O que fazer no dia depois de amanhã?

rio2012_4f8a41e750b7b9fc2911d31a6da4f095

A esquerda vem sendo reativa há tempos, isolada em seus castelos, transformada em assessoria de gabinete de governos, movimentos organizados inclusive, desde muito tempo antes do PT assumir o poder em 2003.

Funcionou por muito tempo a relçação entre movimentos, partidos, governos e mandatos. Construiu caminhos através da burocracia, programas de governo e projetos de lei.

Só que enquanto se acostumava com a relação íntima com palácios a esquerda foi paulatinamente perdendoas ruas, e quando percebeu isso, especialmente em 2013, outras forças da própria esquerda e da direita começaram a ocupá-las. A saída pra governos e partidos vinculados à esquerda foi criminalizar quem ocupava as ruas, colocando todos no balaio do fascismo.

Isso esvaziou as ruas por um tempo até que a direita se reorganizou, amparada por governos explicitamente de direita, e voltou pras ruas, amparada por policiais que construiram publicamente a diferença entre “manifestante” e “militante”, o segundo, “comunista”, deveria ser reprimido, os demais não.

Atônita a esquerda partidária permaneceu longe das ruas. Aprisionada e processada, a esquerda não partidária também, embora atuasse fortemente nas ocupações de escola, manifestações por passe livre, etc, atuando em geral por vias menos ortodoxas, mais próximas às periferias e vinculadas a bandeiras mais práticas e cotidianas.

E cresceram os movimentos de direita, a classe média conservadora tomou gosto pelas manifestações sem política, sem repressão policial, com muita festa, anticomunismo, ódio racial, ódio a LGBTTS, feminismo e em especial ao comunismo. O fascismo começava a pôr a cabeça de fora.

A esquerda, aidna atônita, mas percebendo o perigo de impeachment saiu às ruas por um breve tempo, depois voltou a aguardar com a fé dos incansáveis, uma solução salvadora vinda das articulações palacianas de suas figuras públicas.

E não teve solução, não teve articulação que desse jeito, Dilma caiu, Temer assumiu com um ministério mais conservador que o de Collor.

Enquanto tudo isso acontecia várias manifestações antifascistas e ocupações de escolas ocorriam, com a esquerda partidária as ignorando ou tentando se apropriar delas pela via de UBES e UNE sem muito mais do que dezenas de estudantes ocupando o Parlamento, enqquanto nas escolas alunos auto-organizados tocavam o baile do ativismo que transforma, conseguindo em São Paulo uma CPI da Merenda e no Rio o fim do SAERJ (Prova de avaliação de “desempenho”). As ocupações horizontais permanecem em vários lugares, como em Goiás, Porto Alegre, Fortaleza.

E ai, e o resto da esquerda, o que faz no dia depois de amanhã do Impeachment de Dilma?

Bem, pouca coisa prática além de choramingar sobre o recuo conservador que é o Governo Temer e listar publicações internacionais criticando o impeachment de Dilma.]

Zero de análise, de auto-crítica, de propostas, zero de percepção de algo além do óbvio sobre o processo.

Parece que Temer, vice de Dilma, desceu de um disco voador vindo de Marte.

A esquerda petista lembrou outro dia que os índios existem e colocou que com Temer eles vão acabar. Bem, pode ser, inclusive Temer precisa apenas olhar como Dilma produziu parte do processo de extermínio indígena e repetir, nem precisa reinventar a roda.

Esse é parte do problema: Cadê ao menos o “Foi mal!” do PT sobre os recuos que empoderaram essa direita que o golpeou pra gente começar a conversar coletivamente sobre resistência? Não vai rolar? Não, não vai rolar, mas então, que tal ao menos propor caminhos de resistência além do Avaaz?

Não sei se vocês notaram, mas dizer o óbvio, que o ministério Temer é um horror, não o transforma no Coelhinho da Páscoa.

A ausência de mulheres e negros, a transferência da titulação de Quilombos pro MEC não é apenas um informe, é uma prática entrando em ação. Alexandre de Moraes na Justiça idem, significa que o pau vai comer.

E não, não adianta vir com aquele papo brabo de “Viram? Sem o PT é pior!”, porque senão a gente lçembra a responsabilidade do próprio PT com alianças à direita e empoderamento do mesmo PMDB dentro dos governos Dilma e Lula. Sim, sem o PT é pior, mas com o PT não estava bom e metade do ministério Temer também foi ministério Lula ou Dilma, de Henrique Meirelles a Henrique Eduardo Alves, Jucá, Kassab, etc. Melhor mudar de assunto, não?

Então, estão vendo as escolas? Estão vendo as manifestações antifas? Que tal baixarem a bola e a sbandeiras e colarem enquanto militantes pra apoiar, dar força sem tentar apropriar, aparelhar, transformar em palco eleitoreiro? Que tal se transformarem de novo naquela galera que não queimava na fogueira valores e bandeiras históricas pra construir o cadafalso que produziu o impeachment de Dilma?

E podemos avançar, há enormes mudanças no quadro teóprico prático da militância anarquista e socialista desde 1917, sabe? Tem as experiências do Curdistão libertário sírio, por exemplo, que dão caldo. E acho que se o Ocalan velho de guerra conseguiu produzir uma teoria libertária vindo de uma tradição leninista a gente consegue também, não?

Que tal a gente começar a discutir comitês de resistência? Não, dificilmente vai ter a adesãod e autonomistas e anarquistas, mas tem boa parte da esquerda que ainda ama votar e adoraria uma experiência organizada de forma horizontal, mesmo com o exemplo dado recentemente sobre o valor que a eltie política dá ao voto. Sabe o PODEMOS e o SYRIZA? Pois não nasceram cooptados pelo sistema e tem mais horizontalidade que a maior parte dos partidos brasileiros, mas muito mais que PSOL e PT.

Sei que RAIZ e REDE não são similares a PSOL e PT, embora o RAIZ esteja hoje em filiação solidárioa ao PSOL, mas são experiências de organização político partidária bastante mais horizontais e o quadro de recuo conservador não tá deixando barato quem fica pensando apenas no próprio umbigo.

Para além disso há contingentes autonomistas e anarquistas produzindo coisas novas, com resistência a tarifaços, aumento de energia, passagem, com luta por ocupação de imóveis, tem todo um trabalho educacional sendo feito. Tudo isso pode ser exemplo de funcionamento pra quem quiser transformar de novo o quadro político e construir saídas ao recuo conservador.

Ainda mais se analisarmos o quanto esse recuo que tenta atingir cotas, LGBT, mulheres, etc e também não aponta nenhuma saída econômica que vá funcionar em um quadro de crise econômica internacional, que tende a ampliar a recessão, além de pôr fogo no cabaré que é hoje o teatro político brasileiro.

Já tem ocupação do IPHAN, auditores do CGU bastante invocados, pra disso sair greve é dez reais, mesmo o Alexandre de Moraes achando que o Brasil é São Paulo e vai geral protegê-lo de mídia e de exposição.

E ai, que tal parar o mimimi e produzirmos o avanço na marra?

Sobre os Black Bloc, professores e a miopia – Retratos de discussões no fervo

divu1Vou começar pelo início:

Não adiante escrever “Aos que se interessam pelo tema: o black bloc teve uma participação engajada, decidida, ativa e militante para criar as condições ideais que a polícia queria para reprimir e acabar com nossa manifestação” e depois dizer que não tá responsabilizando os BB, independente da ressalva feita antes, depois, durante, no meio, ou na transversal.

Se não quis dizer isso reescreva. Se não soube se expressar reescreva. Se não foi isso que quis dizer reescreva. É bastante simples, o resto é ou estar mais perdido que cego em tiroteio ou literalmente não entender patavinas ou ter a critica, ter escrito, culpar mesmo e não querer assumir com o ônus que isso acarreta.

Desculpem ser direto e reto, tem algumas questões que acho um tanto quanto complicado de estarem sendo ignoradas:

  1. O flagrante apoio que a base da categoria dos professores deu aos Black Bloc em assembleia com cinco mil pessoas no Rio.

  2. A quantidade de enquetes, esquetes, entrevistas, pesquisas que indicam que a população não tá recusando nada os BB.

  3. A quantidade de material problematizando os BB, seja em site, seja em artigo científico, etc.

sesc_festclown_2012-_palhaco_xuxuNão somos crianças discutindo no ginásio, somos militantes com responsabilidade política uns com os outros, com o partido, com os movimentos e ser simplista neste campo é levar ônus ao coleguinha do lado, ao partido e ao movimento e levar preços a quem não comete o mesmo tipo de equívoco/tem a mesma posição, etc.

Há uma nítida criminalização dos BB pela mídia/governos e tendo eco nos partidos da esquerda como PSTU/PSOL, sim, me desculpem, eu sei ler.

Retórica à parte, critica sobre a organização dos Black Bloc, fetiche de tática, etc, é uma coisa completamente diferente do que dar parabéns aos BB porque a polícia, essa entidade filha da puta de per si, mete a porrada, me desculpem. É como culpar o moleque de dez anos que chamou o totó que é um rotweiller com raiva pelo cachorro mordê-lo e à rua toda. A culpa é sempre, sempre, do dono do cachorro.

“A Origem histórica dos BB” é fundamental conhecer, é uma história e tem raízes em autonomistas marxistas na Alemanha dos anos 1970 e tem uma longa história e adaptações por onde passou e ao que parece aqui idem. Aqui inclusive tem mais organicidade do que o normal na Europa e se relaciona muito com as ocupações urbanas, conheço antropólogos que encontraram come elas em etnografias sobre ocupações urbanas.

downloadReduzir inclusive os BB às manifestações é equívoco, porque:

  1. Não são um grupo.

  2. Não funcionam somente em manifestações e tem relações menos com anarquistas, que os criticam, e mais com autonomistas marxistas.

  3. Criticar é necessário? Pra quem acha que deve ter crítica é, mas antes de mais nada criticar sem refinar é chutar tijolo.

  4. Tem de entender e tem de entender antes de mais anda que não é disputar com eles, mas disputá-los.

  5. E o problema médio das análises é exatamente a demarcação de diferença com eles como disputa com eles.

E ai me desculpa, vou pegar um dado de um amigo: análise de discurso no trabalho historiográfico me fazem ler com quase clareza absoluta a linhagem de uma declaração. É mais que “intelectualismo” é meu trabalho e o eixo do discurso de parte da esquerda do PSOL e de companheiros do PSTU é muito similar e sim, demarcam para estabelecerem locus político diferenciado, só que partem de uma série de equívocos e artifícios retóricos para estabelecerem estas diferenças menos por entendê-las e mais pela necessidade de disputa.

E sim, não adianta dizer que a culpa é da repressão, mas os BB provocam… esse é igual ao discurso da Maria do Rosário, igualzinho..

Falar de junho sem dizer que os BB participaram é piada. Dizer que “A direção do ato foi” é piada.

imagesPorque se a gente for tratar assim vou mais longe: como é que a gente situa junho fora das rebeliões indígenas de 2012 pra cá?

Como a gente situa Junho sem a Aldeia maracanã, detonada na ensecadeira do Xingu,etc?

Como a gente situa 2013 fora do esteio da ação direta do MST na Aracruz que detonou o laboratório? As rebeliões de favela, Resistência em Pinheirinho?

Como a gente situa junho, ontem, anteontem, Rio, SP, PA, Fortaleza, Recife, fora da ampliação da militarização das polícias, do aumento da morte da juventude negra, do aumento de mortes no campo, da maior precarização do trabalho dos jovens da periferia, do resultado dos primeiros formandos das universidades da Era Lula após a “inclusão” de milhões de jovens que esperavam uma vida melhor após se formarem na universidade?

O problema é a tática? O problema é a ação direta? o problema é o momento da ação direta ou o processo?

Gente, sem olhar o maldito processo histórico e pegando recuos de médio a longo prazo, analisando o hoje a partir do possível arco de influências prévio, da história da tática, do histórico da “direção” de movimentos, do papel e da inserção do PSOL, PSTU, PT, da crise de representatividade da esquerda como um todo, e não tô falando de mensalão e corrupção, a gente vai virar girando que nem peru pré-abate.

Sem olhar o processo histórico vamos fazer como aquele “Marxista” de galinheiro que diz que a greve dos professores é de direita porque contesta um governo “de esquerda” incapaz de resolver o problema da liquidação da educação para o mercado e que aliás concorre como sócio da privatização da educação não só como governo federal, mas como governo estadual e municipal.

Condenar os Black Bloc optando por uma busca frenética de diferenciação como tática de ocupação de um espaço cuja motivação de existência tá muito além da ação direta em si é como culpar o furacão por devastar uma cidade, cagando pro aquecimento global e pelo fato do uso de combustíveis fósseis ser diretamente influente na sua ampliação.

Pensemos amplo, pensemos além, saiamos do simples, do simplório, do que tá só agora.. Vamos ser Marxistas?

images (1)É fundamental ter menos fome de certezas e mais lidar com dúvidas constantes e elencar o maior número de quadros e dados possíveis no liquidificador do concreto abstrato para depois voltar pro cotidiano no tal movimento dialético e ver qualé. apostemos mais, apresentemos discordâncias, dúvidas. Digamos que não temos certeza se concordamos com a tática, mas entendemos o que leva a existir os BB e entendemos que o BB é mais resultado do que causa.

Se queremos mesmo revolução, quando ela vier vamos dizer que não compactuamos com depredações? Vamos reconhecê-la?

Solidariedade à Policiais militares? Passa amanhã

meninaA Policia Militar é uma organização filha da puta, desculpem o termo, mas é.

E mais, seus soldados ao serem cúmplices dos governantes e baterem em trabalhador tornam-se pior que cães amestrados.

Depois choram por solidariedade quando os seus morrem no combate à violência, a mesma violência que praticam usando farda, se igualando a bandidos. Não tem como ter solidariedade com quem nos violentas.

A diferença entre o bandido e o Policial violento é que o bandido não tem como obrigação zelar pelo cumprimento da lei, a ele não temos confiança, não lhes precisamos confiar, tampouco esperar que respeite nossos direitos.

O policial ao contrário, esperamos dele que zele por NOSSOS direitos e não pelo direito da propriedade, do lucro, de governantes ilegítimos.

Qual o que? O Policial militar além dos inúmeros casos de violência, corrupção, achaques, ainda nos violenta em nossas reivindicações mais legítimas, nos bate, nos joga spray de pimenta, gás lacrimogêneo, tudo sob o pretexto de “fazer cumprir a lei”, ou seja para “fazer cumprir a lei” a descumprem nos direitos fundamentais, fora que jamais “fazem cumprir a lei”, fazem cumprir a vontade de seus senhores.

E não citei aqui os assaltos cometidos por PMs, que não são isolados, os achaques, as duras em busca de migalhas do parco salário dos trabalhadores, o tapa na cara de adolescentes, especialmente negros, que ousam dizer que tem direitos, o assédio à mulheres por acaso detidas para averiguação, a organização de milícias para achacar a população sob o argumento mau caráter de “estamos combatendo o tráfico onde a lei não chega”….

Portanto caros soldados da Policia militar, eu lamento, mas não lamento quando vocês sofrem violência. Vocês são semeadores da barbárie, assassinos de direitos e também de vidas, é só olhar as estatísticas relacionadas à morte por ação da polícia, são assassinos do estado de direito, são tanto quanto s bandidos, agentes da barbárie.

Depois de ontem, especialmente depois de ontem, 28/09/2013, quando a PM invadiu a Câmara de vereadores do Rio de Janeiro e expulsou na porrada profissionais de educação, o policial militar é um inimigo do qual tenho tanto medo quanto tenho de bandidos. Evitar acionar a policia militar é mais que uma ordem íntima, evitar chamar, evitar contar com, e também não guardar solidariedade.

PMs ganham mal? é uma pena, mas como vocês optam por agredir quem luta também por melhorias de salários, acho que não precisam de nós, tampouco de nossa solidariedade: Vocês estão sozinhos.

A dimensão da utopia, a revolução e os novos Lênins

 Road_to_utopiaTratar de mudança política não é exatamente simples, tampouco receita de bolo. A dimensão da transformação tem tantas miríades de sentidos possíveis subjetivos a serem lidos em atos, palavras e movimentos, que a simplificação de um método ou de uma ideia de estado, ou de mesmo uma só ideia de revolução é delírio simplificador.

Se ler a realidade concreta fosse fácil e apontasse para um só sentido unitário não haveria desde sempre um mar de pensadores mundo e história afora, cada um com sua percepção de uma realidade, de uma verdade ou até da não-verdade.

A questão é que cada contexto histórico, cada conjuntura, aponta sinais identificáveis de novas formas que a multidão de gentes por vezes denominada “povo”, “massa”, “massona” ou “povão” (quase sempre por quem se aparta dela para defini-la com distância segura) interpreta se não o real a ruptura com o que entende como sistema ou peso opressivo de alguma realidade.

Cada contexto histórico traz suas insurgências, traz suas permanências, traz suas rupturas e conservações e é necessário que cada pensador ou militante que pretenda transformar este real lê-las, olhá-las nos olhos, preocupados menos com encontrar a verdade verdadeira única de todas as coisas e mais com antecipar minimamente uma tática de intervenção que consiga atrair o máximo de gente possível para oque defende como eixo de ações transformadoras.

É, amigão, to falando de convencer pessoas que tua tática revolucionária é o lance.

img_ju427-06bNeste contexto atual, por exemplo, o próprio questionamento da relação entre movimentos, partidos e ativistas com o cotidiano político é questionado. A própria relação entre os movimentos, as pessoas e a atividade política é jogada aos leões em busca de demolir concepções quadradas de vida, de militância, de relação com vidros, vidraças, mundo, ambiente, amor, mídia.

A dimensão contestatória não tá ai para fingir que não vê a frase maldita cheia de homofobia do sujeito que em tese diz que quer mudar o mundo.

A contestação, caras pálidas, não tá vestindo o fraque mediado do fanfarrão da esquina, tampouco o papo brabo de que “povão é assim”.

A contestação quebra vidraça do Itaú,a contestação arrebenta a secadora do Xingu, invade usina, ocupa Câmaras, derrete leninismos de salão querendo mais que conversinha nas terras Quilombolas, na avenida Paulista ou na praça onde Feliciano-RS prendem pessoas que se beijam em um espaço público ocupado por ele indevidamente em nome de uma só vertente de uma só fé, atropelando a laicidade do estado, atropelando a democracia de um estado cujo emblemático simbolismo de um Pastor Deputado (jamais um Deputado Pastor) chamando a polícia para reprimir lésbicas se beijando EM ESPAÇO PÚBLICO é eloquente.

street_art_24A contestação não trata a dimensão do sonho como um “Além da Imaginação”, uma “Twilight Zone” promovida por esquerdóides, amiguinhos. A contestação chegou à sala de aula, e não na cabeça de estudantes, mas na de professores precarizados em greve numa das principais cidades do país.

A contestação tá na rua derrubando um dos governadores centrais para a política do PT e para concepção de cidade mercadoria, de mundo mercadoria, de Brasil Grande neodesenvolvimentista com fome de petróleo, com fome de carbono, de escolas, de postos de saúde, de consumo que nos consome enquanto gentes a trabalhar doze, treze, quatorze horas para pagar os carnês das dívidas enquanto deixamos a vida no prelo.

A contestação pegou a dimensão do sonho gritando que não era por vinte centavos enquanto militantes amestrados pro revistas, blogs e sites de partidos acostumados com a cadeira acolchoada do poder dizia se tratar de Vândalos e Baderneiros.

imagesA dimensão do sonho voltou numa contestação mascarada que lei nenhuma vai desmascarar e enquanto isso ainda existem citadores compulsivos de Lênin procurando pelo em ovo pra justificar qualquer coisa em nome de mandatos acomodados, acostumados a pedir em vez de exigir, a criar espantalhos para a fome de moral e bons costumes de quem pede o fim da corrupção como se pedisse pães franceses na padaria mais próxima.

E enquanto a dimensão do sonho renasce com utopias múltiplas, dissonantes e polifônicas, como deve ser, a exigência de novos Lênins é clara, imensa, nítida. Mas exigem-se novos Lênins com menos fome por construir estacas fundadores de novos países e novos estados, mas canais para o fluxo contestatório passar derrubando represas.

São precisos Lênins que construam o diálogo, um diálogo amplo, que aprendam, que ensinem, que se joguem, que quebrem, que requebrem, que riam, que sambem, que ouçam a polifonia menos buscando a síntese perfeita e mais aprendendo que ruptura pode sim rimar com gostosura, com liberdade, com vontade e com verdades, sim com s, por muitas, imensas, gigantes, que nunca dorme, que se soltam noite afora quebrando tudo até a última ponta para derrubar Cabrais e outros ditadores mal-acostumados a achar que a voz das ruas é rouca, enquanto sempre foi doce.

images (3)São precisos novos Lênins prontos a divertirem-se recuperando a utopia, a dimensão do sonho em que Garibaldis, Bakunins, Marx, Engels fizeram a primavera dos povos.

Porque sempre precisamos de mais primaveras.

O julho Papal e a má fama de Cabral

Sérgio-Cabral-e-o-Papa-por-PelicanoO que significa o Papa Francisco I no Brasil neste mês de Julho?

Este texto não começa à toa com uma pergunta, pois se pretende menos uma afirmação e mais ser um provocador, um questionador, talvez para que as respostas sejam menos soluções e mais apontamentos.

Existem vários quadros possíveis para responder a esta pergunta e outras, alguns desenhos são cabíveis de serem feitos a partir de indagações no plano da política local, nacional, internacional, na relação entre religiões, entre a Igreja Católica e a mídia, entre o Governo brasileiro e o Vaticano, entre os megaeventos e os planos do estado e entre a população e os poderes.

Um deles diz respeito ao que foi projeto pelo Prefeito do Rio, Eduardo Paes, e pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, no que tange aos negócios que seriam/foram feitos em nome dos mega eventos como a Copa e a Olimpíada, e em menor grau a Jornada Mundial da Juventude, e o resultado final do impacto da JMJ no cotidiano de ambos e mais, na imagem da cidade/estado do Rio de Janeiro para com o mundo, preocupação número um dos governantes/gerentes do capital e cujos gabinetes tem sido chamados pela oposição, a meu ver com razão, de balcão de negócios.

Deu certo? O investimento em nome da venda da Cidade do Rio de Janeiro como cidade-evento, ou cidade-mercadoria, teve retorno? Fortaleceu a cidade enquanto marca? Fortaleceu a cidade enquanto infra-estrutura?

Acredito que as panes no sistema de transporte, na própria infra-estrutura erguida em Guaratiba e que sucumbiu à lama das chuvas, responde às perguntas e aponta para um caos maior em eventos com previsão de maior envergadura na exigência de transportes,etc. Aliás, um dado a se pensar é que o prefeito e o governador declaram feriados nos dias da JMJ, parciais ou não, e que para usar o Metrô o cidadão carioca que não tivesse passe especial era simplesmente barrado, e mesmo assim deu pane.

Outro quadro é da relação entre o povo carioca, em protesto quase diário pela queda de Cabral desde o fim de Junho, e os governantes diretos e indiretos, Eduardo Paes, Sérgio Cabral e Dilma Roussef.

A presença do Papa não arrefeceu ânimos protestantes, e se os protestos tinham menos gente, não era, ou foi, desprezível a quantidade de protestos com cerca de cinco mil participantes tanto na sede do governo do estado quanto nas proximidades da residência de Sérgio Cabral, e todos sendo recepcionados mais cedo ou mais tarde pela violência policial que atira bombas de gás lacrimogêneo em hospitais.

A relação entre protestos e violência policial, que Cabral usou tentando desviar denúncias contra si, atingiu um limite tão grande que levou o governador a criar uma comissão especial para investigar vandalismo, investindo na dicotomia Vandalismo x Policia, que teve de revogar ao fim de tantas denúncias de inconstitucionalidade.

Para completar o nível de perda de controle do governador por sobre as tropas e aliados, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, em entrevista exclusiva à Mídia Ninja, fez questão de se descolar do aliado mor, ou ex-aliado mor, Sérgio Cabral.

Cabral, ao fim e ao cabo, ao revogar o decreto que criava a CEIV (comissão especial de investigação sobre vandalismo) entregou às baratas o Secretário de Segurança do Rio e o comandante da Polícia militar como responsáveis diretos pela truculência policial, como se o comandante em chefe da Polícia, ele Cabral, não tivesse nada a ver com isso.

A truculência policial ocorreu também com o Papa no Rio, pra ampliar o grau de desmoralização do Governador, ou seja, como cidade mercadoria o Rio de Janeiro fracassou tanto na infra-estrutura para megaeventos quanto na habilidade de conter manifestações sem a proverbial truculência da polícia ainda militar do Rio de Janeiro.

Para agravar a situação o quadro expôs danos quase irreversíveis, a um ano da eleição, ao muro do outrora paraíso da popularidade de Dilma, Cabral e Paes e expôs também crises palacianas mal ditas pelo cotidiano de sorrisos e felicidades entre PT e PMDB.

As resposta de Cabral aos protestos ampliaram-nos e mais, derrubaram a popularidade dele, de Paes e de Dilma, que por razões de “governabilidade” não tem como descolar-se imediatamente do outrora primeiro aliado.

A lusitana roda ainda trouxe consigo o PT Carioca em profunda crise, já que o partido tinha membros entre os que filmavam os movimentos a partir da mídia alternativa, entre os próprios protestantes e entre quem condenava os protestos a partir de uma lógica delirante que os protestos contra Cabral, assim como todos os protestos de Junho para cá, eram no fundo um golpe armado contra a toda poderosa salve salve iluminação popular do Partido dos Trabalhadores em todos os níveis de governo, governabilidade e aliados.

Essa crise do PT não passa despercebida aos aliados ou adversários, e se reflete na lógica pressão para que o PT saia dos governos Cabral e Paes, e mais, ecoa na imagem de Dilma que tentou se construir como uma governante que “ouve as ruas” tentando ignorar a extrema inabilidade da mesma em responder aos protestos sem emprestar a Força Nacional a governadores, inclusive tucanos.

Aliás, essa crise do PT se reflete imediatamente na dicotomia entre estar nas ruas e nos governos, protestar contra Cabral enquanto sua presidente da república mantém um apoio explícito e tem em metade dos programas construídos no Rio como testes para uma plataforma nacional (UPPs, UPAs, Megaeventos) e mais, ser “esquerda” com políticas de direita, sendo secretário de direitos Humanos em um governo que os viola com sua polícia truculenta.

No plano da relação entre o Governo Brasileiro e o Vaticano a coisa fica um tanto mais enrolada.

Desde a assinatura entre o Governo Lula e o Vaticano de tratados que buscavam minimizar a aproximação oficial entre o PT e fundamentalistas religiosos ligados ao neo-pentecostalismo a partir do reforço do reconhecimento de instituições educacionais e de “caridade” vinculadas à Santa Sé, reforço na isenção tributária de igrejas,etc, o Governo do Brasil buscavam elementos simbólicos que deixassem clara que as relações entre o Governo do Brasil e evangélicos não seriam as únicas que o Partido dos Trabalhadores travariam para manter um grau de governabilidade e de laços e alianças políticas com as bancadas ligadas às religiões.

Ao fazê-los, os tratados, o Governo Brasileiro iniciou um processo de aproximação que com o governo Dilma Roussef e sua boa relação com o atual Papa Francisco I, ganhou fôlego.

Ao mesmo tempo a Igreja Católica precisava também do Brasil para focar sua ação “evangelizadora” e fazer uma demonstração de força ao mundo exatamente onde as igrejas protestantes mais cresciam. E a JMJ deu a ambos um meio de fortalecer laços e de demonstrar poder.

As reações dos Evangélicos fundamentalistas não tardaram a aparecer e isso pode ter um preço na costura da ampla rede de laços e alianças que o PT e o Governo travaram para manterem-se governando uma coalizão outrora poderosa, mas que diante da reação popular parece ruir a olhos vistos.

Outro elemento desta relação foi a aposta da principal rede de televisão do País, a Rede Globo, na transmissão da Jornada Mundial da Juventude como evento prioritário, invadindo inclusive ou outrora sagrado futebol de domingo e carro chefe da emissora.

A emissora, que estava se aproximando das lideranças fundamentalistas e buscando um contraponto à Rede Record, e outras emissoras que centravam fogo em programas voltados aos evangélicos neo-pentecostais, pela via do mercado Gospel, ao partir para a transmissão do evento católico como foco prioritário de sua programação optou deliberadamente por fazer parte da órbita da política do Vaticano de demonstração de força no principal País Católico do mundo, o Brasil, que via o avanço das igrejas evangélicas e de pastores como Marcos Feliciano dizendo que a igreja Católica era uma religião decadente.

Esta aposta se deu ao mesmo tempo em que a emissora mantinha-se como porta-voz da polícia militar e do governo do estado no que tange à manifestações populares, ó rompendo quando as imagens que circulavam via redes sociais impediam uma luta eterna contra o óbvio. A mesma relação se repetia na relação da JMJ e a cidade vendida pelo prefeito como pronta para megaeventos, só rompida quando as falhas no sistema de transporte se negaram a acompanhar a venda do mundo da fantasia.

Dá pra fazer mais relações entre a emissora mor do Reino e o principal partido no Brasil de hoje, o Prefeito Eduardo Paes e o Governador Sérgio Cabral, mas fica para outra hora, deixando apenas a sugestão de quem recebe mais verbas do Governo Federal entre emissoras e empresas de mídia.

Este julho Papal criou muitas dúvidas, apontou cenários, revelou fraturas e caminhos que muitas relações entre quadros podem se dar. Indicou falhas no Rio como mundo perfeito que vendiam para Inglês ver.

Nós que fomos um Rio da mais perfeita governabilidade, acordamos e somos um Rio que protesta com Papa e tudo.

Nós, que fomos um Rio que amava Dilma, Cabral e Paes, acordamos gritando a plenos pulmões que o Papa é BOPE.

Nós, que fomos um Rio pintado à mão pelos melhores publicitários, acordamos com um Papa e a ideia de que somos um Rio menso preparado, mais cheio de lama e gás lacrimogêneo do que supunha a vã filosofia do coro dos contentes.

Nós, que fomos um Rio de obras, agora somos um Rio que pergunta onde está Amarildo?

Não há luz após o túnel

SEM_AGUA_395825217O cotidiano do Carioca é iluminado por um sol escaldante, por balas escaldantes e por um calor que percorre ano a ano a cidade com requintes de crueldade pra quem não sofre o bafejar da brisa marítima full time em seu dia a dia.

O epíteto “cidade Maravilhosa” cantado em verso e prosa no ufanismo abestado de nosostros esconde omissões e ironias. Omissões dado que escondem que esta cidade maravilhosa representa o erguer da cidade aburguesada da Zona Sul-Centro por um Pereira Passos, que ao demolir as ruas de um Rio antigo em busca da superação da colônia, não só demoliu e “modernizou” a cidade, como enviou vagas e vagas de pobres às distâncias dos subúrbios, zonas rurais da época (atual zona oeste) ou encostas das quais historicamente estes pobres eram atingidos por deslizamentos, frutos das fortes chuvas anuais, e ainda eram culpados disso pelos veículos de comunicação e pelo poder público, como ainda são.

imagesEnquanto a mídia carioca bovinamente e bovinizantemente canta loas à sua “cidade maravilhosa” todo dia falta água, todo dia falta luz, como já dizia a piada histórica que o povo suburbano cantava em paródia à famosa marcha também chamada “Cidade Maravilhosa” ao dizer “Cidade Maravilhosa cheia de porcaria, de dia falta água, de noite falta energia”.

É claro que a crítica honesta e irônica do povo carioca, tradicional veia de resistência de quem tanto sofre/sofreu nas mãos de um poder público que emulava/emula a feitoria da época da escravidão, é bem vinda, só que essa ironia também esconde uma certa parcimônia com o lidar com os conflitos inerentes à ausência de serviços públicos dignos, nem cobro de qualidade apenas dignos, a toda a massa que além do túnel Rebouças repousa seu status de maioria da população em uma cidade aquilombada, abandonada e deixada à própria sorte da manha, da graça, da raça e dos dribles necessários à truculência da polícia, da milícia, do medo, da dor.

EnergiaEssa parcimônia não veio do nada, não veio de uma característica inata, “natural”, de um povo, nem tampouco é fruto do encanto pelo belo quadro geográfico que nos cerca, mas é fruto também de violências e sevícias históricas que um povo dolorido é submetido desde antes de uma Revolta da Vacina quase oculta da história.

images (1)Essa parcimônia é fruto da pesada carga de convencimento e malandragens da resistência cotidiana que em suas próprias regras e formas dá um jeito de subjugar o público em torno de negociações semi-privadas, ou de uma privatização coletiva e marginal, feitas em uma quase leitura popular do liberalismo histórico que cerca o projeto de cidade nascido com a República.

Se o poder é liberal em sua robusta política de Robin Hood ao contrário, construída em torno da privatização da res publica em prol de sua transformação em síndico da zona sul sociológica, o povo é liberal na tradução de uma única forma real de combate a seu abandono: cria-se leis próprias que abraçam a coletividade em torno de gatos, de fechamentos de rua, de festas barulhentas, de fogos, de kombis e vans, de mutretas, de malandragens, de controle social comunitário da vida cotidiana.

sergio-cabralEssa tradução do liberalismo do poder é óbvio que não cabe apenas em boas iniciativas, também alimenta o ilegal e violento esporte das milícias e tráficos. Também alimenta clientelismos, trocas, fisiologismos. Essa tradução torna o Rio de Janeiro uma cidade bárbara, que alimenta a morte de Traficantes Matemáticos como se fosse troco de bala, e assassinatos de líderes comunitários, crianças, como efeito colateral da necessidade de manutenção da máquina de uma (in) segurança protetora das fronteiras da orla e cuja lei naturalizada pós-túnel Rebouças repousa no altar do “é assim mesmo”.

Enquanto isso a cidade convive com a considerável piora do já imenso descaso de serviços públicos como Light, Net, CEDAE com o lado que menos importa da cidade, o lado que turista não vê.

images (4)Enquanto isso o prefeito se esconde, o Governador se omite, a sociedade assiste sem reação à manipulação cotidiana de suas principais emissoras de TV, dos principais jornais, mas todos gritam em uníssono “imagina a festa”.

Não há luz no fim do túnel, não há luz após o túnel, nem água, nem dignidade possível, nem transporte, nem escola, nem saúde, muito menos paz.

images (5)A pacificação prometida é ocupação, a modernização prometida não é para o nosso bico.

Há parques, mas não há água. Há parques, mas não há energia e pra festa, desculpem, não fomos convidados.

Quem vigia os financiadores de campanha?

Marcelo Odebrecth, nomeado pela revista Isto é, como construtor da copa
Marcelo Odebrecth, nomeado pela revista Isto é, como construtor da copa

A frase tomada como título a este texto é prima do epíteto que Alan Moore usou como mote para sua obra-prima Watchmen e que consistia na frase em inglês “Who Watch the Watchmen?”, que vem a Ser “Quem vigia os vigilantes?”.

Tomo emprestado o epíteto como uma forma de refletir sobre quem toma conta das necessidades de cidadãos em um país loteado desde as privatizações primevas feitas pelos tucanos entre empreiteiras, teles e empresas que tornaram-se sócias dos governos que se seguiram no gerenciamento cada vez mais capacitado do capitalismo.

Metro_RioTeles, empreiteiras, proprietárias de redes inteiras de transporte rodoviário, aeroviário, sobre trilhos, barcas, fornecedores de energia elétrica são, especialmente no paraíso neoliberal brasileiro chamado Rio de Janeiro, livres de qualquer regulação real e são quase que entidades inimputáveis no quadro da dita república federativa do Brasil.

Experimente viver fora das bolhas de prosperidades das grandes cidades, como a Zona Sul Carioca, vá para o subúrbio das grandes cidades e se dê conta de como é precário o atendimento das empresas de telefonia, água, energia, transporte e como o descaso das “concessionárias” é nítido, criminoso até, e contando com a omissão do governo e agências reguladoras, chega a ser um escárnio.

superviaQuaisquer reclamações efetuadas com as agências reguladoras tendem a serem tratadas como nada, nenhuma multa, nenhuma suspensão de concessão, nada é feito, tudo ocorre em um movimento simplesmente burocrático, pró-forma, sem nenhuma ação direta de punição à cobrança por serviços jamais prestados, seja pelas NETs, pelas Lights, pelas Supervias ou pelo Metrô.

netDesde que passei a morar em Oswaldo Cruz as faltas de energia são semanais, a NET age como se estivesse doando gratuitamente o sinal de internet e telefone e como se o que pagamos fosse uma doação feliz. Água? Conte com a CEDAE para uma falta de fornecimento por mês mais ou menos. Transporte? Além das máfias de ônibus e vans contamos com a ineficiência dos trens, que lotados conseguem não respeitar nem o próprio regime de intervalo vendido pela concessionária como a nova panaceia para a resolução de todos os nosso problemas.

Os ônibus são velhos e os motoristas entendem mesmo que estão fazendo um belíssimo favor de parar para o trabalhador/estudante/idoso que está ali no ponto para se deslocar para algum lugar que obviamente atrapalha seu passeio diário pelos subúrbios do Rio. E olhem que não estou falando do pior quadro de serviço da cidade, estou falando das proximidades do Parque de Madureira, menina dos olhos do alcaide Eduardo Paes, que obviamente no pós-campanha voltou a seu posto de gerente de balcão de negócios e esqueceu que tem de governar a cidade e encarar de forma dura o mau uso das concessões que o município entregou.

E quando chove temos um quadro absolutamente nítido do desgoverno desta cidade que é a menina dos olhos do país no que tange ao projeto de ocupação urbana, transporte e modelo de negócios baseado em cidades-mercadoria. Tudo para! Trem, ônibus, metrô, telefonia, TV, internet, energia e por vezes água. Se na menina dos olhos do projeto de cidades-mercadoria isso acontece, imagina as cidades com menos recursos, menos mídia, menos holofote? Pois é, imagina na copa.

Logo Preferencial 2010 1 (1)E se olharmos os proprietários dos serviços citados o que achamos? OAS, Odebrecht, CCR, Globo, CEMIG e por ai vai. Depois um exercício bacana é comparar a lista das empresas que obtêm concessão para os serviços essenciais com a lista dos doadores para as campanhas de Dilma Roussef e Lula, Eduardo Paes, Sérgio Cabral, Aécio Neves, Márcio Lacerda, Haddad, Serra, Eduardo Campos, tirando como exemplos os principais quadros partidários dos principais partidos do país. Fazendo este cruzamento o que achamos? Opa, pois é, não é uma linda coincidência encontrar em listas diferentes nomes similares? E o mais legal é que a matriz ideológica dos diversos candidatos não inibe ninguém de doar, não, mano. a doação não entra no Fla x Flu que Tucanos e Petistas, aliados e oposição, fingem existir.

jslzpvComo dizia Plinio de Arruda Sampaio: empresa não doa, investe! E esse investimento parece bom, porque as mesmas empresas doam para todos e “coincidentemente” conquistam lucrativas concessões, como a da Supervia cujo governo do estado do Rio de Janeiro concede o serviço de trens urbanos e compra trens urbanos para a empresa concessionária, não é lindo? Cabral é um bom amigo de seus amigos, Eike tá ai pra não me deixar mentir.

CCR-Ponte-Cameras-1E por isso devemos nos perguntar quem vigia os financiadores e mais, quem financia os financiadores, pois um dos adágios contra o financiamento público de campanha dito e repetido pelo senso comum é o “Não vou gastar meu dinheiro público pra eleger safado!”. Ah, é? Ok, então você não vê que já faz isso ao eleger A ou B que tem sua campanha financiada por empresa A ou B que posteriormente recebem recursos públicos para efetuar serviço A ou B?

A matemática não é tão difícil e temos exemplos: Olhem quem financia as campanhas, olhem seus contratos com o poder público, olhem o quanto recebem do BNDES e tirem suas conclusões. Um exemplo bacana é o Maracanã, quem reconstruiu, quem vai recebê-lo quase que como doação para lucrar pro mais de 30 anos e quais as relações de todos entre si, seja como doadores/concessionários, seja como receptores/poder público. São todos muito amigos, tutti buona gente.

imagesE você povo? Como fica? Provavelmente pegando trens lotados, que passam em intervalos de tempo abusivo, ônibus que deviam ser jogados como sucata, água que falta sempre, luz que falta sempre, internet e telefone de péssima qualidade que é preciso um gasto de tempo que muito pouca gente tem para encher o saco e obter a manutenção adequada, e cai bem processos cíveis também , que são pra poucos, para deixar claro que o cliente não é, ou não deveria ser, gado.

supervia2Enquanto isso o dinheiro público, que parte do povo acha que não deve ser usado pra financiar campanha, é gasto em reformas de estádios  como o Maracanã cujas reformas de 1997 para cá custam, se somadas, quase que dois bilhões de reais, e nesses estádios o povo não terá como pagar pela entrada, aquisição de trens para concessionárias que o chicoteiam, obras faraônicas que funcionam por seis meses e depois voltam a estado de caos que ao pobre é tão familiar que ele entuba como se fosse da vida e por ai vai.

Quer entender como funciona o jogo político e quem é o culpado pela sua falta de luz, internet e telefone? Siga o dinheiro. Ele vai revelar que o culpado tá muito longe de ser o péssimo e mal pago atendente da operadora, mas talvez seu amigo vereador, deputado, prefeito, governador, presidente que você elegeu e cuja campanha foi paga por um dinheiro privado que o doador vai receber com juros via obras públicas.

E isso não vai mudar enquanto o financiamento público de campanha não for resolvido, enquanto os serviços públicos não forem realmente fiscalizados e terem de forma transparente seu exercíco à disposição da população.

images (1)Mas não espere que isso mude através de Dilma, Aécio, Eduardo Campos, Paulo Bernardo, Serra, Haddad, Eduardo Paes, Sérgio Cabral, Lindbergh, eles não vão mexer nos seus sócios, seus financiadores, eles não são loucos.

Brasil: Um País de esqueletos no armário #desarquivandoBR

tumblr_m2clmrKfeC1qejpkbo1_500A história do Brasil é repleta de esqueletos no armário, do impedimento do encontro das muitas faces da verdade ocultadas em armários, gabinetes, medos e pavores dos que comandam a pátria mãe tão distraída.

Da Abolição a Canudos, do Contestado à Revolta da Vacina, da Revolta da Chibata à Vargas, de Vargas a 64, de 64 até 2013, o número de esqueletos no armário só aumenta, fazendo com que o país necessite de muitas comissões da verdade para extirpar as manchas indeléveis que permanecem nítidas em sua história e são reproduzidas no cotidiano da sociedade através das eras.

Charge 1As torturas nas delegacias de hoje são frutos da reprodução das práticas das tantas ditaduras ou do passado escravista onde o outro devia ser reduzido pela dor à uma peça obediente para que o controle social fosse efetivo?

As mortes cotidianas de jovens negros são fruto da política das ditaduras sendo mantidas com as mesmas táticas e diretrizes ou da criminalização de negros e pardos como pobres, e portanto criminosos, que se iniciou ainda no pré-abolição?

imagesA secessão entre pobres e ricos, as restrições de protestos, as restrições de expressão, a violência cotidiana com relação a direitos das minorias majoritárias, a manutenção na porrada dos padrões de comportamento em uma disciplina social ferrenha, autoritária e violenta são fruto dos resquícios da ditadura de 64 ou dos muros invisíveis erguidos para justificar a escravidão e manter o controle social sobre escravos, pretos, pobres e mulheres por uma sociedade escravista onde o macho adulto branco não fazia a menor questão de não reivindicar seu lugar no topo da cadeia alimentar?

São muitas as perguntas e nenhuma das respostas deveria ignorar que cada esqueleto guardado no armário torna o Brasil um país com uma das sociedades mais injustas do mundo, e que não só não resolve seus problemas do passado como se esforça para alimentar o faminto armário de mais esqueletos para a manutenção da nódoa de lama e sangue a qual nomeia História.

images3A manutenção dos ossos no armário não permite o reconhecimento da história do Morro da Providência e a presença fundamental daquela população onde está para manutenção da memória dos primeiros atingidos pelas inúmeras reformas urbanas do Rio de Janeiro e pela memória da guerra do Paraguai e Canudos.

A manutenção dos esqueletos no armário permitiu que João Cândido morresse na miséria, sendo mantido pela marinha como criminoso, mesmo tendo sido um herói da luta antirracismo naquela força armada.

jt11_ditaduraA fome do armário de ossos também mantém a lógica de resistência a uma fictícia guerra entre comunistas e a “nação” que produz Bolsonaros e Felicianos e também mantém Canudos e Contestado como anátemas para um exército acostumado e pisar na cabeça da população que cisma em fugir de uma ordem platônica erguida pela corporação e cujo lema Ordem e Progresso não se furta a atropelar peles pretas e pobres que por acidente estejam em seu caminho.

militaresarquivosditaduOs esqueletos no armário também mantém até um governo, onde boa parte de seus membros é vinculado diretamente à resistência contra a ditadura de 1964, refém de um pragmatismo torpe e cúmplice da manutenção dos esqueletos dos mortos e desaparecidos pela ditadura militar ocultos sob camadas e camadas de arquivos fechados e cujo teatro da Comissão Nacional da Verdade nem de leve pensa em remover o pó que os oculta, um pó repleto da tradicional injustiça de nosso Estado, de nossa Pátria, que devia ser fratria e nem mátria é.

ditadura1Enquanto os homens exercem seus podres poderes o armário permanece alimentado de esqueletos, alguns muito antigos, e o país rico, que se pretende sem pobreza, segue batendo em índios, negros, gays e mulheres. Segue mantendo a injustiça e prosseguindo sob uma lenga lenga de “Mudamos a vida das pessoas” deixando os rastros de sangue de uma ausência de qualquer mediação entre a violência conservadora do status quo e os inúmeros atingidos pelo seu voraz caminho de enriquecimento dos barões e amigos do rei.

esqueleto limparEnquanto os homens exercem seus podres poderes e buscamos fazer renascer nosso carnaval o grito de “Apesar de você” segue preso numa garganta acostumada a romper o silêncio da paz de cemitérios que é nosso país na marra, na rua, numa raça que só quem possui a estranha mania de ter fé na vida poderia ter.

Os arquivos são muitos, os esqueletos são muitos e serão mantidos fechados enquanto não entendermos que a morte dos Juvenais e Raimundos, de tantos Julios de Santana, se refletem no Xingu, em Belo Monte, na Providência, em Manguinhos, no Capão Redondo, em Porto Alegre, no Mato Grosso, na Avenida Paulista.

frase-se-voce-nao-se-pode-livrar-do-esqueleto-que-esta-no-seu-armario-e-melhor-que-o-ensine-a-george-bernard-shaw-154307Para amanhã ser outro dia é preciso que entendamos quem manda na chave dos armários onde os esqueletos estão guardados, é preciso que entendamos quem se mantém guardando os esqueletos desde o Império e ainda hoje, em um governo do ex-Partido dos Trabalhadores, possui o poder para continuar alimentando-o com novos ossos.

ditaduraÉ preciso que lembremos sempre a memória de tempos onde lutar por seu direito era um defeito que mata, e para isso é preciso que lembremos o tamanho do armário de ossos, os tantos ossos ali ocultos, que lembremos quem guarda a chave, para que o abramos e deixemos sair nossos heróis que não morreram de overdose, mas de História, e nos aguardam para que os façamos ver o sol nascer a nosso lado, como memória, como verdade, como justiça.

Post participante da VII Blogagem Coletiva #desarquivandoBR..

Dos ódios – Sobre religião, conjuntura conservadora e esquerda

imagesA síntese da existência só Marcos Felicianos e Malafaias não é nada simples e por isso mesmo não pode, e nem precisa, ser reduzida à meras questões de religião.

O adágio “A religião é o ópio do povo”, repetido como mantra por legiões de socialistas “marxistas”, ganha ao ter de si excluído o contexto a condenação da religião de automático, a fé em si, como ferramenta de dominação dos mais pobres, que por conseguinte não passam de ovelhas assustadas, incompetentes, covardes e, porque não, completamente idiotas.

Ao terem diante de si os Felicianos Malafaias da vida e seus inúmeros seguidores e repetidores das loucuras odientas proferidas pela dupla, os discípulos do simplismo marxista ganham quase que um presente divino para a manutenção da repetição descontextualizada do adágio quase sacralizado “A religião é o ópio do povo”.

Essa guerra religiosa entre fiéis de Felicianos Malafaias e Marxianos do sétimo dia no entanto é apenas um péssimo Vaudeville que oculta questões muito maiores e que talvez nos ajudem tanto a compreender o adágio “A religião é o ópio do povo” em seu contexto, quanto a entender que o problema todo é muito mais amplo e complexo do que a religião.

Michel Lowy em seu texto “Marxismo e religião: ópio do povo?” nos dá uma dica que o problema é mais complexo inclusive em Marx ao nos explicar que:

é claro que qualquer perturbação histórica das condições sociais provoca ao mesmo tempo a perturbação das concepções e das representações dos homens e por conseguinte das suas representações religiosas”. Este método de análise macro‑social terá uma influência duradoura sobre a sociologia das religiões, mesmo para além do movimento marxista”.

Neste trecho Lowy cita de Marx que a religião é um dos aparelhos usados pela ideologia dominante para exercer sua dominação, ela não é em si, no plano da fé, a dominação ou o efeito dela, mas é um aparato, um mecanismo utilizado para a dominação assim como “O direito, a moral, a metafísica, as ideias políticas,etc. Ou seja, Lowy deixa claro ao analisar Marx que o adágio “A revolução é o ópio do povo” estava longe de isolar a fé como elemento opiáceo por si só, mas que ela é, junto com outros elementos, um mecanismo de uso pela elite dominante para controle social.

Marx mesmo no trecho citado indica que mudanças na conjuntura histórico-social alteram a religião e seu papel no plano social, de influência das massas. Por isso nenhuma fé é imune às mudanças históricas e tampouco seus fiéis, pastores e simpatizantes são nascido em marte, produzidos em caixas de sapato e importados posteriormente para nosso planetinha. A religião, assim como o direito e a ideologia política, refletem a conjuntura histórico-social, refletem o arcabouço cultural em andamento, refletem seu tempo.

Como aparato ideológico a Religião é o ópio do povo tanto quanto a TV ou o jornal, quanto o churrasquinho na laje ou o Varguismo e o Lulismo. O efeito opiáceo, no sentido de produtor de delírio, indicado por Marx então permite até outras interpretações que abundam no plano da justificativa cultural da religião ser uma arma de alienação consciente e temporária, via torpor da consciência, quanto o vinho ou místicas político-partidárias.

Grosso modo: Religião não nasce em árvore, não sai da tumba amaldiçoando o populacho da estupidez delirante, ela é um produto que além de não ser monolítico reflete a conjuntura e se torna a voz dela em muitos aspectos, é um dos aspectos visíveis da ideologia dominante, hegemônica, assim como a aversão ao Funk.

As provocações embutidas nos vários parágrafos não são a toa, é porque parte da hojeriza dirigida à religião, e classificando denominações inteiras, teologias inteiras, em caixinhas reduzidas, rasas, nada mais são que preconceitos de cunho elitista com os fiéis das denominações .

Os pentecostais são divididos entre ladrões (Pastores) e idiotas (fiéis) menos pelas características analisadas in loco destes indivíduos em suas manifestações e mais por generalizações que entendem que um pastor da Assembleia de Deus em Madureira é igual a um Feliciano, dado que ambos são pastores e da mesma denominação. Da mesma forma só há idiotas na plateia, só idiotas e a teologia da prosperidade é uma armação para a conquista de dinheiro, apenas isso.

Ao colocar desta forma os explicadores da religião e “iluminados” que veem a verdade não conseguem identificar em milhões de pessoas e quadros conjunturais diferentes as inúmeras variáveis possíveis na composição social das congregações, do quadro pastoral, de cada religião, da estrutura política montada por ela ou a que ela tem acesso e mais, da conjuntura cultural geral da sociedade brasileira e mundial hoje.

A solução via generalização seria genial se não fosse uma bobagem reducionista e que não explica nada.

Como explicou tio Marx a religião é vinculada à sua realidade social e responde a ela de acordo com as transformações culturais que esta lhe apresenta. A religião é, antes de mais nada, uma forma de ler o concreto a partir de um filtro não científico. A religião reage ao concreto e estabelece explicações a partir disso.

As religiões não se furtam a construirem respostas em um quadro de profunda guinada conservadora mundial após os anos 1960, onde uma revolução cultural mundial levou à profundas transformações no status quo desde no plano das relações afetivas até nas relações jurídicas, onde a lógica do sexo não monogâmico, a luta por direitos dos LGBT, negros, ampliação do eco do feminismo velho de guerra, o surgimento dos movimentos anticolonialistas, de valorização dos direitos dos povos originários se expandiram ao máximo no rescaldo da guerra fria que ainda se organizava no pós-segunda guerra onde medidas extremadas de repressão eram mundialmente rechaçadas depois da derrota das totalitárias Alemanha Nazista e Itália Fascista.

O Maio de 1968 foi um marco cultural fácil de ver e de ser reivindicado, assim como Stonewall, marcha dos milhões com Luther King, Cidade do México,etc, mas também foi, foram, marcos de um momento de expansão democrática das lutas e do sentimento mudancista e “revolucionário” que já incomodava não só a elite conservadora como a população que se via perdida diante de velozes transformações culturais que modificavam a própria rede de explicações do real que eram mantidas por eles pelo uso comum da cultura.

Na América Latina as ditaduras formam o elemento acabado da resistência político-cultural conservadora, mas o avanço de governos republicanos e de uma pregação antiliberal nos EUA, repressão na Itália, Alemanha, França e Inglaterra, tudo isso já era parte do movimentos das forças conservadoras de retomada de sua hegemonia abalada por movimentos múltiplos político-culturais que buscavam dentro da guerra fria criarem um mundo diferente.

O reflexo disso foi ao fim dos anos 1970 as eleições de Tatcher e Reagan na Grã-Bretanha e EUA como marco de definição política da hegemonia conservadora que se gestou em reação às transformações culturais dos “anos de ouro” pós-segunda guerra. Essa hegemonia conservadora assume a direção de duas potências e a liderança do golpe fatal numa decadente URSS que ainda tenta uma sobrevida em ações imperialistas e busca resistir às pressões internas por maior liberdade e mudanças econômicas, mas que cai ainda na década de 1980 abrindo o espaço para não só a consolidação da hegemonia ideológica neoliberal como para a cristalização a partir dela de um novo conservadorismo de cunho ultra-capitalista.

Se na América Latina esses movimentos foram menos claros nos anos 1980 de um sentimento desafogado de libertação das duras ditaduras militares, eles não foram, no entanto, menos eficientes. A partir da lei da anistia o sentimento de expansão da liberdade de que era o momento de libertação do povo Brasileiro o que se reorganizava como resistência era o rescaldo dos movimentos e organizações que forma triturados por uma máquina de destruição estatal chamada Ditadura Militar. Os principais quadros de organizações e movimentos foram mortos, os prováveis elementos de renovação idem. A teologia da libertação era severamente perseguida pelo aparato eclesiástico comandado por João Paulo II e sofria baixas constantes.

Com uma igreja incapaz de responder de forma competente aos anseios religiosos populares, com a dificuldade e o preconceito envolvidos no envolvimento com as religiões afro-brasileiras, com a ausência de movimentos de esquerda abertos ao diálogo para além do marxismo-leninismo clássico e a queda paulatina da esquerda religiosa, a teologia da prosperidade nadou de braçada em um quadro de paulatina crise econômica e cuja exigência de resignação das teologias mais tradicionais não encontrava mais eco em barrigas vazias e sem esperança de um povo bastante sofrido.

Neste rescaldo de ditadura crescem as igrejas neopentecostais no Brasil e crescem vivendo também a necessidade de um diálogo com um povo mergulhado em uma ideologia conservadora e também reticente quanto à “modernidade” das drogas, do sexo livre, dos LGBT publicamente expostos à sua frente. Vale dizer que nas décadas de 1980 e 1990 mesmo no seio da esquerda e dos movimentos progressistas a resistência a estes temas não só não eram isoladas como ainda hoje existem e muito no interior de quem em tese deveria se organizar de forma mais libertária.

Neste quadro a teologia da prosperidade nasce como uma resposta plenamente inserida no contexto cultural neoliberal crescente, ela nasce a partir de uma lógica simples onde “Se Deus está contigo você será próspero” e é construída não só a partir da simples pregação de mantras funcionais no cotidiano, mas também pela criação de uma rede de solidariedade e compartilhamento de experiências, e também de resultados, econômicos que acaba criando uma situação de plena resposta da fé ao cotidiano do fiel. Um fiel tem sucesso e o compartilha, por vezes gerando empregos, com outros da mesma denominação, e isso acaba virando uma espécie de “egrégora’ positiva, que atrai novos fiéis, que se entende agora também inseridos na sociedade, não só na sociedade local da igreja, mas também refletindo em sua maioria valores competitivos em voga no seio geral da sociedade.

Enquanto a elite e a classe média mergulhavam na autoajuda e na espiritualidade “libertária”, que se lida com cuidado também é um eco da hegemonia cultural neoliberal, no discurso da sustentabilidade ambiental reduzida a soluções individuais, a maior parte da população que se desligava das religiões tradicionais buscava a aceitação social e a melhoria da qualidade de vida na teologia da prosperidade e nas igrejas neopentecostais.

A teologia da prosperidade portanto não pode ser lida apenas como um discurso malandro de gênios da lucratividade estelionatária, ele tem também o eco e a expansão baseada em um ethos coletivo e um ethos coletivo que tinha íntima ligação com o ethos social em voga. A legitimidade dela está no fato de ser um discurso teológico construído a partir de uma leitura organizada do real, da conjuntura local e de se manter dentro de uma organizada expansão social que vai além do golpe fácil e do planejamento amplo de enriquecimento de um grupo reduzido, ela é um caso claro de consolidação de uma resposta religiosa a uma conjuntura cultural socialmente estabelecida.

A teologia da prosperidade não difere da lógica competitiva do mercado, não é um alienígena dentro da lógica capitalista e nem filha ilegítima da Ética protestante e do espírito do capitalismo. Ela é na verdade irmã dileta via religião da produção de uma ideologia de cidade, cotidiano, cultura, sexo, laços familiares e comunitários que permeia toda a ação do capitalismo nos anos 1990/2000.

A teologia da prosperidade é irmã da construção das cidades-mercadoria ou do desenvolvimentismo consumista. Não à toa as forças políticas organizadas em torno destas manifestações da hegemonia ideológico neoliberal são também aliadas políticas em suas organizações partidárias.

Enquanto isso se estabelecia a esquerda conduzia-se em um paulatino abandono de suas bandeiras originais e fragmentações, com tudo isso escondido na expansão do PT rumo à ordem e à opção preferencial pelo eleitoral, trazendo também a cooptação dos movimentos sociais independentes que se viram reféns desta lógica e ainda se mantém.

O que hoje se estabelece de convergência entre a esquerdas petista (e parte do PSOL e REDE) e o conservadorismo no âmbito visível do eleitoral é também fruto de uma ampla convergência social e de um quadro onde a lógica conservadora se estabelece como regra, consolida-se como hegemônica no mais cruel quadro de hegemonia ideológica e da derrota da esquerda pós-1989, como se fosse o rubicão das forças libertárias.

Feliciano e Malafaia são o exemplo acabado deste processo, são a ponta do iceberg de um processo histórico mais amplo que suas denominações religiosas e são também exemplos máximos de um conservadorismo que se não fosse religioso seria sindical, partidário. São figuras que se consolidam como liderança não por serem diferentes, mas por serem iguais. Se consolidam como lideranças não por serem pastores, mas por refletirem o conservadorismo de sua base. E não cabe a eles transformarem esta base, cabe a nós.

Para dialogar com esta base precisamos entendê-la e também entender que diálogo não significa concessão.

Para combater uma hegemonia ideológica o pior caminho é reforçar sua resistência via reprodução com sinal trocado de preconceitos. Transformar a fé em uma manifestação de estupidez para combater o conservadorismo dos atores é ignorar o alvo, o conservadorismo, pelo preconceito que se tem contra a fé.

A construção da reação à hegemonia conservadora precisa deixar de ser teoricamente conservadora e limitada à arabescos produzidos em cima de dados mal lidos e de senso comum remasterizado. Só assim vamos além do ódio, e agiremos taticamente para retomar uma hegemonia perdida nos anos 1960.

Falta mais que água no Rio de Janeiro

f_118488Qualquer historiador meia boca que tenha contato com a história do Rio de Janeiro sabe que falta de água é um problema gigantesco, antigo e perpetuado na cidade. Apesar das obras de Carlos Lacerda terem minimizado o problema ao efetuar a construção do complexo do Guandu, os problemas não foram interrompidos, especialmente na ampla área territorial que compreende as zonas norte e oeste.

Nos últimos vinte anos, no entanto, o crescimento da cidade ampliou o problema e a ineficiência na gestão da CEDAE pelo governo do estado, com a cumplicidade omissa dos diversos mandatos que passaram pela prefeitura, foi também ampliando.

Desde os (des) governos Garotinho e Rosinha a CEDAE passou por um processo de transformações que, mesmo com a renomeação para nova CEDAE, não só não alterou o quadro de problemas no abastecimento de água como apontam para uma preocupante lógica de desmonte com precarização que classicamente precedem a privatização dos serviços de água e esgoto do Estado.

EduardoPaes2A partir da lógica privatizante clássica do neoliberalismo maquiado pelos (des) governos aliados do social liberalismo petista, os serviços de abastecimento de água e esgoto pioraram demais nos últimos anos.

É naturalizada a falta de água no subúrbio e na zona oeste, assim como são naturalizadas as práticas de descaso completo com o atendimento das reclamações e com explicações a respeito da falta de água.

Com as obras das Trans (Transcarioca, Transoeste) o problema aumentou e sem nenhum tipo de explicação por parte dos órgãos públicos e concessionária. Há informações de interrupção do fornecimento de água entre dez horas da manhã e onze horas de noite, cotidianamente, para desespero da população que sofre para tomar um mísero banho, especialmente no alto verão da cidade.

S_rgio_CabralPara completar o descaso a falta de energia virou um hábito nas zonas norte e oeste, com a Light, concessionária (ir)responsável por este serviço, atuando de maneira incompetente e de forma até insidiosa buscando a partir de registros individuais de ocorrência categorizar os problemas como de foro individual, casa a casa, quando na maioria das vezes é regional, atingindo de quatro a oito quadras até mesmo a bairros inteiros destas regiões.

Assim nem o hábito do uso de bombas d’água pelos moradores, calejados na situação de falhas de abastecimento, consegue dar conta desta tragicomédia cotidiana.

imagesAlém da gravidade óbvia do péssimo serviço a omissão das autoridades é gritante. Não se vê o recém reeleito prefeito Eduardo Paes, eleito capitaneando um amplo consórcio eleitoral com dezenove partidos, ter qualquer tipo de ação que atue de forma a exigir que os habitantes da cidade não sejam expostos a tal descaso. Menso ainda se vê, lê ou ouve qualquer fala do atual (des) governador Sérgio Cabral diante da óbvia incompetência e desrespeito da concessionária que pretende privatizar no que tange ao atendimento da população.

imag7esTalvez por estarem mais interessados na venda da cidade, na privatização dos serviços e no atendimento dos interesses de amigos empresários como Eike Batista e de empresas como a Delta, a CCR (Afiliada Odebrecht), os atuais mandatários prefiram ignorar a população que majoritariamente os elegeu e manter o lucrativo plano de responsabilização da Copa do Mundo e das Olimpíadas pelas ações que interessam a seus parceiro$$ e que tornam a cidade mais palatável ao visitante estrangeiro e à ciranda lucrativa que com lenços na cabeça zombam do trabalhador que diariamente sofre com sua interessada omissão.

images2Diante disso o que esperar das agências reguladoras que atuam menos no sentido de promoverem ações e mais no sentido teatral de fazerem cena, escada, para a permanência da lucratividade de concessionárias incompetentes?

O que esperar do consórcio presidencial, também sócio de prefeitura e governo do estado, que se diz voltado à “transformação da vida dos mais pobres” e que se cala diante do descalabro que está em curso no Rio de Janeiro?

Absolutamente nada.

sergio-cabral-filho-0001Sócios do sitiamento da cidade pela Odebrecht-CCR, concessionária que atua em todos os modais de transporte de massa se não diretamente via metrô/Trem/Barcas como concessionárias dos pedágios do estado; sócios dos interesses de Eike Batista e Fernando Cavendish; sócios eleitorais e econômicos dos interesses de empreiteiras e bancos que os financiam nas eleições, e que são regiamente pagos por obras de extensão da tripa chamada metrô, Belo Monte,etc, os atuais governantes preferem calar-se e manter menos a governança que protegeria os mais pobres e mais a roda da fortuna atendida por suas ações.

25set2012---o-prefeito-do-rio-de-janeiro-e-candidato-a-reeleicao-eduardo-paes-pmdb-visitou-a-escola-municipal-andre-urani-na-comunidade-da-rocinha-1348581444786_956x500E diante deste quadro o que resta à esquerda é organizar a população e buscar resistir ao trator das reformas urbanas que só atendem os lucros e expõem a população a falta de água, à falta de luz, ao descasos dos transportes, ao avanço das remoções, ao tempo perdido em ônibus cheios e mal aparelhados, ao tempo onde é jogado como sardinha em lata nos vagões superfaturados de trens e metrôs.

Falta mais que água no Rio de Janeiro, falta muito mais.

images4Nos cabe enquanto isso lembrar ao Prefeito e governador que a memória popular, ao contrário do que diz o mantra despolitizado e conservador, se mantém viva, e costuma vaiar em blocos quando o sorriso cínico aparece no carnaval.