela, com o uso das escolas, universidades e espaços públicos como meio de combate e debate.

Além disso, é fundamental capilarizar as ações, indo às periferias, que hoje são os principais focos de violência (E de abandono pelo poder público) que atinge principalmente negros e mulheres.

Não basta atuar apenas em atos pontuais de denúncia, é preciso ir além e pressionar o poder público e as universidades para serem mais que meros espectadores na escalada de violência que permeia a cultura pelotense e a incita a ser mais e mais violenta.

É preciso combater o jargão “crime passional” imputado a feminicídios, que funcionam até como argumento de defesa para o criminoso,mesmo se for réu confesso, e vira culpabilização da vítima.

Não pode haver desculpas para a não investigação. Segurança pública é coisa séria.

É preciso que Câmara e Prefeitura cumpram seu papel como poder público e atuem para combater a cultura de violência, além de exigir explicações.

É tempo de resoluções de ano novo, fica aqui a dica de resoluções úteis para a Prefeitura e Câmara.

A verdade, o unilateralismo, a beleza, o índio, o negro e o black Bloc

images (1)Todo pensamento unilateral contém o inevitável autoritarismo. O entendimento de algo como uma verdade única, centrada em uma objetivação da realidade é automaticamente inibidor da diversidade e portanto da democracia.

Esta “ditadura” reflete-se na sociedade de muitas formas, desde a lógica do padrão de beleza unitário, que exclui gordas e negras do belo, até o entendimento da ideia de progresso como ligada intimamente ao aquecimento da economia, ao aumento de consumo, ao aumento e desenvolvimento das “forças produtivas”, como se fosse um ligar de uma locomotiva faminta e sem freios na direção do abismo.

201109070815340000004175Produzir significa acumular capital, conforme o pensamento hegemônico, produzir significa consumir matéria-prima e energia para que bens sejam construídos, consumidos em nome de um bem-estar intimamente ligado ao ter. Esta ideia de produção é o carro-chefe de uma ditadura de entendimento da realidade, de um pensamento único, que se vale da concepção que produzir, viver, ter, estar, morar são estados relacionados diretamente com a ideia de propriedade, com a ideia de economia com valoração de cada elemento ao redor do homem, inclusive ele, seja terra, ar, água, bichos, plantas, como se todos tivessem um preço, como se o valor de uso e troca fosse natural, nascesse com cada item da realidade ao redor do homem, líder máximo de uma lógica onde o homem é o centro do universo.

la-pensee-uniqueEsse entendimento é complementado com a recusa de percepção de qualquer outra forma de entender a realidade, de qualquer percepção cultural divergente, como passível de alguma “razão” ou sentido. A concepção de etnias indígenas da terra como parte de um organismo vivo, como elemento fulcral da existência deles para além da economia, da produção, do valor continente no uso da terra, vira anátema, pois bate de frente com a lógica, o pensamento único em torno do qual se ergue a economia e a lógica de vida ocidental, cristã, branca.

Outro aspecto da ditadura do pensamento único é a ótica do que é bom ou não para segmentos inteiros da população. Pobre morar na favela? Não pode e jamais passa na cabeça das pessoas a possibilidade urbanizar a favela, de que favela seja cidade. Greve? Atrapalha o trânsito. Proibir carro no centro das cidades? Atrapalha o direito individual da posse do automóvel, dane-se se o transporte coletivo permanece secundarizado em nome do individualismo egoísta, consumidor de combustíveis fósseis que aceleram os efeitos do aquecimento global. Lutar pelo fim dos combustíveis fósseis? Maluquice, a economia EXIGE crescimento e isso EXIGE energia, EXIGE, o conforto individual, a matriz energética em uso é o petróleo e não se fala mais nisso, energia renovável e alternativa são caras demais!

20090207_non.pensamento.unico.grandeE palavra em torno de muitas destas questões é “custo”, é a centralidade do “custo”, do aspecto monetário sobre todo e qualquer entendimento relativo à lógica do bem viver como mudança dos paradigmas de civilização, para além da precificação da vida, das pessoas, das cidades, da terra, das matas, do existir. O “custo” das coisas é central, o “custo” das coisas é o eixo em torno do qual giram a lógica que prioriza, hierarquiza o que deve ou não ter a economia direcionada para realizá-lo, ou seja, o que é prioritário para a população e sociedade é decidido em torno de “custo”.

E quem decide? Como se dá o processo “democrático” de decisão? Há democracia? Se chega ao todo todas as informações, todos os meios de decidir, o que está em jogo?

imagesPoderíamos elencar também problemas relacionados ao processo de veto à homossexualidade, de repressão à orientações sexuais diversas, à transsexualidade, à ideia do papel da mulher, à lógica de respeito à diversidade étnica, ao racismo, ao racismo ambiental e tantos outros efeitos da ditadura do pensamento único, que parte de uma hegemonia cultural elitista e chega aos jornais e Tvs e é reproduzida, naturalizada, tornada como um elemento dado da vida cotidiana, imutável, asfixiante.

E todo pensamento contra hegemônico é crime, é criminalizado.

Todo método contra hegemônico é crime, é afastamento do povo das lutas, é afastamento da regra, da lei, do bom comportamento, dos bons modos, do bom senso.

E é por isso que toda criminalização dos Black Bloc tem um pouco de navio negreiro.

A dimensão da utopia, a revolução e os novos Lênins

 Road_to_utopiaTratar de mudança política não é exatamente simples, tampouco receita de bolo. A dimensão da transformação tem tantas miríades de sentidos possíveis subjetivos a serem lidos em atos, palavras e movimentos, que a simplificação de um método ou de uma ideia de estado, ou de mesmo uma só ideia de revolução é delírio simplificador.

Se ler a realidade concreta fosse fácil e apontasse para um só sentido unitário não haveria desde sempre um mar de pensadores mundo e história afora, cada um com sua percepção de uma realidade, de uma verdade ou até da não-verdade.

A questão é que cada contexto histórico, cada conjuntura, aponta sinais identificáveis de novas formas que a multidão de gentes por vezes denominada “povo”, “massa”, “massona” ou “povão” (quase sempre por quem se aparta dela para defini-la com distância segura) interpreta se não o real a ruptura com o que entende como sistema ou peso opressivo de alguma realidade.

Cada contexto histórico traz suas insurgências, traz suas permanências, traz suas rupturas e conservações e é necessário que cada pensador ou militante que pretenda transformar este real lê-las, olhá-las nos olhos, preocupados menos com encontrar a verdade verdadeira única de todas as coisas e mais com antecipar minimamente uma tática de intervenção que consiga atrair o máximo de gente possível para oque defende como eixo de ações transformadoras.

É, amigão, to falando de convencer pessoas que tua tática revolucionária é o lance.

img_ju427-06bNeste contexto atual, por exemplo, o próprio questionamento da relação entre movimentos, partidos e ativistas com o cotidiano político é questionado. A própria relação entre os movimentos, as pessoas e a atividade política é jogada aos leões em busca de demolir concepções quadradas de vida, de militância, de relação com vidros, vidraças, mundo, ambiente, amor, mídia.

A dimensão contestatória não tá ai para fingir que não vê a frase maldita cheia de homofobia do sujeito que em tese diz que quer mudar o mundo.

A contestação, caras pálidas, não tá vestindo o fraque mediado do fanfarrão da esquina, tampouco o papo brabo de que “povão é assim”.

A contestação quebra vidraça do Itaú,a contestação arrebenta a secadora do Xingu, invade usina, ocupa Câmaras, derrete leninismos de salão querendo mais que conversinha nas terras Quilombolas, na avenida Paulista ou na praça onde Feliciano-RS prendem pessoas que se beijam em um espaço público ocupado por ele indevidamente em nome de uma só vertente de uma só fé, atropelando a laicidade do estado, atropelando a democracia de um estado cujo emblemático simbolismo de um Pastor Deputado (jamais um Deputado Pastor) chamando a polícia para reprimir lésbicas se beijando EM ESPAÇO PÚBLICO é eloquente.

street_art_24A contestação não trata a dimensão do sonho como um “Além da Imaginação”, uma “Twilight Zone” promovida por esquerdóides, amiguinhos. A contestação chegou à sala de aula, e não na cabeça de estudantes, mas na de professores precarizados em greve numa das principais cidades do país.

A contestação tá na rua derrubando um dos governadores centrais para a política do PT e para concepção de cidade mercadoria, de mundo mercadoria, de Brasil Grande neodesenvolvimentista com fome de petróleo, com fome de carbono, de escolas, de postos de saúde, de consumo que nos consome enquanto gentes a trabalhar doze, treze, quatorze horas para pagar os carnês das dívidas enquanto deixamos a vida no prelo.

A contestação pegou a dimensão do sonho gritando que não era por vinte centavos enquanto militantes amestrados pro revistas, blogs e sites de partidos acostumados com a cadeira acolchoada do poder dizia se tratar de Vândalos e Baderneiros.

imagesA dimensão do sonho voltou numa contestação mascarada que lei nenhuma vai desmascarar e enquanto isso ainda existem citadores compulsivos de Lênin procurando pelo em ovo pra justificar qualquer coisa em nome de mandatos acomodados, acostumados a pedir em vez de exigir, a criar espantalhos para a fome de moral e bons costumes de quem pede o fim da corrupção como se pedisse pães franceses na padaria mais próxima.

E enquanto a dimensão do sonho renasce com utopias múltiplas, dissonantes e polifônicas, como deve ser, a exigência de novos Lênins é clara, imensa, nítida. Mas exigem-se novos Lênins com menos fome por construir estacas fundadores de novos países e novos estados, mas canais para o fluxo contestatório passar derrubando represas.

São precisos Lênins que construam o diálogo, um diálogo amplo, que aprendam, que ensinem, que se joguem, que quebrem, que requebrem, que riam, que sambem, que ouçam a polifonia menos buscando a síntese perfeita e mais aprendendo que ruptura pode sim rimar com gostosura, com liberdade, com vontade e com verdades, sim com s, por muitas, imensas, gigantes, que nunca dorme, que se soltam noite afora quebrando tudo até a última ponta para derrubar Cabrais e outros ditadores mal-acostumados a achar que a voz das ruas é rouca, enquanto sempre foi doce.

images (3)São precisos novos Lênins prontos a divertirem-se recuperando a utopia, a dimensão do sonho em que Garibaldis, Bakunins, Marx, Engels fizeram a primavera dos povos.

Porque sempre precisamos de mais primaveras.

Tem santo que se quebrar não dá galho: A Marcha das Vadias e a intolerância religiosa seletiva

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Sabe o que tem me incomodado na parada da quebra da Santa da Marcha das Vadias? A cagação de regra e a critica seletiva à intolerância religiosa.

E não, não me refiro aos críticas da marcha porque podia ter dialogado mais e não ter feito no dia, desses eu discordo, mas entendo a critica.

Tampouco de quem criticou a quebra da santa como erro tático, porque concordo que foi um furo, mas discordo de erro tático da marcha que não tem nada a ver com aquilo.

Acho legítima a quebra da santa e o gesso no fiofó, embora discorde.

Sim, é possível isso, não é preciso apenas ou condenar ou aprovar, é possível qualificar uma critica e ir além de binarismos babacas.

Só que o que vem me incomodando é que 90% e quem condena a quebra da santa foca só nisso, pega só nisso e em geral são homens, o que é sintomático.

Aliás, quem não é homem criticando já esteve envolvido em machismo direto ou indireto.

E acho muito engraçado que criticas a quem na marcha “radicalizou”, são notadamente ladeadas por uma série de indicações do “crítico” a como a marcha deve se comportar. Indicações estas que vão desde condenação também às “mulheres nuas” ao foco enfático na quebra da santa, um ato de 30 minutos feito por duas pessoas em uma marcha de três horas onde estiveram milhares.

Ou seja, o foco na quebra da santa esse ano foi sim, como bem disse a Senhorita Bia, igual ao ano passado na ocupação da escadaria da igreja e será ano que vem no que quer que seja, pois o problema não é o choque de gesso no cu em uma performance onde se quebrou a santa, mas é a marcha.

São as mulheres na rua, estúpido!

Aliás, eu fico impressionado como se ama imagem de santo..

Porque olha…. Adoraria ver essa santa indignação relacionada à quebra de imagens de santo em terreiros de Umbanda por evangélicos, com ênfase igual, fome igual.

Eu mesmo já postei váaarias vezes notícias a respeito: Indignação zero.

Me parece que existem imagens e imagens, imagens que quebradas ofendem, se feitas diante de católicos, e que se quebradas não ofendem. Se os donos da imagem forem praticantes e sacerdotes de religiões de preto que se fodam.

Sim, porque além do machismo implícito nas cagações de regra há o choque seletivo, um choque branco, católico e cuja noção de intolerância religiosa passa ao largo da intolerância da religião com as mulheres, os gays, quem defende legalização do aborto,etc.

 Sim, porque a organização da JMJ distribuiu fetos de plástico e uma cartilha de “bioética” que ofendia brutalmente gays e trans, cês sabem,né? Não? Ué, cadê a santa indignação ao contrário? Ou pode? quando a fé remove os limites entre o religioso e o secular e ofende grupos sociais inteiros pode? tá de boa?

Também passa ao largo o choque com a intolerância religiosa se a religião não é branca e o Cristo não tá crucificado na parede.

E me sinto absolutamente à vontade para entrar na seara da quebra de santo e na indignação,  porque como umbandista jamais vi tanta ira santa quando as imagens quebradas são as de preto, quebras essas aliás que foram celeremente chamadas como exemplos para condenar a quebra da imagem na marcha das vadias, porém NUNCA tiveram tanta atenção, inclusive de muitos que as usaram como exemplo, quanto teve a quebra na JMJ.

Aliás, parabéns aos que quebraram a santa na Marcha das Vadias, porque levantaram mais uma questão: Que intolerância religiosa é essa que é tolerada, invisibilizada quando atinge religião de preto, mas ganham páginas e focos de mídia e dos neo-chocados quando atinge a religião branca, católica da tradição, família e propriedade?

Vamos ter cuidado com a rapidez das criticas à “intolerância religiosa” e ao binarismo e vamos pensar mais um pouco sobre o quanto nós acabamos é defendendo um status quo e n;ão nos indignando quando este mesmo status quo é tolerante e opressor?

Fica a dica.

O julho Papal e a má fama de Cabral

Sérgio-Cabral-e-o-Papa-por-PelicanoO que significa o Papa Francisco I no Brasil neste mês de Julho?

Este texto não começa à toa com uma pergunta, pois se pretende menos uma afirmação e mais ser um provocador, um questionador, talvez para que as respostas sejam menos soluções e mais apontamentos.

Existem vários quadros possíveis para responder a esta pergunta e outras, alguns desenhos são cabíveis de serem feitos a partir de indagações no plano da política local, nacional, internacional, na relação entre religiões, entre a Igreja Católica e a mídia, entre o Governo brasileiro e o Vaticano, entre os megaeventos e os planos do estado e entre a população e os poderes.

Um deles diz respeito ao que foi projeto pelo Prefeito do Rio, Eduardo Paes, e pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, no que tange aos negócios que seriam/foram feitos em nome dos mega eventos como a Copa e a Olimpíada, e em menor grau a Jornada Mundial da Juventude, e o resultado final do impacto da JMJ no cotidiano de ambos e mais, na imagem da cidade/estado do Rio de Janeiro para com o mundo, preocupação número um dos governantes/gerentes do capital e cujos gabinetes tem sido chamados pela oposição, a meu ver com razão, de balcão de negócios.

Deu certo? O investimento em nome da venda da Cidade do Rio de Janeiro como cidade-evento, ou cidade-mercadoria, teve retorno? Fortaleceu a cidade enquanto marca? Fortaleceu a cidade enquanto infra-estrutura?

Acredito que as panes no sistema de transporte, na própria infra-estrutura erguida em Guaratiba e que sucumbiu à lama das chuvas, responde às perguntas e aponta para um caos maior em eventos com previsão de maior envergadura na exigência de transportes,etc. Aliás, um dado a se pensar é que o prefeito e o governador declaram feriados nos dias da JMJ, parciais ou não, e que para usar o Metrô o cidadão carioca que não tivesse passe especial era simplesmente barrado, e mesmo assim deu pane.

Outro quadro é da relação entre o povo carioca, em protesto quase diário pela queda de Cabral desde o fim de Junho, e os governantes diretos e indiretos, Eduardo Paes, Sérgio Cabral e Dilma Roussef.

A presença do Papa não arrefeceu ânimos protestantes, e se os protestos tinham menos gente, não era, ou foi, desprezível a quantidade de protestos com cerca de cinco mil participantes tanto na sede do governo do estado quanto nas proximidades da residência de Sérgio Cabral, e todos sendo recepcionados mais cedo ou mais tarde pela violência policial que atira bombas de gás lacrimogêneo em hospitais.

A relação entre protestos e violência policial, que Cabral usou tentando desviar denúncias contra si, atingiu um limite tão grande que levou o governador a criar uma comissão especial para investigar vandalismo, investindo na dicotomia Vandalismo x Policia, que teve de revogar ao fim de tantas denúncias de inconstitucionalidade.

Para completar o nível de perda de controle do governador por sobre as tropas e aliados, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, em entrevista exclusiva à Mídia Ninja, fez questão de se descolar do aliado mor, ou ex-aliado mor, Sérgio Cabral.

Cabral, ao fim e ao cabo, ao revogar o decreto que criava a CEIV (comissão especial de investigação sobre vandalismo) entregou às baratas o Secretário de Segurança do Rio e o comandante da Polícia militar como responsáveis diretos pela truculência policial, como se o comandante em chefe da Polícia, ele Cabral, não tivesse nada a ver com isso.

A truculência policial ocorreu também com o Papa no Rio, pra ampliar o grau de desmoralização do Governador, ou seja, como cidade mercadoria o Rio de Janeiro fracassou tanto na infra-estrutura para megaeventos quanto na habilidade de conter manifestações sem a proverbial truculência da polícia ainda militar do Rio de Janeiro.

Para agravar a situação o quadro expôs danos quase irreversíveis, a um ano da eleição, ao muro do outrora paraíso da popularidade de Dilma, Cabral e Paes e expôs também crises palacianas mal ditas pelo cotidiano de sorrisos e felicidades entre PT e PMDB.

As resposta de Cabral aos protestos ampliaram-nos e mais, derrubaram a popularidade dele, de Paes e de Dilma, que por razões de “governabilidade” não tem como descolar-se imediatamente do outrora primeiro aliado.

A lusitana roda ainda trouxe consigo o PT Carioca em profunda crise, já que o partido tinha membros entre os que filmavam os movimentos a partir da mídia alternativa, entre os próprios protestantes e entre quem condenava os protestos a partir de uma lógica delirante que os protestos contra Cabral, assim como todos os protestos de Junho para cá, eram no fundo um golpe armado contra a toda poderosa salve salve iluminação popular do Partido dos Trabalhadores em todos os níveis de governo, governabilidade e aliados.

Essa crise do PT não passa despercebida aos aliados ou adversários, e se reflete na lógica pressão para que o PT saia dos governos Cabral e Paes, e mais, ecoa na imagem de Dilma que tentou se construir como uma governante que “ouve as ruas” tentando ignorar a extrema inabilidade da mesma em responder aos protestos sem emprestar a Força Nacional a governadores, inclusive tucanos.

Aliás, essa crise do PT se reflete imediatamente na dicotomia entre estar nas ruas e nos governos, protestar contra Cabral enquanto sua presidente da república mantém um apoio explícito e tem em metade dos programas construídos no Rio como testes para uma plataforma nacional (UPPs, UPAs, Megaeventos) e mais, ser “esquerda” com políticas de direita, sendo secretário de direitos Humanos em um governo que os viola com sua polícia truculenta.

No plano da relação entre o Governo Brasileiro e o Vaticano a coisa fica um tanto mais enrolada.

Desde a assinatura entre o Governo Lula e o Vaticano de tratados que buscavam minimizar a aproximação oficial entre o PT e fundamentalistas religiosos ligados ao neo-pentecostalismo a partir do reforço do reconhecimento de instituições educacionais e de “caridade” vinculadas à Santa Sé, reforço na isenção tributária de igrejas,etc, o Governo do Brasil buscavam elementos simbólicos que deixassem clara que as relações entre o Governo do Brasil e evangélicos não seriam as únicas que o Partido dos Trabalhadores travariam para manter um grau de governabilidade e de laços e alianças políticas com as bancadas ligadas às religiões.

Ao fazê-los, os tratados, o Governo Brasileiro iniciou um processo de aproximação que com o governo Dilma Roussef e sua boa relação com o atual Papa Francisco I, ganhou fôlego.

Ao mesmo tempo a Igreja Católica precisava também do Brasil para focar sua ação “evangelizadora” e fazer uma demonstração de força ao mundo exatamente onde as igrejas protestantes mais cresciam. E a JMJ deu a ambos um meio de fortalecer laços e de demonstrar poder.

As reações dos Evangélicos fundamentalistas não tardaram a aparecer e isso pode ter um preço na costura da ampla rede de laços e alianças que o PT e o Governo travaram para manterem-se governando uma coalizão outrora poderosa, mas que diante da reação popular parece ruir a olhos vistos.

Outro elemento desta relação foi a aposta da principal rede de televisão do País, a Rede Globo, na transmissão da Jornada Mundial da Juventude como evento prioritário, invadindo inclusive ou outrora sagrado futebol de domingo e carro chefe da emissora.

A emissora, que estava se aproximando das lideranças fundamentalistas e buscando um contraponto à Rede Record, e outras emissoras que centravam fogo em programas voltados aos evangélicos neo-pentecostais, pela via do mercado Gospel, ao partir para a transmissão do evento católico como foco prioritário de sua programação optou deliberadamente por fazer parte da órbita da política do Vaticano de demonstração de força no principal País Católico do mundo, o Brasil, que via o avanço das igrejas evangélicas e de pastores como Marcos Feliciano dizendo que a igreja Católica era uma religião decadente.

Esta aposta se deu ao mesmo tempo em que a emissora mantinha-se como porta-voz da polícia militar e do governo do estado no que tange à manifestações populares, ó rompendo quando as imagens que circulavam via redes sociais impediam uma luta eterna contra o óbvio. A mesma relação se repetia na relação da JMJ e a cidade vendida pelo prefeito como pronta para megaeventos, só rompida quando as falhas no sistema de transporte se negaram a acompanhar a venda do mundo da fantasia.

Dá pra fazer mais relações entre a emissora mor do Reino e o principal partido no Brasil de hoje, o Prefeito Eduardo Paes e o Governador Sérgio Cabral, mas fica para outra hora, deixando apenas a sugestão de quem recebe mais verbas do Governo Federal entre emissoras e empresas de mídia.

Este julho Papal criou muitas dúvidas, apontou cenários, revelou fraturas e caminhos que muitas relações entre quadros podem se dar. Indicou falhas no Rio como mundo perfeito que vendiam para Inglês ver.

Nós que fomos um Rio da mais perfeita governabilidade, acordamos e somos um Rio que protesta com Papa e tudo.

Nós, que fomos um Rio que amava Dilma, Cabral e Paes, acordamos gritando a plenos pulmões que o Papa é BOPE.

Nós, que fomos um Rio pintado à mão pelos melhores publicitários, acordamos com um Papa e a ideia de que somos um Rio menso preparado, mais cheio de lama e gás lacrimogêneo do que supunha a vã filosofia do coro dos contentes.

Nós, que fomos um Rio de obras, agora somos um Rio que pergunta onde está Amarildo?

É o machismo, estúpido!

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Enquanto a cada dia dez mulheres morrem decorrentes da violência contra as mulheres, a cada dia mais um homem vive se enfurnando em seu machismo confortável e se ofendendo quando algum oprimido conquista algum direito ou visibilidade de sua situação, em essência mulheres e gays.

Enquanto a cada dia mais e mais mulheres saem às ruas defendendo seus parcos direitos conquistados com muita porrada e conquistam mais direitos com mais porrada ainda, mais um homem aparece e desqualifica toda a masculinidade tentando igualar a violência contra a mulher das muitas violências que os homens recebem, cagando para a diferença estatística e específica das muitas violências contra os homens e da especificidade da violência contra a mulher.

A relação entre mulheres estupradas e homens violados é amplamente desfavorável em números às mulheres, que sofrem muito mais este tipo de violência que tem a ver com poder e não com sexo, com muito mais frequência e número que homens (em geral vítimas desta violência em situações específicas de ausência de mulheres em ambientes fechados).

A quantidade de mulheres mortas por se separarem dos parceiros, por saírem da casa dos pais sem casar é imensa. Homens sofrem com isso? Menos de um a cada dez casos. A violência que os homens sofrem decorre muito mais de disputas entre homens, de brigas, crime (roubo e disputas) e violência policial do que pelo crime passional, onde a maioria dos homens envolvidos é autor e não vítima.

Qualquer mísera pesquisa em torno do assunto já feita aponta para esses dados, é simples até de pesquisar, mas qual machista se dispõe a isso se qualquer ameaça de perda de hegemonia na opressão os põe em estado de defesa?

E existem trocentas fontes de dados comparáveis, de lógicas a serem pensadas, mas este post não é um documento estatístico, é um lamento em fúria: É vergonhosa a quantidade de homens que se tornam incapazes de assumirem que possuem privilégios, pior, é imensa e vergonhosa a quantidade de homens que dizem que são oprimidos pro viverem menos que as mulheres.

Sabe por que homens vivem menos que as mulheres? Posso enumerar:

  1. Homens se envolvem mais em acidentes automobilísticos, em mais infrações de trânsito e em geral são as maiores vítimas de acidentes envolvendo excesso de velocidade e embriaguez. E Não, não inventei isso, é exatamente por isso que o seguro de automóveis para mulheres é mais baixo, o capital percebeu isso, que homens são mais imprudentes, e usa isso. Homens são vítimas da própria educação machista de supremacia, do jugo da testosterona e por isso precisam ser mais velozes, ter o carro mais potente, numa espécie de sublimação sexual do tamanho da piroca e da virilidade sexual.

  2. Homens são as principais vítimas de armas de fogo e em geral, a maior parte, ou por violência policial ou por brigas entre dois homens. Sim, queridos, os principais assassinos de homens são outros homens e sim, queridos, em geral por envolvimento de uma lógica de posse de mulheres, entendendo mulheres como propriedade e defendendo esta posse de macho alfa até o limite. É esta mesma punção que mata as mulheres vítimas de violência doméstica, é essa mesma lógica de propriedade e “territorialidade”.

  3. Homens são principal grupo de risco de doenças cardíacas, abuso de álcool, drogas,etc. Homens são a maioria entre os fumantes. E sabe por que? Porque há uma relação psicológica entre um sentimento de invencibilidade e de “tudo posso” que os homens recebem em sua educação machista e que os põe em direção ao cadafalso dado que a eles tudo é permitido.

Em suma? A educação machista mata o homem tanto quanto as mulheres, uns pela libertação total e poder absoluto, elas pela opressão. O que a mulher tem de vantagem por serem limitadas a todo custo de qualquer ação, seja de risco, seja de abuso, tem de prejuízo pela construção de um lugar subterrâneo à sua vontade, de uma tutela, de uma limitação de ir e vir, de julgar, de uma reificação como posse de homens, sejam pais e irmãos, seja marido ou namorado.

Então se um homem diz: “Nós temos uma expectativa de vida menor que as mulheres”. Responda: Sim, tem, mas tem porque este é o ônus do mundo de privilégios assumidos só por ser homem. Da mesma forma a opressão tem míseros bônus às mulheres, educadas para a contenção e a postura de correr menos riscos, naturalizadoras do status de presas de predadores e por isso mais cuidadosas no ir e vir, no andar nas ruas,etc.

Então o privilégio tem seus preços, amigos. Assim como a prisão tem seus bônus, o que não torna homens em oprimidos e as mulheres ao conquistar direitos em opressoras.

Então amigos, se a vocês parece ser privilégio uma lei que tipifica o crime de feminicídio, repensem, porque pode estar ai a raiz de seu machismo e sim, é seu dever combatê-lo.

Nesta guerra é preciso assumir lados, o meu é o das vítimas.

Não há mais tempo de tremer às mortes: do PT em diante.

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Acaso um ser humano adulto durante os anos 1930 fosse transportado para 2013, seria difícil explicar pra ele que a História não foi um processo que deu uma vitória permanente ao conservadorismo e ao fascismo.

No Brasil especialmente a derrocada do PT de Esquerda, substituído pelo PT de Ex-querda que publica em redes sociais um “Vai pra cima dos índios!” em nome da defesa de um desenvolvimento erroneamente confundido com avanço imparável de uma locomotiva genocida, trouxe à baila com cumplicidade do Partido dos Trabalhadores, um samba de enredo ruim, evolução escabrosa e cuja harmonia não rima lé com cré rumo ao caos.

A marcha conservadora no Brasil não explica-se apenas por si mesma, explica-se pela cooperação feérica do Partido dos Trabalhadores em sua construção a partir do entendimento que construir uma governabilidade que o mantivesse no alto da gerência do capital, e do estado para o capital, saísse do plano da tática para o plano da estratégia, abandonava o posto de prática provisória, para tornar-se práxis, ou método permanente.

A lógica da governabilidade para a execução de uma atividade fim vinculada com a transformação do Brasil foi substituída por uma governabilidade executada para a execução de uma atividade meio que é a manutenção do aparato burocrático para o comando do Brasil.

O que antes era dito como “Precisamos governar para mudar a vida das pessoas” foi substituído por “Precisamos governar, mudamos a vida das pessoas” e essa construção não inclui apenas o entendimento do merecimento do status de governante, inclui antes de mais nada o entendimento da necessidade quase adicta de ocupar espaço burocrático para ostentar um poder que se entende como “desígnio” como “destino manifesto”.

Não à toa a relação próxima entre os empedernidos defensores do Governo Petista, e sua megalômana e leviatânica coalização governamental, se aproximam ao fanatismo fundamentalista religioso no entendimento de uma legitimação automática de todo e qualquer ato governamental dado que este é aquele escolhido para transformar o Brasil em um acelerado e transformador veículo de condução do progresso. O problema é que esse progresso só lembra avanço se o imaginarmos como uma máquina destruidora atropelando tudo à sua frente que não consegue ou conduzi-lo ou resistir a ele.

Para agravar essa lógica perversa a relação entre destino manifesto de ocupação do poder com a governabilidade a qualquer preço, a lógica da governabilidade e do inegável poder conquistado com méritos político-pragmáticos levou ao PT a abraçar com desenvoltura tudo o que lhe permitisse não só garantir um poder nunca visto antes em tempos democráticos sobre congresso, estados e municípios, como também minar o exército adversário através da tática de cooptação de lideranças que antes eram base tucana.

O exercício dessa cooptação levou à construção de alianças com a mais perversa direita e fundamentalistas religiosos em um processo que já estava em curso com relação a outras legendas, especialmente nas coalizações regionais, e que foi levado para dentro do PT que federalizou o processo regional. Com essa tática, o PT reduziu a oposição oficial, partidária, a quase zero, a natimorta, a um espantalho bobo que só assusta quem cai nos contos de fadas despolitizados que a claque brande mundo afora.

O problema da tática é que o PT virou inicialmente um refém de sua própria necessidade, sendo obrigada manter práticas que sua história renegava em nome do objetivo final de manter-se a todo custo no governo. E com essa ação ele acabou trazendo para dentro de seu arco de alianças a oposição que mantinha fora. Esse processo inicialmente fez o PT oscilar entre recuos e avanços da agenda dessa oposição intestina à suas bandeiras históricas, porém no decorrer do tempo o processo iniciado por Lula de assimilação das forças políticas que podiam gerar algum tipo de ruído (e que inicialmente compreendia a própria base social do PT, movimentos sociais,etc, cooptados sem dó nem piedade no decorrer dos anos Lula) passou da assimilação de nomes e partidos para a assimilação de programas e o que era externo ao PT, que engolia em nome de um projeto, virou o próprio PT, que agora tem inclusive entre seus quadros quem sustenta discursos similares ao mais abjeto fascismo de Malafaias, Bolsonaros e Felicianos.

E nesse processo o que se vê é a percepção por parte do PT e do Governo de que esta agenda conservadora e fascista não é uma agenda problemática e que os movimentos e pessoas que sustentaram a chegada do PT ao poder, e antes ao estágio de maior experiência da esquerda mundial, não são mais necessários.

O ataque aos direitos das minorias e o patrocínio de homofóbicos e suas políticas levados a cabo pelo PT são a marca disso. O ataque aos povos originários, indígenas e quilombolas, em prol do avanço do agronegócio não são efeitos colaterais da tática, são a própria tática, são a escolha de um lado, o do dito desenvolvimento do país, sendo que desenvolvimento é visto como crescimento de indicadores econômicos e não necessariamente de melhorias estruturais para a população brasileira, que se consome continua sem escola e saúde de qualidade.

E o que faz a oposição de esquerda nesse momento? Bem, considerando a gravidade do momento e a óbvia desconfiança para com toda a esquerda depois do que aprontou o menino PT, a esquerda até que aos trancos e barrancos consegue alguma unidade de ação que se não supera a fragmentação, supera o imobilismo. E esta esquerda possui um gigantesco desafio pela frente, que é superar o descrédito e mais, a metodologia que herdou da tradição socialista e também do próprio PT, da qual a maioria saiu.

Diante de um quadro onde lutadores de todas as origens que se referenciavam no PT, apoiavam o PT ou faziam parte de seus quadros, pedem pra sair, porque já não suportam o debácle do PT e o estupro de sua história em nome de uma governabilidade que só serve hoje para manter as íntimas relações entre os comissários e doadores de campanha, cabe à esquerda se reorganizar para ocupar mais celeremente o espaço deixado vago pelo ex-PT.

Alguns desafios são claros aos partidos e movimentos de esquerda: superar a formação flácida da maior parte da esquerda, que resume seu cotidiano teórico à reproduções acríticas dos escritos marxistas-leninistas, sem uma reflexão concreta sobre a teoria de Marx e seus comentadores através dos tempos em toda a sua abrangência; Ir além de Marx, compreendendo formação como mais que adestramento, mas como espaço de reflexão, de formação de capacidade analítica e para isso exigindo uma formação robusta com possibilidade de contraponto, de leitura do contrário para além do “precisamos compreender como o inimigo pensa”, mas sim “precisamos entender a amplitude de ferramentais teóricos à nossa disposição”; romper como viés burocrático de ocupação de espaço político pelo espaço, sem leitura estratégica da necessidade de trabalhos de longo prazo e portanto da necessidade de conquista da hegemonia político-ideológica, que passa pelo cultural; ir além do eleitoral, sem no entanto negar-se a ele não só como abertura de espaço de debate, mas como fundamentalidade da defesa de direitos adquiridos e populações marginalizadas e tidas como minoria, diferenciar-se do PT, diferenciar-se do possibilitismo da esquerda pós-anos 90, buscar ser “impossibilista’, acreditando na inovação, seja tecnológica, política, metodológica. Entendendo a necessidade de renovar linguagem e métodos, sem perder-se nisso como um fetiche “desmarxizador”, mas entendendo a necessidade de dialeticamente reconstruir o papel de transformadora que a esquerda possuía; A esquerda precisa ser também propositiva, porém não entendendo proposição com timidez, entendendo proposição com radicalismo, entendendo a discussão sobre políticas públicas questionando o cerne ideológico delas, não se prendendo e assustando quando ver o temor custo colocado como empecilho, sendo que custo é ali um entendimento neoliberal da ideia de política pública, como se o custo financeiro fosse mais importante que o custo social da imobilidade, isso se aplica muito na discussão sobre energia, quando brande o custo da energia solar como empecilho, sendo esse raciocínio ocultador também do custo não declarado das energias prioritárias para o capital, como nuclear e fóssil.

Enfim, há um longo desafio para as esquerdas pela frente, sejam elas as partidárias ou não, e para percorrer esse caminho é preciso agir, é preciso estar atento, forte, não há mais tempo de tremer às mortes.

Brasil: Um País de esqueletos no armário #desarquivandoBR

tumblr_m2clmrKfeC1qejpkbo1_500A história do Brasil é repleta de esqueletos no armário, do impedimento do encontro das muitas faces da verdade ocultadas em armários, gabinetes, medos e pavores dos que comandam a pátria mãe tão distraída.

Da Abolição a Canudos, do Contestado à Revolta da Vacina, da Revolta da Chibata à Vargas, de Vargas a 64, de 64 até 2013, o número de esqueletos no armário só aumenta, fazendo com que o país necessite de muitas comissões da verdade para extirpar as manchas indeléveis que permanecem nítidas em sua história e são reproduzidas no cotidiano da sociedade através das eras.

Charge 1As torturas nas delegacias de hoje são frutos da reprodução das práticas das tantas ditaduras ou do passado escravista onde o outro devia ser reduzido pela dor à uma peça obediente para que o controle social fosse efetivo?

As mortes cotidianas de jovens negros são fruto da política das ditaduras sendo mantidas com as mesmas táticas e diretrizes ou da criminalização de negros e pardos como pobres, e portanto criminosos, que se iniciou ainda no pré-abolição?

imagesA secessão entre pobres e ricos, as restrições de protestos, as restrições de expressão, a violência cotidiana com relação a direitos das minorias majoritárias, a manutenção na porrada dos padrões de comportamento em uma disciplina social ferrenha, autoritária e violenta são fruto dos resquícios da ditadura de 64 ou dos muros invisíveis erguidos para justificar a escravidão e manter o controle social sobre escravos, pretos, pobres e mulheres por uma sociedade escravista onde o macho adulto branco não fazia a menor questão de não reivindicar seu lugar no topo da cadeia alimentar?

São muitas as perguntas e nenhuma das respostas deveria ignorar que cada esqueleto guardado no armário torna o Brasil um país com uma das sociedades mais injustas do mundo, e que não só não resolve seus problemas do passado como se esforça para alimentar o faminto armário de mais esqueletos para a manutenção da nódoa de lama e sangue a qual nomeia História.

images3A manutenção dos ossos no armário não permite o reconhecimento da história do Morro da Providência e a presença fundamental daquela população onde está para manutenção da memória dos primeiros atingidos pelas inúmeras reformas urbanas do Rio de Janeiro e pela memória da guerra do Paraguai e Canudos.

A manutenção dos esqueletos no armário permitiu que João Cândido morresse na miséria, sendo mantido pela marinha como criminoso, mesmo tendo sido um herói da luta antirracismo naquela força armada.

jt11_ditaduraA fome do armário de ossos também mantém a lógica de resistência a uma fictícia guerra entre comunistas e a “nação” que produz Bolsonaros e Felicianos e também mantém Canudos e Contestado como anátemas para um exército acostumado e pisar na cabeça da população que cisma em fugir de uma ordem platônica erguida pela corporação e cujo lema Ordem e Progresso não se furta a atropelar peles pretas e pobres que por acidente estejam em seu caminho.

militaresarquivosditaduOs esqueletos no armário também mantém até um governo, onde boa parte de seus membros é vinculado diretamente à resistência contra a ditadura de 1964, refém de um pragmatismo torpe e cúmplice da manutenção dos esqueletos dos mortos e desaparecidos pela ditadura militar ocultos sob camadas e camadas de arquivos fechados e cujo teatro da Comissão Nacional da Verdade nem de leve pensa em remover o pó que os oculta, um pó repleto da tradicional injustiça de nosso Estado, de nossa Pátria, que devia ser fratria e nem mátria é.

ditadura1Enquanto os homens exercem seus podres poderes o armário permanece alimentado de esqueletos, alguns muito antigos, e o país rico, que se pretende sem pobreza, segue batendo em índios, negros, gays e mulheres. Segue mantendo a injustiça e prosseguindo sob uma lenga lenga de “Mudamos a vida das pessoas” deixando os rastros de sangue de uma ausência de qualquer mediação entre a violência conservadora do status quo e os inúmeros atingidos pelo seu voraz caminho de enriquecimento dos barões e amigos do rei.

esqueleto limparEnquanto os homens exercem seus podres poderes e buscamos fazer renascer nosso carnaval o grito de “Apesar de você” segue preso numa garganta acostumada a romper o silêncio da paz de cemitérios que é nosso país na marra, na rua, numa raça que só quem possui a estranha mania de ter fé na vida poderia ter.

Os arquivos são muitos, os esqueletos são muitos e serão mantidos fechados enquanto não entendermos que a morte dos Juvenais e Raimundos, de tantos Julios de Santana, se refletem no Xingu, em Belo Monte, na Providência, em Manguinhos, no Capão Redondo, em Porto Alegre, no Mato Grosso, na Avenida Paulista.

frase-se-voce-nao-se-pode-livrar-do-esqueleto-que-esta-no-seu-armario-e-melhor-que-o-ensine-a-george-bernard-shaw-154307Para amanhã ser outro dia é preciso que entendamos quem manda na chave dos armários onde os esqueletos estão guardados, é preciso que entendamos quem se mantém guardando os esqueletos desde o Império e ainda hoje, em um governo do ex-Partido dos Trabalhadores, possui o poder para continuar alimentando-o com novos ossos.

ditaduraÉ preciso que lembremos sempre a memória de tempos onde lutar por seu direito era um defeito que mata, e para isso é preciso que lembremos o tamanho do armário de ossos, os tantos ossos ali ocultos, que lembremos quem guarda a chave, para que o abramos e deixemos sair nossos heróis que não morreram de overdose, mas de História, e nos aguardam para que os façamos ver o sol nascer a nosso lado, como memória, como verdade, como justiça.

Post participante da VII Blogagem Coletiva #desarquivandoBR..