Entre o otimismo da vontade e o pessimismo da razão

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O Governo Jair Bolsonaro expõe as tripas da direita e da elite em praça pública, mas também expõe o imobilismo e a incerteza de uma esquerda que ao mesmo tempo que se organiza no âmbito institucional se fragiliza no espaço público, na rua.

E isso ocorre porque esta mesma esquerda nos mais variados graus prefere se esconder em ambientes controlados do que arriscar a disputa pelas consciências na rua.

Esse fenômeno já ocorreu a partir de 2013, quando parte da esquerda, inclusive a dita esquerda radical (De PSOL a PCO), preferiu criminalizar arroubos de ação direta destrutiva a discutir e disputar essa galera que quebrava vidraça.

Se preferiu, do alto de uma razão irracional e negacionista dos movimentos históricos, por água no moinho da criminalização, de processos, despolitização e violência policial contra os mais radicais (Parte dos socialistas, anarquistas e autonomistas) apostando numa manutenção no poder por inércia de uma ex-querda cada vez mais social-democrata (pra ser gentil) que fazia acordos pornográficos com a extrema-direita entregando anéis e dedos achando que o lulismo sozinho sustentaria dinastias de democratas com pendores sociais no Planalto.

À criminalização pelos discurso se seguiu a criminalização pela justiça, pela polícia, especialmente depois da mal explicada morte do cinegrafista Santiago, com uma nova geração de esquerda vendo novas lideranças não alinhadas à esquerda partidária ser presa, processada, ver a vida ruir e seguir sendo transformada em pária por tentar mudar o mundo.

De Gilberto Maringoni (PSOL-SP) e parte das correntes do PSOL atacando autonomistas e anarquistas (FIP, etc) como “Vândalos protofascistas” até Tarso Genro e Agnello Queiroz (governadores do RS e DF, respectivamente, eleitos pelo PT) enviando suas polícias atrás de ativistas (entre eles ativistas do PSOL), a folha-corrida que mancha a trajetória das esquerdas, com as digitais no esvaziamento da rua pela esquerda com sua ocupação pela extrema-direita, é algo continuadamente omitido pelos mais simplórios e rasos emissores de “análise” sobre as conjunturas, e que hoje acham lindo eximir Dilma de culpa pelo seu ocaso.

Não à toa há um coro de animação histérica sobre revoltas mundo afora e que adora Cânticos dos cânticos da euforia alucinada que repete “Não passarão” para o fascismo, enquanto eles não só passam como dão ré. O problema é que esse coro não rima com o movimento.

O grau de organização e organicidade dos discursos de redes sociais é perto de zero, e mesmo com o crescimento de organização e organicidade de uma revolta palpável nos partidos de esquerda(difícil medir em organizações autonomistas e anarquistas, mas apostaria que também está alta a procura de organização), isso não tem se refletido numa mobilidade de ação que mantenha essa galera entusiasmada.

E parte do problema é que se vende sonho, não se vende o trabalho e a organização necessária para agir e transformar.

Não é um fato incomum para a esquerda o discurso que alimenta “primaveras” não ir além do conversê pra organizar essas primaveras.

Porque transformar exige tocar em vespeiros (homofobia, racismo, machismo estruturais, por exemplo), e ninguém quer tocar em vespeiro e arriscar perder voto, ou poucos topam o risco.

Mais seguro gravar com o Quebrando o Tabu.

As manifestações pela educação foram maiores do que as contra a Reforma da Previdência e pouco se tentou aprender com isso. Pior, pouco se tentou avançar no debate sobre educação em si, pouco fomos além do debate que discute o quanto a universidade precista ir mais pra rua e divulgar sua serventia.

A questão é que a educação atinge todos e especialmente atinge uma galera em formação que mesmo tendo sido pega pela perna pelo Novismo liberal, percebe que a vida não é filme, você não entendeu, e foi pra rua discutir e disputar a necessidade de universidades públicas, porque sentiu na pele e isso lhes deu experiência, experiência que é a base da formação de consciência.

Já a Previdência é um campo onde a disputa está com quem já está às vésperas de se aposentar ou é adulto e tem convicções menos flexíveis com relação a seu dia a dia e seu futuro, convicções que por vezes lhe são deletérias.

A aposentadoria é, pros mais jovens, uma utopia, um futuro, que hoje quase não mais existe.

E o bombardeio sobre o quanto a Deforma da Previdência era necessária, é algo que beira os vinte anos e buscando exatamente sua destruição. Qualquer opinião que revelasse ser uma manobra de opinião pública tinha oitocentas dizendo que a esquerda era negacionista.

Destruir o ensino público ninguém vai dizer às claras como disse que era preciso destruir a previdência. E mesmo assim não conseguiram passar a capitalização.

A questão é que o fôlego da resistência via educação parou, e por quê? Porque parte dos atores que estavam envolvidos na não construção concreta da resistência à Deforma da previdência percebeu que perderia o controle da indignação se continuasse a apoiar os movimentos contra o desmonte da educação, pior, ainda comemora como vitória a manobra do Desgovenro Bolsonaro de, a dois meses do fim do prazo para sua utilização sem que isso impactasse no exercício de 2020, liberar recursos cortados em março.

Mas parou o fôlego? Não exatamente, apenas se reduziu e agora precisa de mais esforço para reavivar a chama, especialmente quando é visível que o neoliberalismo está nas cordas por conta dos movimentos de resistência no Equador e Chile.

Mas como lidar com isso se a esquerda via de regra prefere agir como coro de contente em rede social do que segurar o rojão de organizar, filiar, agir para concretizar seu aumento nos espaços possíveis.

Há interessantes campanhas de filiação, ao PSOL por exemplo, mas isso basta?

Não, porque é preciso existir ações públicas cotidianas que façam as pessoas se sentirem úteis, é preciso também curso de formação abertos e didáticos, com o cuidado de jamais se tornarem cursos de doutrinação (não dá pra confundir formação com proselitismo de dogma), e são muito precisos meios de ação de convencimento para além de divulgação de atos e ações.

Isso tudo é uma ideia de construção de organização partidária, há outros caminhos possíveis, e é didático pra evitar que militância se confunda com a enojante mistura de culto à personalidade com discurso esfuziante de uma alegria militante que nada faz além de divulgar um “Não passarão!” sem práxis que impeça o fascismo de passar.

Porque é disso que faz parte da militância, que confunde a necessária ação contra o desânimo, focada na nossa memória e nos nossos fetos, com uma falsa felicidade estagnada que não constrói porra nenhuma e ainda fica saudosa de péssimas experiências porque hoje estamos literalmente fudidos na mão de um presidente com banca de miliciano.

Não, amigos, não estamos vencendo. Estamos perdendo de um time ruim por 7×1, o gol que fizemos foi de honra e o fato de outros times estarem virando o jogo, ou perto de iniciarem a virada, não faz da esquerda do Brasil mais do que observadora enquanto a extrema-direita vem de novo ameaçar nosso gol.

A mobilização do Chile está vencendo a extrema-direita, mas é lá, não é aqui e não estamos fazendo muito para trazer aquela indignação pra cá, além de comemorar e chorar vendo a foto dos outros, enquanto mugimos “saudades do meu ex” e achamos Maia democrata.

Com o Desgovenro Bolsonaro em derretimento acelerado e sendo questionado por elite e direita, sentamos em cima do gol de honra marcado em março com nossas mobilizações pela educação e achamos que tá bom porque dá pra esperar de um a três anos (dá?) pra demover Bolsonaro de sua cadeira que mancha de óleo nosso litoral e a vida de pescadores e povos originários, amplia o número de feminicídios e crimes de ódio, queima a Amazônia e avança sobre terras indígenas.

Não adianta pedir a queda de Salles e Weintraub se o chefe deles poderá nomear outros dois canalhas.

Não adianta ter medo de Mourão ignorando que a bola da queda de Jair tá quicando na nossa frente e a gente tá deixando Maia e Toffoli o manterem no poder enquanto as digitais do assassinato de Marielle, rachadinhas e aparelhamento criminoso do poder avançam sem suar.

O otimismo da vontade do nosso discurso é delusional e tenta calar o pessimismo da razão que explicita nossa imobilidade.

Sim, a imprensa liberal erra ao dizer que a esquerda está parada na institucionalidade, porque nessa ela não está, mas acerta, sem mirar lá, pra dizer que ela tá omissa na rua, na chuva, na fazenda ou numa casinha de sapé,

Com exceção dos indígenas, povos originários, Sem teto e Sem terra, o restante da esquerda tá olhando pra ontem, e em vez de ser pra revolução Russa tá olhando pros governo Lula como se fossem o Reino Encantado de Aruanda.

A gente precisa do pessimismo da razão, porque estamos perdendo e o fato do time de lá ser ruim e o juiz ter cansado de roubar não transforma o resultado uma vitória.

Mas também precisamos de um otimismo da vontade real, que faça com que, mesmo com todas as tretas, a gente levante no dia seguinte e faça acontecer as organizações, os atos, as produções de conhecimento e programa, as ações necessárias.

O otimismo da vontade não é um alento pro pessimismo da razão, mas o combustível pra, de forma realista, transformar a realidade que faz a razão ver tanto pessimismo.

É fundamental sairmos do transe que sonha com a volta de Lula como nosso Dom Sebastião de Garanhuns e pormos em prática movimentos de organização e organicidade que permitam que a conjuntura mude e que ele possa ser o Dom Sebastião de Garanhuns pra quem precisa de um homem pra chamar de seu.

Temos que pôr em prática movimentos que permitam que saibamos quem mandou matar Marielle e porque Jair, Flávio e Queiroz estão desde sempre produzindo canalhice e fake news sobre ela.

Pra sairmos do transe é preciso construir meios de irmos pra rua, é preciso fazer banquinha com material, discutir no cotidiano, filiar gente, chamar passeata, cobrar as lideranças porque não estamos agora gritando “Fora Bolsonaro!” e estamos tentando derrubar ministro.

Há um latifúndio para nosso otimismo da vontade ocupar e há uma conjuntura violenta que o pessimismo da razão precisa ver.

E pra vencermos é fundamental agirmos com o primeiro, enxergando com o segundo.

As ocupações de escola e como os secundaristas são o avanço da esquerda no mundo de hoje.

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Pode não dar em nada essas ocupações de escola,mas me parecem o que venho colocando há anos: Não é simples limitar o universo ao eleitoral e à saída do armário da direita a confundindo com “avanço conservador”.

Desde 2013 a direita saiu do armário, mas a esquerda idem, uma esquerda que fugira, e foge, ao ethos que nasce com o PT e gira em torno do PT (E ai a gente inclui PSOL e PSTU, sabe?) ou que remonta às tradições da esquerda no século XX (PCdoB e PCB) e a todo o ethos de organização política centrada na forma partido e no centralismo.

Direta ou indiretamente essa esquerda partidária desce na boquinha da garrafa do centralismo democrático marxista-leninista, modificando em detalhes seja na tradição trotkista (PSTU) ou na tradição stalinista (PCB e PCdoB) ou construindo uma miríade de centralismos abrigados em um partido de tendência (PSOL e PT). E mesmo nos partidos organizados em tendências o centralismo sobrevoa as divisões internas a partir da política de consenso entre lideranças ou da imposição via força com maior número de cadeiras nas executivas e que vence as votações nas direções nacionais e executiva nacional.

Essa esquerda foi confrontada de 2013 pra cá por novas formas de contestação ao status quo que vagam mais pela não identificação direta com nenhuma tradição específica da esquerda do que pela opção específica por algum tipo de identidade, bambeando entre anarquismo, autonomia e uma mistura muito louca de ethos de diversas tradições da esquerda onde ao mesmo tempo negam-se partidos, autoridade, mas também não se estabelece nenhum tipo de método, teoria ou organização específica presente nas tradições clássicas.

Essas novas formas aparecem nas ocupações de escola, nos adeptos da tática Black Bloc, no Movimento Passe Livre, nos movimentos negro, LGBT e feminista, nas universidades, nas assembleias populares e nas periferias e favelas a partir de uma juventude que experimentou os anos Lula e o acesso a bens de consumo, às universidades e escolas, e não presenciou a redução da desigualdade como prometido, e ainda presenciou um recrudescimento do racismo, da violência policial, homofobia e misoginia a partir da resistência do conservadorismo branco das elites incomodadas com pobre pegando avião e preto na vaga da universidade que antes era reservada ao filho babaca do mar de Ipanema.

E se a esquerda percebeu o contra-ataque da direita incomodada com essa juventude que saiu da ausência de perspectiva pra percepção da perspectiva crítica, ou seja, que entendeu os avanços, mas também viu os recuos ou omissões, ela ignorou e desprezou o papel de toda uma nova esquerda que surge das nuvens de gás lacrimogêneo lançadas nas ruas de 2013 até hoje, uma esquerda que sofre tanto com a criminalização feita por esquerda e direita quanto com a ausência de respeito por parte das forças ditas progressistas com sua recusa à tutela de UNE, UBES, partidos e até do MST.

E por isso é lamentável o sinal claro dado pela esquerda partidária que ao acusar o golpe, com duplo sentido por favor, e falar do avanço da direita apela pra inclusão de tudo o que surgiu de junho de 2013 para cá como parte do “avanço conservador”. Porque demonstra uma série de problemas metodológicos, teóricos, de percepção e até de moral e justiça.

De 2013 para cá explodiu uma série de coisas, mas a maior parte delas foi a recusa a um sistema representativo onde o melhor que temos é ruim, como o PT.

O melhor que o sistema representativo dava a quem saiu às ruas em 2013 era um PT que nadava de braçada na corrupção, aprovava a criminalização de movimentos sociais e já tinha deixado claro que abandonaria o que fosse pra manter a tal governabilidade.

Enquanto isso a direita reagia aos avanços que foram nítidos na sociedade desde os anos 1990, como os avanços nos debates sobre drogas, feminismo, aborto, LGBT, luta antirracista, cotas, questão indígena, questão agrária, ecológica,etc.

E como a esquerda apartidária reagiu à reação da direita? Criminalizando a própria esquerda em nome da afirmação de que a luta dentro do sistema era a úncia coisa a ser feita.

Em um primeiro momento essa ação criou dois resultados pela esquerda: Aumento da luta extra eleitoral e abandono parcial da participação em eleições, com foco total nas ações.

Não à toa a esquerda passou a perder eleições, mas mantendo ações práticas que transformaram as lutas por direitos no Brasil de hoje, como as ocupações de escola.

Ao perder apoio eleitoral a esquerda partidária se viu analisando o universo como se estivéssemos em pleno recuo, enquanto estamos em plena disputa, disputa que já havia quando Dilma era presidenta.

Já disputávamos com a direita antes da eleição de Lula, o mundo nunca foi fácil pra garantir direitos e avanços, vide a reforma da previdência com Lula, vide os recuos nas questões LGBT, racial, indígena, ecológica e de mulheres com Dilma.

Temer assanha um neoliberalismo radical, diferente do que apontava Dilma com um neoliberalismo menos afoito,mas apesar de todo apoio midiático enfrenta enorme desprezo internacional e uma radicalização de esquerda que apavora reacionários fanfarrões e seus Escola sem Partido e “abaixo a ideologia de gênero”.

Essa radicalização da esquerda e das ruas, independente de partidos, que fez com que a direita apelasse pra Bolsonaros e Escola sem Partido e não PT e PSOL.

É para evitar essa juventude independente que “não tem liderança” que se busca censurar professores e destruir a educação pública.

E essa galera tá na rua reconstruindo o que a esquerda partidária não consegue enxergar pregando reforma política e fazendo campanha a cada dois anos.

O que representa isso tudo? No mínimo o novo em matéria de política. No máximo talvez mudanças que precisávamos e nenhum partido tinha nem condições nem a coragem de produzir.

O não voto não significa mais anarquistas no mundo, nem mais fascistas: Vamos falar de Rojava?

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O binarismo político deve ter algum código qualificatório na lista de enfermidades da OMS.

Esse binarismo se manifesta de diversas formas e na maior parte delas adora transformar urubu em meu louro.

Pro binarismo político não existem árvores na floresta, inclusive floresta é um ente único, e não, não estão falando de Yellowstone.

O resultado das eleições municipais brasileiras de 2016 produziram um sem número de textos (este inclusive) e a maioria contendo tanto uma lacrimosidade estupendamente fantasiada de desespero quanto uma pomposa composição de otimismo da vontade com pouco zelo pelo bom senso.

Sim, existiu um enorme avanço nos votos inválidos.

Nenhum pleito teve legitimidade completa, na verdade a maior parte dos pleitos deste ano tiveram menos de 50% de participação, inclusive nas grandes capitais.

Nenhum prefeito foi eleito pela maioria dos eleitores.

Nenhuma câmara foi eleita pela maioria.

Esse fenômeno não é recente, e nem muito antigo.

Ao menos desde 2010 as eleições vem tendo um aumento significativo na abstenção e anulação.

Este ano foi talvez a primeira vez que repetiu-se em eleição municipal um fenômeno que passeava mais pelos pleitos nacionais,mas também foi a primeira eleição municipal depois do furação de 2013, quando as cidades entraram em enorme convulsão informando à toda a classe política que a população não estava nada satisfeita com sua representação.

Esquerda e direita responderam a 2013 de muitas formas, desde pela cooptação de sua ala à direita até a criminalização da sua ala à esquerda, especialmente a apartidária.

A GLO (Garantia de lei e ordem) e a Lei Antiterrorismo vieram em seguida a 2013 e tendo como alvo prioritário os chamados “Black Blocs”, dane-se se também vão criminalizar MST, MTST, índios, Quilombolas,etc.

Em 2014, com a manutenção da esquerda nas ruas e tendo em vista evitar problemas para a “Copa das Copas”, a GLO e a Lei Antiterrorismo foram aprovadas e pôs-se os tanques nas ruas das favelas e anarquistas e autonomistas na cadeia, sob os aplausos da esquerda partidária que assistia triunfante aquele bando de “mascarados” indo em cana e limpando a barra de suas manifestações pacíficas e ordeiras.

Com a repressão caindo em cima, um bando de gente presa, praças sob cerco da Força Nacional e o caralho, 2014 foi aquele espetáculo triunfante do micaretismo patriótico de todas as vertentes políticas amigas da “Festa da Democracia”.

As ruas, vazias de esquerda, permaneceram sendo ocupadas por quem vestia a camisa da CBF, mesmo pós 7×1, e não mais por quem dizia que “Não vai ter Copa!”.

Teve muita Copa, muita, teve muita cadeia também.

E teve eleição, com a população já se recusando a votar. E teve resultado apertado, teve eleito governando com o programa do adversário e mesmo assim com muita dificuldade. E teve Golpe, teve adversário derrubando quem governava com seu programa pra radicalizar mais ainda o programa neoliberal.

Teve isso tudo e teve crise, tá tendo crise, inclusive de representatividade.

Representatividade que foi arrombada pela prisão de anarquistas e autonomistas, criminalização de manifestantes, parte da esquerda batendo palma pra fascista dançar, parte da esquerda batendo pama comemorando a prisão irregular e indiciamento por homicídio doloso de adolescentes pela morte de Santiago, mesmo tendo trocentas dúvidas inclusive se lá estavam os jovens, e ainda tá tendo jornalista eleitor da esquerda partidária achando que a defesa dos jovens é “Criminalização da vítima”. e por ai vai.

E temos uma eleição onde a representatividade foi pro saco e quem mais perdeu foi a esquerda partidária, mesmo boa parte dos prefeitos ter sido eleito sem o endosso de metade da população de suas cidades.

Então a culpa pela queda de votos da esquerda é dos votos anulados e abstenções?

Não, é culpa de quem não se faz mais representante.

Até porque a direita também perdeu voto,mas a direita tá pouco se fudendo pra legitimidade das eleições ou de sua posse, ela não quer é gente na rua, greve e esquerda governando ou organizando resistência.

Mas e a esquerda? Bem, mesmo a esquerda que comemora ir pro segundo turno tendo pouco mais da metade dos votos do pleito anterior deveria ficar preocupada.

Primeiro porque é óbvio que parte de quem anulou nessa eleição ia votar na esquerda.

Segundo porque é óbvio que nem todo mundo ia votar na esquerda, mas não se sente fã do sistema.

E em terceiro é porque o eleito pela esquerda também não vai ter a legitimidade do endosso popular, porque provavelmente vai ter anulação e abstenção também no segundo turno.

Como resolver a questão?

Primeiro tem de parar de culpar o vento, a chuva e a grama porque perdeu o gol.

As pessoas estão fartas do sistema desde 2013 pelo menos. O recado é dado todo dia e a resposta que recebem ou é porrada ou escárnio da classe política, a de esquerda inclusive.

Só que apenas a esquerda liga pra essas frescuras de legitimidade.

Então tem de analisar com cuidado, pesquisar, tentar entender o real e reagir a ele com inteligência.

Segundo, tem de acordar pra vida e relacionar a recusa de ocupantes de escola, por exemplo, de ficarem juntos com UNE e UBES, com o fato de parte de quem se organiza e luta cotidianamente tá cagando pra eleição e não enxerga na eleição do Cachorro Vovó a segurança de ter um representante, e nem acha válido ter representante se se pode organizar e lutar com os de baixo.

As pessoas que lutam não se enxergam nos ditos representantes do povo.

Até porque parte dessas pessoas tomou uma porrada na cabeça ao ver quem era o comandante da “Primavera Carioca” e um figurão público que emanava utopia dizer “O PSOL precisa isolar os Black Blocs”.

Imagina você ver um cara que defendeu preso comum a vida inteira, com absoluta razão, botando na reta de quem estava sendo preso porque fazia parte de um bloco de gente que utilizava uma tática de resistência não violenta ativa à violência policial do estado burguês? Imaginou? Pois é, muita gente ficou puta, desiludida e pra usar uma terminologia carioca: Totalmente vendida.

E estamos falando de uma figura pública que era admirada nacionalmente.

Meses depois Sininho, Camila Jourdan, etc foram presas, vinte e três pessoas sendo presas por defenderem ideologias de esquerda, não partidária, entre os procurados estava Bakunin.

O que disse a esquerda partidária? Nada.

Isso mesmo, nada.

Em terceiro a gente vê que não se entendeu muito bem o impacto da Lava Jato em toda a classe política.

Sim, todos, que já eram chamados pelo senso comum de ladrões, sem exceção (Vai fazer panfletagem na feira de domingo em Valqueire que tu descobre isso), tiveram um upgrade em rede nacional.

Geral é ladrão.

E quanto mais parecido com petista mais ladrão, afinal além de uma cruzada ética, que contou com auxilio luxuoso da banalização da questão ética pela própria esquerda, tivemos o ressuscitamento do anticomunismo de galinheiro.

E em quarto tem de entender que o mundo mudou, e não foi pouco, e as lutas passaram a serem travadas no cotidiano, muito além do parlamento, e a resposta de gente na rua foi melhor que a resposta dem parlamentares “combativos”.

Afinal, quem baixou o valor das passagens em 2013 foi o vereador ou as ruas? E o impeachment?

Pois é, as pessoas entenderam que ir às ruas resolve muita coisa. E ai temos um problema sério: A própria esquerda criminalizou as ruas, deixando-as à mercê dos manifestantes a favor.

E isso tudo , e muito mais, responde as abstenções/nulos/brancos. E também abre caminhos de organização e estruturação da resistência,e da reação também.

A recusa ao sistema é um prato cheio pra quem tiver disposição de dialogar mais e catequizar menos.

Tem de ir explicar que educar não é professar,mas guiar.

Tem de ir conversar sobre o preço do ônibus, do feijão, do pão, do aluguel.

Tem de ir com mais vontade de propor coisas que exponham menos os pretos e pobres à violência quando eles forem à luta.

Tem de denunciar cotidianamente o genocídio de pretos e pobres e do lado de pretos e pobres.

Tem de ir saber como é antes de agir e propor.

E tem de ir rápido, porque a direita não tá de bobs.

E os estudantes tão querendo ocupar escolas, índios querem suas terras de volta, quilombolas também.

As coisas permanecem ai para serem reivindicadas, com ou sem vereadores e prefeitos, porque infelizmente com vereadores e prefeitos também não se resolveram as coisas, vide em São Paulo.

O Escola sem Partido precisa dos professores e estudantes nas ruas pra ser barrado e pra mostrar que não basta ser prefeito pra calar a boca e a força da gente.

As mudanças na CLT também, a PEC 241 idem. tudo precisa de gente na rua pra barrar e não tem outro jeito de resolver a crise de representatividade do que se fazer representado nas ruas.

Quem luta contra o sistema, quem acha que eleição é importante, todos precisam se representar no dia a dia.

É a única forma de começar a resolver a crise de representatividade.

E é preciso também discutir representatividade, que é menos importante eleger vereador e mais importante construir comissões de administração das cidades, com a participação plena da população e que ela controle orçamento, que ela discuta os ônibus, os transportes, a qualidade de vida, da água e do ar.

O recado das urnas é que a representação não importa pra praticamente 50% da população. Isso significa que nesta população existe quem quer representar a si mesmo em organizações autônomas e horizontais, quem quer um ditador e quem não quer nada disso,mas tá apenas de saco cheio.

Culpar essas pessoas ajuda a quem quer ditadura.

Dialogar com elas francamente, e horizontalmente e sem cooptação, permite outra coisa, quem sabe uma mudança séria na representatividade para além de plebiscitos tão inúteis quando o voto em si (Já se esqueceram do impeachment?).

Existe todo um debate em toda ocupação, em toda resistência, sobre novas formas de organização e de atuação nas cidades, ruas, estados, países.

Vamos deixar pra lá esse debate? Vamos continuar tratando o outro como idiota?

Rojava tá aí dando seu recado.

Não adianta vir com guaraná de reforma política pra mim, porque é o chocolate das novas formas de organização que eu quero beber.

 

Da ausência do pensar as cidades nas eleições

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Pouca coisa me incomodou mais esse ano do que o rebaixamento do debate político em todas as esferas, inclusive no âmbito das eleições municipais.

Os programas de todos os candidatos das eleições de RJ, SP, PoA e Pelotas juntos não dão um, inclusive os queridinhos da Esquerda Ciranda Cirandinha©.

Os programas de educação, questão racial, cultura e questão ambiental, que são os que eu entendo mais ou menos (Falsa humildade) são um lixo.

Como os candidatos vão lidar com o Patrimônio cultural e educação patrimonial das cidades? Esqueçam, não sabem e se sabem não rescreveram sobre.

A questão ambiental nos programas é um apanhado ruim de lugares comuns sem discutir à vera sobre mudanças climáticas e suas ligações com transporte público, redução de circulação de automóveis nas grandes e médias cidades, especialmente nos grandes centros, etc.

A questão racial é uma que dá ódio: Não tocaram, nenhum deles, na enorme necessidade de resgate da identidade negra como central para a produção das urbanidades das grandes capitais e cidades como Pelotas, isso pra não dizer todas as cidades do país.

Rio, Pelotas, PoA, SP são cidades pretas, erguidas por mãos pretas, construídas por pretos, mas cujo usufruto é branco, ninguém discutiu isso a sério, menos ainda discutiu a sério o genocídio da população preta e a necessidade de mobilização cotidiana para erradicá-lo.

Cidades como Rio, Pelotas, SP tem enorme patrimônio cultural imóvel, material ou imaterial cujos candidatos parecem sequer saber que existem e do papel da educação patrimonial na vivência da cidade e na própria construção da cidadania.

A educação é reduzida a salário de professores, construção de escolas e turno integral, mas e o ato de educar, a liberdade de exercício pedagógico, os programas de modernização da escola através de experiências bem-sucedidas mundo afora, como a “Escola do Aluno Caminhador”, programas de artes e educação física, integração com cinema, artes cênicas e dança, educação patrimonial e exercício da pesquisa histórica como ferramenta de educação? Não existem?

A educação permanece encerrada na escola, os programas das disciplinas encerrados nas salas de aula, os professores limitados ao espaço físico da escola, jamais é colocada a possibilidade da escola dinâmica, da ação construtora de percepção ampla do ato de educar, nada.

E nem a esquerda discute esses temas, a esquerda ignora a queima de carbono nas grandes cidades como parte do problema de alagamento, por exemplo.

Falar em usar transporte público de massa com uso de energia elétrica não resolve o problema, a questão precisa de maior ênfase e cuidado no debate, e ninguém vai além do slogan.

Poderíamos falar de outras tantas coisas, como o debate sobre gênero, políticas de exercício de inclusão de transgêneres, etc, e encontraríamos os mesmos problemas ou mais.

As eleições, vendidas como democracias, ignoram na verdade a própria construção democrática da cidade nos programas, mesmo entre os que vendem uma construção programática coletiva através de coisas como ‘Se a cidade fosse nossa!”.

Porque tudo é cosmético, mesmo na esquerda.

As cidades não são debatidas. As cidades do Rio e Pelotas, por exemplo, não são analisadas com sua profunda secessão geográfica com base étnica, na sua diversidade cultural construída a partir dessa secessão, e que deve ser respeitada ao mesmo tempo em que a secessão deve ser desconstruída.

Não se pensa turismo, por exemplo, pensando Oswaldo Cruz ou o Peres em Pelotas, pensando para além da orla.

Também não se pensa a integração dos setores do município em ações conjuntas, pensa-se de forma taxionômica, e não de forma ecológica, onde tudo na cidade é integrado.

E ai, quando nem os transformadores pensam a cidade, é que as cidades definham.

E essas são as limitações das eleições e do voto, porque o voto morre em torno de slogans e de má discussão das questões que envolvem os municípios. E no minuto seguinte ao término das eleições os debates sequer ocorrem.

Mas as cidades continuam.

E é por isso que eu voto nulo.

A Esquerda, a Direita, Eleições, Catequese e Colonização

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Eu voto nulo e faço campanha pro voto nulo, todo mundo sabe,mas não dá pra deixar de comentar eleições e como elas se dão, e como o comportamento da esquerda é equiparável ao da direita com relação aos mais pobres.

Os rumos eleitorais nas grandes cidades tendem a uma enorme confusão.

A direita encontrando mais dificuldade do que esperava e a esquerda, que contava com a eleição certa de Luciana Genro e Freixo e a reeleição de Haddad, enfrenta dificuldades extra nas suas caminhadas.

Parte do problema e das dificuldades da esquerda vem menos da fantasia de uma unidade mitológica perdida e mais da perda de capilaridade de sua organização no decorrer dos anos 1990,2000 e 2010.

O que isso quer dizer? Quer dizer que dos anos 1990, onde havia núcleos do PT espalhados por praticamente todos os bairros das grandes cidades, até os anos 2010, onde nem o PT manteve o que tinha nem o PSOL avançou sobre os espaços deixados pelo outrora maior partido da esquerda, a organicidade dos partidos de esquerda não só minguou como foi transformada numa mudança metodológica de organização que priorizou a formação de burocracias à formação de contingente militante e politização consciente nas cidades e interior.

Enquanto isso a direita, especialmente a vinculada a grupos evangélicos, construiu sólida expansão nas periferias e cidades do interior via velhos métodos, centros sociais e clientelismos, e novos atores, a participação cada vez mais ativa de religiosos neo pentecostais na política e inserção forte das igrejas na construção de laços de solidariedade comunal nos mais diversos locais dos grandes centros urbanos e interior.

Em resumo: A esquerda optou pelo eleitoral a partir do voto de opinião, a direita ampliou seu arco de ação fazendo trabalho de base cotidiano via igrejas e centros sociais e gerou um enorme contingente de gente que não só apoia candidatos de direita,mas os apoia ideologicamente, fazendo parte orgânica, especialmente via igrejas, das forças políticas que os mantém.

Exatamente, gafanhoto! A direita construiu militância capilarizada, enquanto a esquerda focou em manutenção de militância orgânica de classe média e expansão de apoiadores não militantes a partir de laços mais próximos do clientelismo, especialmente via lulismo, que de identificação ideológica.

E o segundo caso muitas vezes muda de lado pelos mesmos laços, e ainda passa a participar de um tipo de organicidade ideológica conservadora.

São vinte anos de transformações na direita e na esquerda, e é óbvio que isso daria em mudança no quadro eleitoral.

Nesse meio tempo outro fenômeno também cresceu nas periferias: Uma esquerda não partidária que não se identificava com a esquerda sucrilhos e combatia a direita evangélica.

Essa galera caiu dentro de uma posição apartidária,mas crítica, quando não anarquista e autonomista.

Muitos dessa esquerda periférica votam, outros não, todos são politizados e buscam um debate politizado a partir do ethos da própria periferia, seja via RAP, seja via organizações como núcleos socialistas (O IFHEP em Campo Grande no Rio é um exemplo), seja via coletivos de educação popular ou assembleias populares das periferias.

Toda essa galera tem posição combativa pela esquerda e critica fortemente o viés elitista da esquerda partidária tradicional.

E ai temos um fenômeno interessante: A direita dialoga com essa esquerda, mesmo sem contar com seu apoio e sabendo disso,mas a esquerda partidária a ataca.

E por que? Porque o pastor que aglutina os laços de solidariedade comunal que o sustentam politicamente sabe que o filho da Dona Naná que é anarquista e não vota nele é filho da Dona Naná, Primo do cumpadre meu Quelemem, irmão do Riobaldo, namorado da Zuleica, filha do marceneiro João, todos da igreja, menos o o filho da Dona Naná, que é bom menino e que isso de anarquia vai passar.

O Pastor pode estar errado no diagnóstico,mas na relação não. Ele sabe que o sujeito que ele vai combater na favela tem mãe, e a mãe é da igreja, e que os laços não podem ser rompidos, ele vai precisar conversar,mesmo com condescendência e mal disfarçado nojinho,mas vai ter de conversar.

E o assessor do vereador do partido bonito que dança tambor de criola na Lapa? Porra esse fica ofendidíssimo porque aquele fudido preto e pobre da favela do Jacó não vota no seu candidato que é a salvação da porra toda com sua proposta de fazer uniformes escolares de cânhamo que geram energia a partir da absorção da luz do sol e carregam celulares enquanto o corno fica no sol esperando duas horas pelo ônibus.

Como assim a esquerda não merece o voto da periferia?

Talvez seja porque a periferia nunca viu a esquerda, nem comeu, só ouve falar.

Esse comportamento se dá de forma simples: Catequese e colonização.

Sim, a esquerda espera uma reação de gratidão do fudido àquela que lhe leva a luz da consciência política de cima pra baixo à esquerda de quem entra. Logo ela que desperdiça domingos de sol que podia gastar na praia à passos de sua casa pra levar a luz da consciência política à esses bárbaros da favela é desprezada? Como assim não se consegue mais catequizar o pobre?

Talvez amigo, porque a direita montou posto avançado de colonização enquanto tu aparece apenas com o evangelho surrado de um marxismo cambeta.

O evangelho que vale é o do pastor que tá ali dando a cara tapa todo dia e não do missionário catequético e caquético que aparece do nada falando de um Deus Estado socialista mágico que tende a puni-lo se ele não gostar de seu messias.

Aliás, bora combinar que a esquerda que aparece pra catequizar também quer colonizar a periferia, né?

E por isso a esquerda que tá na periferia também repudia tanto o socialismo amarelo quanto o bispo Machado.

Mas quando a esquerda partidária vai entender isso? Nunca, ela sequer entende que passar na casa de alguém não é morar lá, imagina questões complexas.

O Hegelianismo travestido de Marx que a esquerda partidária insiste em usar, a partir da versão de São Lênin-Zizek-Mujica, impede por seu idealismo que a dialética funcione.

Por isso temos uma esquerda marxista sem Marx, sem antropologia, sem sociologia, sem samba.

E enquanto isso a direita tem o evangelho, e laços de solidariedade comunal, e diálogo com o filho da Dona Naná, mas o problema pra esquerda é quando o cozinheiro escreve.

 

A importância de ampliação de espaço das esquerdas nessa conjuntura

bookchin-en-1984

Em um cenário como o atual a esquerda precisa se lamentar menos e ampliar mais sua luta, sua voz, suas cores.

E isso nas ruas, na chuva, na fazenda ou numa rede social de sapê.

Não estou disposto a esquecer nosso mandato histórico de vez, e acho que é tão normal.

Dizem que sou louco, por eu ter um gosto assim, achar que nem tudo é tão ruim.

Mas metáforas poéticas ruins a parte não é hora de jogar nossas mãos para o céu e agradecermos se acaso tivermos alguma ideologia que faz a gente repensar.

É um momento específico de avanço e explico porque: A ação da direita nos últimos quinze anos não é um avanço, mas uma reação.

Dos anos 1990 pra cá, e não só imediatamente pós-impeachment de Collor, a narrativa histórico-social foi construída em torno da consolidação da democracia, de nossa “jovem democracia”.

Desde o fim da ditadura civil-militar em 1989 (Eu coloco que a ditadura termina quando temos finalmente eleições diretas e não quando um presidente eleito indiretamente assume) o sistema político e a sociedade brasileira girou em torno da “consolidação de nossa jovem democracia”.

E isso sustentou as presidências de coalização que se sucederam, de Collor até Dilma.

A narrativa era que todo rompimento com o “Estado Democrático de Direito” era uma violação do pacto social que venceu a ditadura.

E o PMDB é o símbolo, para o bem e para o mal, desse pacto e dessa narrativa.

O PMDB se construiu ainda como MDB como um organismo de coalização entre forças da direita e da esquerda para resistência à ditadura e depois para a construção do pacto social e do estado democrático de direito pós-1988.

Contendo de Sarney a Requião, entre outros elementos que organizavam desde os coronéis das oligarquias dos estados até as associações de moradores de morros do Rio e SP, o PMDB se construiu como aquele que mantém o pacto social que sepultou a ditadura e permitiu o florescimento de “nossa jovem democracia”.

Por isso foi fundamental na derrota de Collor, que com a narrativa de governo corrupto rompia ano após ano com o pacto social, na pose de Itamar, na sustentação dos governo FHC, Lula e Dilma, até quando qualquer um desses governos ameaçava o equilíbrio desse pacto (segundo o ponto de vista do PMDB e dos pactuadores).

FHC perdeu a eleição quando foi incompetente pra lidar com as crises internacionais que eclodiram de 1998 em diante.

Lula quase foi ao ló quando em 2005/2006 se ameaçou uma crise institucional relacionada a escândalos de corrupção.

Dilma quase perdeu a eleição de 2014 porque não conseguiu manter um gerenciamento competente da economia em meio a uma enorme crise econômica mundial, e foi destituída porque no enfrentamento a esta crise não foi competente, implementando medidas que a agravavam (apostando numa austeridade falida que nem a Troika quer mais defender) e, já institucionalmente frágil, não soube frear o avanço das investigações sobre o PMDB na Lava-Jato.

Em todos esses anos o PMDB foi diretamente responsável ou pela estabilidade ou pela desestabilização dos governos supra citados.

E por que? Vide o comentário acima sobre o papel do MDB na ditadura e posteriormente.

Porque o PMDB desde MDB se construiu agregando as oposições aos poderes da ditadura nos estados e municípios, agregou de parte da esquerda que estava na ilegalidade (E depois migrou pra o PT, PDT, PSB,etc) até parte da direita que era oposição conjuntural a outros elementos de direita.

Esse papel de “Movimento pela democratização” fez o MDB ter uma capilaridade invejável, e ao fim da ditadura essa capilaridade ganhava o perfume de vitória.

Parte da esquerda que ali estava não teve dúvidas em permanecer na máquina que ajudou a construir e lhe permitiria avançar sobre o estado.

Parte da direita permaneceu por ser poder e com isso vencer seus inimigos no mesmo campo ou cooptar-los em posição subserviente.

Esse máquina política avançou na nossa “jovem democracia” como avaliador dos poderes centrais e sustentador ou desestabilizador de governos dependendo do papel que exercia.

Primeiro porque sua característica sui generis de composição para ideológica impedia uma unidade que garantisse a um dos seus um favoritismo à presidência da república.

Segundo porque, virtualmente sendo governo e oposição pra sempre, conseguia algo invejável para qualquer força política em nossa história: Se estava sempre com o controle do estado, independente da força que possuísse a cabeça dos poderes.

Esse papel permitiu ao PMDB garantir-se como um partido praticamente inatingível.

Ao menos até hoje.

Por que até hoje? Porque desde que o PT ameaçou o PMDB em sua principal característica, a capilaridade e o controle do estado nos mais diversos estados e municípios, o PMDB tornou-se governo e chefe em vários postos onde para manter-se teve de organizar em torno de si uma cepa ideológica específica.

Desde os últimos dois anos o PMDB perdeu a cada dia suas características de “geleia geral” e tornou-se finalmente um partido puramente ideológico.

A própria ascensão de Temer garantiu isso, seu ministério é uma assinatura e essa característica não faz ficar à vontade nem oligarcas como Renan e Sarney, nem rebeldes como Requião.

Para eleger Pezão o PMDB abraçou Dornelles e perdeu o PT. Para eleger Sartori o PMDB abraçou Yeda e o PP, ideologicamente, e perdeu qualquer semelhança a Rigotto e Britto.

Para manter Temer o PMDB abraçou o DEM de Escola sem Partido e o pior do PSDB, além de também apostar numa austeridade falida que nem a Troika quer mais defender.

E sequer foi competente para evitar que uma rebelião interna de sua ala coronelista pudesse a perder ambos para tentar salvar Cunha, a partir da não cassação dos direitos políticos de Dilma.

Mas essa explicação dá conta apenas do caráter institucional da conjuntura,não?

Sim,mas ele espelha outros aspectos que explicam porque esse movimento simboliza também uma ação da direita que é uma reação.

Um desses aspectos foi o surgimento de uma demanda social desde os anos FHC onde os direitos humanos se tornaram elemento central no debate em torno do Estado e da sociedade.

Essa demanda e essa narrativa se espalharam por anos a fio na formação profissional e acadêmica dos mais variados campos do conhecimento, especialmente como resposta à ditadura militar.

Os cursos que formam professores são cursos onde o debate de DH é extremamente presente.

Além disso, desde o fim dos anos 1980 essa demanda ganhou também o avanço e consolidação dos movimentos sociais e estudantis como elementos centrais da organização política da sociedade brasileira.

Nas favelas, vilas e bairros pobres houve um paulatino crescimento das organizações populares.

O debate em torno das questões de gênero, homossexualidade e transgêneros foi paulatinamente se construindo como elemento fundamental do debate do papel do estado e da sociedade na garantia de direitos.

E isso desde o fim do governo Itamar tornou-se uma demanda.

Nos governos FHC inclusive o debate em torno de DH foram muito mais ricos e democráticos que durante o segundo governo Lula e o primeiro governo Dilma.

Ampliou-se com Lula o acesso dos mais pobres, e pretos, à universidade, ampliaram-se as universidades públicas, aumentou o número de conferências que discutiam cultura, educação, saúde e comunicação.

Essas conferências foram transformadoras em vários sentidos, mesmo que usadas pelos governos como ferramenta de cooptação, porque estabeleceram minimamente organizações e participação popular a partir de bairros e municípios até Brasília.

Paralelo à participação em conferências ampliou-se também o número de movimentos e organizações que construíam lutas cotidianas e mobilização nos bairros pobres, favelas e vilas.

Se os partidos de esquerda cresceram, cresceram também as organizações não partidárias que dialogavam para além da juventude de classe média.

As igrejas também retomaram as organizações pastorais com fôlego, mesmo que muitas inicialmente distantes de qualquer similaridade com a teologia da libertação e fruto dos movimentos da direita católica.

As igrejas pentecostais também ampliaram seu papel de presença política de forma bastante feroz, com a entrada em peso de diversas denominações na política partidária, sendo em sua maioria de direita, mas também gerando movimentos de esquerda no interior delas.

Todos esses movimentos geraram o que?

Uma intensa politização da sociedade, e não o contrário, e uma direção clara de confronto entre as diversas forças organizadas.

Esse confronto ganhou fôlego nas redes sociais, mas também nas ruas.

Discute-se política hoje no cotidiano muito mais do que se discutia há vinte anos.

Apesar da limitação “teórica” desses debates ela é uma vivência política que explode em uma conjuntura de alvoroço.

De uma sociedade que romantizava direita e esquerda, e um caráter pacífico de uma cultura brasileira imensamente autoritária e violenta, temos uma politização que opõe ferozmente ideologias, conservadorismo ao feminismo, conservadorismo ao transfeminismo e luta LGBT e “democracia racial” às denúncias de racismo.

A “Pax democrática” da institucionalidade foi pro saco porque a política se tornou capilarizada em todos os setores sociais, em todos os bairros da cidade, em todas as cores de pele e condições sociais.

Por isso vemos anarquistas, comunistas e autonomistas confrontarem conservadores no Morro do Alemão ou entre adeptos do Black Bloc termos do playboy de Ipanema ao fudido morador de Santa Cruz e entre quem defende que Black Bloc morra desde o branquelo de Três figueiras ao pretinho de Vila Cruzeiro em Porto Alegre.

E é neste momento que o PMDB deixa de ser o endosso ao sisterma e se torna parte do sistema, adepto de um lado. E também é neste momento que o PT entra em crise e pode se desmanchar entre quem ainda dentro dele é esquerda e quem ainda dentro dele acha que pode recuperar a “paz social” do lulismo.

Por isso o PSDB mata quem dentro dele ainda sonha com o liberalismo clássico, e a política pós-rancor de Marina vira piada com seu programa liberal envergonhado e seu discurso que beira a omissão.

E Temer ao dizer que busca a pacificação pode até achar que cola, mas ninguém quer paz em lado nenhum. Um discurso fraco de um presidente fraco.

Nesse quadro onde a reação aos movimentos da sociedade de conquista ampla de direitos deixa de intermediar a “paz social” com discursos brandos e tentativas de acordo, qualquer espaço que a esquerda garanta de avanço é latifúndio.

E esses espaços não estão parcos ou poucos, nem a direita avançou sobre eles, ela tão preocupada em atacar e menos em ocupar,resistir e produzir.

Os espaços permanecem amplos e permanecem sendo ocupados nas universidades, escolas, associações de moradores,etc e devem permanecer sendo ocupados, com enfrentamento rua a rua, sala a sala de qualquer coisa que simbolize recuos.

Seja em comitês contra a PEC 241, seja em conselhos municipais, cada espaço é fundamental.

Também é fundamental que a esquerda que se organiza institucionalmente politize seus discursos. Porque é fundamental que a esquerda institucional vença as eleições.

E achar que a vitória de quem se identifica como esquerda nas eleições é conjunturalmente boa não me faz nem endossar o sistema, nem fazer campanha pra eles ou me identificar com a narrativa de menos pior.

A vitória eleitoral das esquerdas não só é boa como símbolo, porque interfere pouco nas lutas cotidianas e em vários sentidos até atrapalha,mas também em reduzir o avanço da direita sobre o Estado.

Além disso, a vitória eleitoral das esquerda traz um sinal pra direita, a questão é que a direita sempre reage ao sinal e a esquerda tende a confortar-se com a vitória eleitoral como se vitória fosse em todos os sentidos.

Uma vitória eleitoral das esquerdas deve ser tratada como oportunidade de luta contra hegemônica em possível expansão, e como meios de ampliar a audição de pressões da base pra cima, jamais como ponto final da luta.

Pra isso a esquerda deve prender-se menos no aspecto imediato dessas vitórias, e na leitura da política enquanto ocupação de espaço, e mais na organização da ocupação de espaços como meios de construir uma sociedade mais libertária.

O quadro conjuntural aponta para uma sociedade mais politizada, mesmo que sem a etiqueta de aprovação do marxismo elitista de galinheiro, e politizada à esquerda e à direita. Essa sociedade exige que a esquerda tenha ação e projeto, se organize enquanto ator que constrói uma percepção de sociedade e estado.

É hora de parar de calar quem discute gênero, transgênero, LGBT, ecologia, questão racial, questão indígena e horizontalização dos processos decisivos e atuar como ampliação da polifonia de questões a serem resolvidas nas sociedades e no estado.

É hora da esquerda aproveitar o ataque vindo do Escola sem Partido para discutir educação libertária em cada espaço e o quanto isso depende de mudanças drásticas na educação, que mande a “accountability” pra vala e organize-se enquanto elemento de construção de espaços cidadãos.m é preciso discutir educação integral, artes, esportes, ensino de História voltado pra pesquisa e formação intelectual e não pra memorização de datas e por ai vai.

É preciso hoje que a esquerda amplie seus espaços, e impeça o avanço da direita sobre os seus espaços nessa sua reação desesperada. Para além disso, é preciso que o debate saia do parco, deixe de ser em torno apenas da institucionalidade e se torna um debate em torno da própria concepção de mundo.

A sociedade está politizada o suficiente para que o debate ocorra,mesmo que parte dela queira matar a esquerda.

A ideia da unidade da Esquerda é uniformização e está mofada

unidade

O estabelecimento da ideia de unidade como valor fundamental pro anedotário da esquerda é algo bastante interessante e criativo.

Especialmente se a gente entender que o mito fundador da ideia de unidade perpassa a frase “A esquerda nunca se une, por isso que o capitalismo vence!” ou variáveis dela.

Bem, essa ideia é equivocada, pra ser muito gentil, porque se sustenta na ideia de unidade não contra o capitalismo,mas na ocultação das diferenças, todas transformadas em futilidade, e em torno de uma ideia que se abre como hegemônica (Muitas vezes com base na amplitude numérica os que a defendem) ou de um partido que se impõe como hegemônico (E do ethos que coloca as eleições como ferramenta de transformação).

Além disso, essa ideia oblitera as diferenças ignorando que independente de como estas diferenças se estabelecem todas combatem o mesmo inimigo: O capitalismo.

Dos sociais democratas com sua ideia de capitalismo humanizado aos anarquistas com a luta anticapitalista abraçada à luta anti-estado (E até anti-civilização) todos de alguma maneira combatem o capitalismo.

E é irrelevante se combatem o capitalismo bem, mal, se combatem o capitalismo e entre si tentando colocar quem mais tem razão,etc, no ato coletivo todos de alguma forma atingem o capitalismo com suas lutas.

Seja com ocupações ou com eleições de deputados, todos atrapalham o capitalismo de alguma forma.

Então por que a ideia de unidade se transforma na ideia de uniformidade na retórica da esquerda partidária?

Porque esta parte de pressupostos unitaristas e uniformizantes construídos a partir da ideia de centralismo, depois centralismo democrático, que já nasce em Marx no embate contra Bakunin na AIT e vira norma e esqueleto das organizações partidárias com origem na Social Democracia europeia do fim do século XIX até a fundação do Partido Comunista Soviético pós-1917.

Todos os partidos pós-Lênin abraçam a ideia de centralismo democrático de alguma forma, mesmo que não enquanto partido, mas enquanto valor presente nas tendências que os formam (No caso de PT e PSOL por exemplo).

Essa ideia grosso modo presume que o debate dialético se transforme em posição comum pelo acordo coletivo, mesmo que esse acordo se dê com a vitória da maioria sobre a minoria a partir de debates amplos e munuciosos.

Em resumo: o Centralismo Democrático presume que a posição coletiva se traduza numa posição unitária a partir do esgotamento do debate em torno de um assunto feito pela totalidade de um coletivo e este se convencendo que uma ideia é a melhor para todos daquele coletivo.

Isso em tese, na prática pode ser uma imposição da maioria sobre a minoria que por “disciplina partidária” a acata.

É tão óbvio que esse processo se constrói em torno de opressões que a própria esquerda marxista-leninista o discute e cria soluções relacionadas a ele, especialmente em partidos trotkistas, e parte da esquerda partidária sequer o abraça e inventa novas formas de debate, mas todos, ou praticamente todos, acabam virando o mesmo centralismo mais ou menos radicalizado em formas mais ou menos transformadas e “novas”.

Pouca gente saca que esse tipo de metodologia “inventada por Lênin” tem um tremendo elemento da cultura hierarquizada de fábrica, ou seja, uma tradução política do fordismo por Lênin, e no germe dela, e talvez da própria dialética marxista, tem um tremendo silenciamento dos sons pouco ouvidos, ou de minorias que não conseguem, por inúmeras razões, serem ouvidas na sociedade e também nas máquinas partidárias.

E é ai que o germe do mito fundador da unidade perdida nasce.

Sim, queridos, a ideia de unidade nasce da ideia de centralismo, que é construída em torno de silenciamentos.

E não só eu quem diz e nem apenas críticos do Marxismo: Rosa Luxemburgo e Alexandra Kollontai tem textos a respeito (E é sintomático que isso tenha partido de mulheres,não?).

Emma Goldman já no início do século XX apontava pro aspecto autoritário do Leninismo (que Trotski também seguiu).

Bakhtin, marxista, apontava pra ideia de polifonia como crítica necessária à dialética, que na síntese silenciava parte da polifonia de sentidos de uma sociedade ou objeto.

Bookchin a partir do segundo quartel do século XX fazia critica direta ao fordismo leninista.

E sim, até hoje essas críticas são deixadas de lado e a mitologia da unidade perdida segue.

Em tempos de eleição toda crítica é silenciada com base nesse trambolho sub teórico que é a ideia que a esquerda algum dia se uniu em torno de algo que não fosse a luta cotidiana.

Pesquisem sobre a AIT,as greves operárias do XIX, aqui inclusive, e sobre a própria revolução russa onde ao menos anarquistas e socialistas revolucionários ladeavam com o Partido Social Democrata Russo (De Bolcheviques e Mencheviques) na luta contra o Czar.

Claro que na construção da cosmogonia da Revolução enquanto evento escatológico e teleológico tudo isso foi esquecido e Lênin e seus Red Caps viraram semideuses que conquistaram tudo sozinhos e ainda tiveram todo o resto da esquerda atrapalhando a inexorável lógica de seus cérebros geniais.

Só que a gente pode ler tudo isso de outra forma e ver já em Lênin, e em toda a metodologia e obra, o germe do que viria a ser nítido: O autoritarismo de Stálin.

E não se libera nem Trotski, basta pesquisar sobre Kronstadt e Makhnovistas, sabe?

Escrevo tudo isso porque do silenciamento de críticas ao Fora Temer ao silenciamento de críticas à própria participação da esquerda em eleições, passando pelo silenciamento de quem lembra da participação do PSOL no voto a favor da cláusula de barreira que hoje o retira dos debates, sempre aparece a ideia de que a esquerda se prejudica porque está “desunida” e que com isso “abre espaço pra Bolsonaro”.

Percebem o tamanho da tolice?

Dizem isso porque a esquerda não está na mesma chapa em vários locais, como se unidade fosse sinônimo de participar de eleições e só se combatesse a direita em espaços eleitorais.

Como se cada seminário, cada ato, cada performance, cada debate, cada comitê contra à PEC 241, cada combate ao Escola sem Partido e cada ocupação fossem ilusões coletivas e não fossem em si um enfrentamento direto a toda a direita, seus valores e também, por tabela, candidatos.

Dizem que quem combate a participação da esquerda em eleições empodera Bolsonaro, quando ignoram o quanto emponderaram Bolsonaro ao criminalizarem as ruas em 2013.

Fora que ignoram que por essa lógica quem endossa as eleições também empondera Bolsonaro.

Além disso, todas as vozes da esquerda que combatem Bolsonaro cotidianamente nas muitas marchas antifascistas, nos embates contra Bolsonaro nas escolas e universidades, nos atos públicos, nas aulas públicas, nas universidades, escolas, favelas,etc, são transformadas em “cúmplices do empoderamento de Bolsonaro” porque não participam de eleições e/ou apoiam o candidato da esquerda partidária.

Que unidade defendem?

Dane-se se há unidade no combate à direita, se não houver unidade de apoio ao candidato da esquerda partidária não há unidade? Querem unidade ou uniformidade? Querem unidade ou silenciamento da diferença?

Essa atitude de esquecimento de que não existe apenas um valor de esquerda, e uma ideia de transformação e um caminho e que apenas o caminho descrito por Lênin a partir de Marx funciona chega a ser infantil, se não fosse um valor que rima com um messianismo teórico de quinta categoria.

Detalhe, ignoram as próprias transformações do marxismo.

Não à toa o machismo dessa esquerda, o racismo, o silenciamento de minorias e pautas, a imensa ignorância da pauta ambiental (Inclusive da própria releitura da ecologia em Marx ou a partir de Marx) campeia dentro da esquerda partidária brasileira atual.

Indígenas, Qulombolas, Transgêneros, tudo isso ou é ignorado ou instrumentalizado com a adaptação grosseira de pautas liberais em torno desses grupos sem nenhuma reflexão coletiva ampla.

Favelas, negros, genocídio, feminismo popular? Ou é instrumentalizado ou tratado com tutela.

Por isso o choque com o descrédito que parte da juventude favelada tem com partidos e o subsequente tratamento autoritário desses como lúmpem, pior ainda se se organizam junto a autonomistas e anarquistas.

Enquanto isso Fora Temer de Starbucks é louvado, e é sintomático.

PS: Pesquisem unidade no Google em busca por imagens e vejam a coincidência entre “Unidade” pra esquerda e pra grupos religiosos cristãos.

Política, performance, Temer e eleições 2018

Laerte

 

Alexandre de Moraes e Serra serão responsáveis pela inviabilização de Temer. Serra pra fora, Moraes pra dentro.

A tática de Moraes de meter mais armas e menos inteligência não funciona, o país não é SP.

Serra é um incidente diplomático atrás do outro e Macri não tem interesse nenhum em ser parceiro de Temer se pode ser concorrente em acordos com Uruguai e até com a Venezuela.

Lembrem-se, Macri tem um país pra tocar e essa agenda é mais importante pra ele que manter Temer, que nem o próprio Brasil quer.

As chances de Bolzonaro são mínimas, e caem a cada dia.

As chances do PSDB idem, podem tentar inflar à vontade, ainda mais depois do apoio direto a Temer e vinculação por Anastasia do sucesso tucano ao sucesso de Temer.

Que alternativas da direita existem? Ciro Gomes e Marina Silva, isso mesmo.

Ciro Gomes virou o queridinho de parte da esquerda porque fez o óbvio, se colocou tanto contra o PT e sua corrupção (Foi além, fez o discurso que o PT “aparelhava o estado”) quanto denunciou o golpe parlamentar que removeu Dilma e de lambuja ainda atacou o PMDB como antro de ladrões.

Ciro ainda caminha no tênue fato que foi ministro de Lula e de FHC, paga de terceira via.

Marina já defendia o programa neoliberal em 2014, deve manter a defesa com críticas ao tamanho da austeridade de Temer.

Além disso, tem pautas liberais e ecocapitalistas apetecíveis pras classes médias urbanas abraço na Lagoa e política enquanto performance pra exibição de consciência política amestrada.

Marina é favorita,mas Ciro pode vir a crescer, ainda mais com as prováveis quedas de Aécio ou Alckmin e com Bolzonaro mantendo-se no teto clássico da extrema-direita brasileira (algo entre 4% e 10%).

O PT pode ter em Lula uma alternativa, tem enorme popularidade, que se mantém mesmo com todos os incidentes e o impeachment, e mesmo enfrentando uma enorme resistência de parte da população deve se beneficiar por mudanças de ideia de parte desta mesma população com o provável aumento do desgaste de Temer e seu pacote de destruição da CLT, SUS e uber austeridade pros pobres e aumento de benefícios aos ricos.

A política externa fanfarrona de Temer deve cobrar seus preços no comércio exterior, e a política de tiro, porrada de bomba de Moraes deve ampliar o já altíssimo grau de violência nas grandes cidades, onde as vítimas são em sua maioria pobre e preta.

Nesse cenário o PT deve retomar parte do apoio popular que perdeu, até porque todos os movimentos feitos pelo PT receberam apoio de boa parte da esquerda partidária e da esquerda ex-partidária independente que foi muito competente em brandir as bandeiras de golpe e “fora Temer” de forma acrítica e performática, ampliando a propaganda eleitoral antecipada pra o PT 2018.

Acrescente a esta receita a divisão entre a própria direita entre Bolsonaro, Aécio e até Temer, a atração de Marina, que deve atrair os liberais e sociais liberais com seu programa (Pode atrair até parte do petismo mais favorável ao neoliberalismo com tintas sociais) e temos um bom caldeirão pro PT ir bem nas eleições e disputá-las com Marina.

Neste quadro até sem Lula o PT tende a ir bem, inclusive porque perde a rejeição enorme que Lula tem por parte da população.

O PSOL depende demais do resultado das eleições municipais, sem um a dois prefeitos a tendência é ficar nos mesmos 2% de sempre.

Com a eleição de Freixo e/ou Luciana Genro ambos podem vir a ser candidatos, com Freixo sendo o mais popular e qualificado e podendo crescer nos flancos do PT e da REDE.

Erundina também é uma alternativa, se a filiação democrática do RAIZ permanecer.

Freixo pode ir além dos 2%,mas é uma incógnita que aceite, mesmo se for prefeito do Rio, porque depende demais de seus interesses imediatos mais que dos interesses do partido.

Luciana é mais partidária, digamos assim, que Freixo, mas tem menos punch e já foi candidata, e não tem exatamente enorme simpatia interna.

Erundina tem tudo pra ser uma candidata de fôlego e juntar o melhor de dois mundos, fazendo ainda ponte com o movimento raiz que pode ser uma alternativa de esquerda mais orgância que o PSOL e com ideias mais ou menos novas.

O problema é que até lá Temer, com Moraes e Serra, devem ter destruido CLT e SUS.

Apenas se a crise conseguir piorar e Temer se tornar um empecilho, e por isso vir a ser removido via TSE, podemos ter um 2017 menos caótico, porém é um cenário bem improvável.

Sem CLT e SUS, e todo o debate em torno de candidaturas e movimentos que vem sendo feito, aqui e na política cotidiana, com todos os atores da institucionalidade se movendo em torno das eleições pra presidente, a vida da população vai piorar muito.

Em um ano Temer pode ter o efeito de uma catátrofe natural pro país.

E as ruas estão vazias.

A maior parte dos movimentos de resistência que vem sendo feitos não são de membros de partidos e da maior parte da esquerda, empenhada em eleger vereadores e ampliar suas chances pra eleição pra presidente.

Só que o cerol não para, a câmara não para, as leis são votadas, os projetos encaminhados, as universidades públicas vão sendo inviabilizadas e a treva se aproxima.

O que vamos fazer até lá?

A direita e a esquerda desenham esse quadro que desenhei todo dia, várias vezes.

Analisa-se com detalhes as chances eleitorais de cada um, mas enquanto isso as pessoas morrem, ficam desempregadas, direitos caem e o que faz-se? Performance.

Direita e esquerda ignoram o real a seu redor e a construção de ferramental de leitura do real para transformá-lo, ou aprimorá-lo no caso dos defensores do status quo, mas focam todos os seus esforços na performance.

Não interessa debater a sério entre esquerda e direita a questão da exploração do trabalho.

Dane-se se a esquerda tem claro que o trabalho é explorado com apropriação de mais valia pelo patrão e a direita liberal tanto sabe que o trabalho é explorado que toda empresa e faculdade de administração tem o departamento e a discussão de Recursos Humanos.

Porque trabalho, gente, são recursos a serem explorados, mesmo pra direita liberal.

Claro que recursos humanos é um enfoque diferente do trabalho sendo explorado enquanto apropriação de mais valia, só que ambos os casos são enfoques diferentes a partir de suas matrizes ideológicas.

E o que direita e esquerda fazem com isso? Banalizam o debate, não se busca mais investigar as concepções de cada um para aprimorar percepções,mas vencer o debate, e ai morre o diálogo e nasce a performance retórica.

Construir o argumento de forma sofismática e espetacular é mais importante que construir um argumento com o estabelecimento de fundamentos firmes e fortes, letra a letra, frase a frase, percebendo uma centelha de realidade, revelando-a.

Vencer é mais importante que entender.

Claro que o diálogo colocado aqui não é o da mediação e do acordo, mas o do embate onde as teorias fluem e se tornam transformadoras.

Por essas e outras que direita e esquerda perderam o humanismo, abrem espaço pra novos fascismos e stalinismos e tornam-se cada vez mais hordas de imbecis performáticos incapazes de uma leitura mais complexa da realidade.

Quantos liberais se sentem representados por quaisquer candidatos da dita direita e quantos socialistas se percebem representados pela esquerda?

Qualquer ambientalista sério se esforça demais na construção de ilusões para ver-se em alguma candidatura, seja o ambientalista de direita ou esquerda, se for honesto consigo mesmo e analisar a agenda ecológica de cada um.

Porque a performance é substituta direta da política, e é prima-irmã da ascensão dos novos fascismos.

As fotos de Moro, o “Fora Temer”, o “Tchau Querida!”, a “Nova Política” a “Primavera Carioca!” são todos elementos de performance enquanto política, com mais imagens e sons que argumento.

Tudo é produto, tudo é marketing, tudo é a captação do espectro anímico da população e nenhuma ação de debate a sério sobre a sociedade e o que fazer com sua relação com o estado.

Os ministros agem, e agiam, como pantomimeiros. Cada declaração é uma frase feita, dane-se ao que e a quem atingem.

É Moraes e “Pesquisa-se demais, precisamos de mais armas!” e Serra chamando o embaixador do Uruguai às falas por uma acusação de corrupção feita contra ele mesmo (Big Stick versão SBT) de um lado e Dilma “Não fazemos propaganda de opção sexual!” de outro.

E são tantas emoções e outros exemplos que nem vos conto.

E as propostas para as cidades?

Zero de Tarifa Zero, nada de programa de erradicação dos combustíveis fósseis, nada sobre VLTs ou transportes limpos.

Nada de rever a produção de alimento a nível local reduzindo preços e pegadas de carbono.

Nada, nadinha de debate sobre conselhos municipais de governo, de orçamento participativo, nada.

O que há é uma cacetada de proposta vazia, mas boas de performance.

Uma delas é a de “maior participação popular” que gira em torno de plebiscito e formulação de leis, nenhuma proposta séria de construção de governo democrático via conselhos, ampliados e deliberativos.

Mas tá tudo bem, esquerda e direita estão nas performances, tá tudo teatralizado e programado pra emocionar.

Anarquistas e autonomistas nas ruas e nos debates chamam pras ações,mas provavelmente não são bem vindos nas casas legalistas do partidarismo equestre.

E CLT e SUS morrendo junto com as públicas.

Mas não desliguem, hoje tem espetáculo!

Eu eurocêntrico: Ou da crítica como álibi pro analfabetismo funcional

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A galera perde a mão na crítica por vezes por absoluto analfabetismo funcional.
 
Me chamaram de eurocêntrico porque cito num texto uma porrada de autores, entre eles Frantz Fanom e Ashata shakur (Martinicano e estadunidense, respectivamente), e colocava que era fundamental dialogar teoria com MCs,funk,etc, com a comunidade, porque é fundamental mesmo.
 
Em vários momentos, até nesse texto, coloco que a teoria e a ação ou são da periferia pro centro ou dançam.
 
Sim, as pessoas leram (Leram?) a citação aos autores e ignoraram o texto, e desconhecem parte deles.
 
Também citaria João José Reis e Eduardo Silva, como já citei várias vezes, ou Chalhoub,mas eles são historiadores que tem uma contribuição teórica menos simples de ser transferida pro debate político em si (Vá lá dá pra fazer isso com Negociação e Conflio,mas Thompsom já aborda a mesma coisa),mas preferi citar as fontes teóricas mais amplas e mais facilmente transferíveis pro debates (E fontes dos debates propostos pelos eutores citados ai).
 
E também ignoraram o alvo do texto pra dizer que “Não cito todas as variantes da esquerda”, óbvio, eu me dirigia a uma variante, o que eu chamo de Esquerda de Apartamento©, seria no mínimo anti-didático citar todas as variantes de esquerda NESTE texto.
 
As pessoas não me lêem, não me conhecem, não procuram saber, não interpretam nem um textão “lacrador” (como se referiram a meu texto), mas são ágeis no julgamento (agilidade nem sempre é qualidade).
 
Isso não é problema, seria se não incluissem uma acusação de racismo porque uso o termo “nego” uma vez no texto, termo esse que cresci usando e ouvindo no subúrbio do Rio sendo emitido por todas as cores.
“Nego”, “negozinho”, é uma terminologia comum do Méier em diante. É negativo? Nunca percebi desta forma ou fui alertado a respeito.
 
Se for eu não tenho problema nenhum em parar de usar, basta me informarem a respeito, a questão é julgar tudo pelo uso de um termo ou porque sequer conseguem prestar atenção no conteúdo de um texto, seu contexto (todo texto tem contexto perceptível nele mesmo, basta ler) ou a forma que se aborda.
 
Ter cuidado e crítica são fundamentais, especialmente pra alertar sobre racismo, misoginia e homofobia, p.ex.,mas complica se o uso da crítica vira outra coisa, algo como caça às bruxas e gincana do purismo.
 
Pra me conhecer basta clicar no nomezinho presente no perfil e procurar nas minhas postagens o racismo,a homofobia, a misoginia, procurar minhas abordagens.
 
Querer em todo texto uma citação à todas as variantes da esquerda é de foder. Ou o Facebook agora vai precisar ter nota de pé de página?
Até porque se a pessoa que leu, e tá na esquerda, não consegue entender que quando a gente aponta Esquerda Brasileira de Apartamento© (chamar de generalização algo que eu cito nome a nome seus participan tres ou referências deles é dose) aponta para uma determinada Esquerda Fora Temer©(Tá repetido isso no texto inclusive), ela tem problemas sérios.
Ou todo autor que critica a Esquerda é automaticamente posto na caixinha da direita?
 
Transformar todo um texto em racista porque se usa um termo que pode vir a ser racista, não sei se é, uma única vez dentro de um contexto específico nada racista?
 
Chamar alguém de Eurocêntrico porque não entendeu o texto (Ignorar um parágrafo inteiro e a nacionalidade de Frantz Fanom pra chamar o autor de eurocêntrico é de foder)?
 
Não dá.
 
E com todo respeito, quem utiliza a ferramenta da crítica pra agir dessa forma é reflexo enorme do que apontei no texto a que me refiro: Falta de formação.
 
Não porque a esquerda precise ter toda leitura do mundo, não,mas ela precisa saber ler, e saber ler não é o exercício automatista de ler um texto inteiro, mas é ler, entender, possuir ferramental pra ir além de entender, efetuar a crítica do que leu e formular dali pra frente.
 
E com todo respeito: a maior parte da esquerda não faz mais uma mísera linha de análise do real que não seja um amontoado de lugares comuns mal escritos, anarquistas inclusive.
A fundamentalidade da esquerda sim ter programa que ensine teoria grossa (Tem enorme material produzido fora da Europa, viu?) é cada dias maior.
Inclusive é óbvio que a esquerda precisa ensinar a ler, sim, a ler, a ler textos inteiros e textos complexos, atuando inclsive como reforço pra quem começa universidade.
 
E sim, isso é A Esquerda Brasileira©. Sim, é de Apartamento©.
A minoria da esquerda é popular.
A minoria da esquerda partidária e a extrema minoria da esquerda nao partidária, são populares, são feitas de gente pobre e preta das favelas e bairros pobres.
Nunca vi o PSOL em Oswaldo Cruz, nunca vi anarquista em Santa Cruz, organizado não.
Tem sim esquerda não partidária em barirros pobres, mas ela não representa a maioria destes bairro e nem aponta pra isso. E basta ler meus textos pra saber que mesmo assim louvo sempre que posso o trabalho dessa esquerda não partidária, que tenho o GEP como referência, o MOB, a FARJ, a FAG.
A minoria de anarquistas está nas organizações de luta cotidiana, a maioria tá na internet chamando o coleguinha de eurocêntrico sem entender texto.
A Esquerda Partidária tá tão Ciranda Cirandinha© que sai de Starbucks em Starbucks gritando Fora Temer, Fora Feliciano, Fora Cunha enquanto a direita cassa nossos direitos e nos caça nas ruas, especialmente mulheres,negros e lgbts.
 
As marchas antifascistas são em menor número e com menos gente dos que as confirmações nos eventos de Facebook.
 
Vão nas comunidades anarquistas, por exemplo, tem mais gente querendo determinar se tu é “anarquista evrdadeiro” do que gente querendo dialogar com teoria.
É mais fácil aparecer anarco sindicalista chamando confederalista libertário de “traidor do movimento porque Bookchin defendeu que anarquista vote” (A rapaziada não entende sequer o contexto dessa defesa dentro da realidade estadunidense) e dizer que árvore e índio que se organizem como os trabalhadores se organizam, do que gente afim de construir alguma coisa pra além da teatralidade do “ser de esquerda”.
Nessas comunidades a rapaziada se escandaliza mais quando um companheiro diz que a luta sobre a prostituição, a favor ou contra, é uma questão que diz respeito à mulheres, cis ou trans, no máximo também a homens, cis ou trans, envolvidos com prostituição e chama de “doutrinado” porque se defende algo que é BÁSICO: Feminismo é um debate que deve ser feito entre mulheres.
 
Não muito mais longe, entre autonomistas se transformou em moda dizer que anarquistas são exemplo perfeito de quem só vê o lado bom de sua forma de luta, jamais admitem fracassos, ou seja, somos novamente um mundo onde a luta virou competição, a meritocracia invadiu o sistema da esquerda,né?
 
E a esquerda partidária com “Fora Temer”?
Outra questão é “Professores são também de direita!” ou “E tem professores que são de esquerda apenas no discurso!”, sim queridos, também tem “Esquerda” que só é “esquerda” em rede social, mas o texto era claro: A esquerda tem trocentos professores e é incapaz de organizar formação em seus vários espaços.
 
Eu centrei fogo na Esquerda Fora Temer,mas não só ela comete isso, quantos de nós estuda para além da obrigação formal?
Jura mesmo que as trezentas comunidades anarquistas nas redes sociais são compostas de quem realmente assim se pensa, mas opta comodamente pra nunca se organizar entre anarquistas fora da bolha e não tem problema nisso? Tá.
 
Quantos de nós leu minimamente? Poucos, e não me venham com papo de “Existe a sabedoria das ruas e nem todo mundo sabe ler texto pesado”, porque é bulshit.
 
Por que é bobagem? Porque a sabedoria das ruas não perde porra nenhuma em ganhar a companhia de ferramental teórico da pesada, vão por mim.
E nem o intelectual perde porra nenhuma em dar ouvidos às ruas, e ser das ruas, a não ser que o “sábio das ruas” esteja impregnado de um anti-intelectualismo estéril e tão burro quanto o nojinho elitista do intelectual de apartamento.
 
Ninguém precisa gostar de funk pra ouvir funk e funkeiros, nem amar Chartier pra aprender com Chartier, ou Fanom, ou Shakur ou Bookchin…
 
Só que sim, precisamos ler, precisamos saber Bahktin, precisamos ler Ginzburg, precisamos saber Shakur, precisamos de Samora Machel (Foda-se se ele era stalinista!), precisamos dar mais atenção às categorias nativas, de quem produz teoria com rap.
E precisamos de Marx, engels, Trotski, Nakunin, Kropotkin, Malatesta…
 
Mas precisamos antes de mais nada acordar pra vida e parar de fazer causinho babaca porque precisa “lacrar” o outro.
 
Aliás, “textinho lacrador”? Meçam vocês por suas réguas, amigos, não a todos.
Nem todo mundo usa rede social pra fazer forfait ou tentando pagar de mais brabo que o colega de escola.
O “ser de esquerda” virou valorativo moral, rótulo qualitativo das pessoas, e não identidade política que se estabelece enquanto ação.
O “ser de esquerda” virou uma versão menos ativa que o “ser vegano”, é sociedade do espetáculo, é representação, é teatralidade estéril.
Pois é, enquanto isso seguimos sem formação, com poucos de nós voltados pra entender mais e mais dor eal, dialogar amplamente com tudo e todos que permitam-se ao diálogo transformador seremos essa merdinha isolada, purista, burra, tosca e limitada.
 
Porque é sempre mais fácil atuar como grilo falante de mal humor que propor qualquer porra.
 
A crítica, arma da transformação, quando vira álibi, torna-se inerme.
 

Sobre não dar descanso a Temer, as diferenças, distinções e imobilidade eleitoreira

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Quando Dilma sofreu o impeachment na câmara parte da esquerda partidária e de movimentos sociais declarou que não daria um segundo de paz a Temer.

Pois é, mas deu.

Deu inclusive mais que um segundo em paz, deu dias, semanas, meses.

Manifestações até ocorrem, mas pingadas, poucas e pouco representativas.

Ações, como as que ocuparam o MinC, foram pouquíssimas e pararam há semanas, mesmo obtendo vitórias diante deste governo apalermado, ilegítimo e fraco.

E o governo ilegítimo prossegue com suas ameaças asneiras não só à classe trabalhadora, mas à democracia, ao bom senso, ao futuro da produção científica e à educação laica e de qualidade.

Mas a esquerda partidária prossegue sem tirar a paz de Temer, a não ser que entenda que tirar a paz seja xingar muito no Twitter.

Nesse meio tempo a esquerda partidária redescobriu o PMDB vilão de desenho animado, mesmo que o PT, que se aliou ao PMDB feliz em 2010, tivesse se construído denunciando o PMDB coo parte da direita coronelista brasileira desde seu nascimento nos anos 1980.

Todo santo dia parte dessa esquerda chora lágrimas de esguicho porque Cunha, Temer, etc são “ladrões” e “golpistas”, chega a ser meigo, doce e dramático, mas tem a função social do furúnculo na bunda como processo civilizador, com a devida vênia pela utilização terminológica.

Enquanto isso se não fosse índios, padres e bichas, negros e mulheres e adolescentes fazendo o carnaval à revelia da política institucional poderíamos dizer que a esquerda morreu enforcada nas tripas do último burocrata.

Sim, não há esquerda nas ruas, na chuva, na fazenda ou numa casinha de sapê.

Tá, vá lá. Não sejamos injustos!
Profissionais estão em greve em vários estados, especialmente professores, e especialmente no Rio e RS, mas a vida da esquerda é mais que greve, por enorme importância que elas tenham.

E a vida política das greves é mais que elas mesmas e suas categorias.

Nem às greves o apoio coletivo da esquerda, o enorme peso necessário pra disputa hegemônica e contra hegemônica das consciências, a gente vê com a ênfase necessária.

Greve Geral? Sonha!

Vemos sim a esquerda tartamudear lamentos grandiloquentes sobre a maldade do mundo contemporâneo gritando o inócuo e babaquara grito “Primeiramente Fora Temer”.

Como se essa fraseologia amestrada fosse um abracadabra da libertação dos cães capetóides da revolução pra cima da direita, que ri, de lacrimejar na gravata, dessa bobagem.

A esquerda partidária definitivamente abraçou a teleologia da revolução enquanto evento escatológico e apocalíptico.

Sua religiosidade “racional”, seus mantras, signos, sinais, santos e demônios travestido de figuras públicas e burguesia, e segue na procissão candente dos ignaros rumo ao nada.

Tem avanço fascista que mata alunos da UFRJ, amplia crimes de ódio, ameaça professores, ganha DCEs, apoia bolsonaros, etc?

Lutaremos contra isso, mas vamos tentar canonizar nosso santo da vez elegendo-o prefeito primeiro?

E às diferenças e distinções entre nós da esquerda, como são tratadas? Com a velha e boa desqualificação dos que não são convertidos à fé dos mosteiros vermelhos de São Lênin, São Marx, São Trotski e Reverendo Stálin, na borrachada.

A nova é o racha do PSTU provocando grandiloquentes debates sobre a razão ou desrazão de gente adulto optar por tomar outro caminho organizativo.
Como se isso fosse sequer da conta coletiva ou elemento fundamental de qualquer mudança dramática na conjuntura ou tivesse efeito daninho à organização política coletiva.

Sim, a esquerda partidária ainda se ressente de gente adulta definindo que não quer mais fazer parte de grupo A e se deslocando pra fazer parte de grupo B ou vender sua arte na praia.

Como se o cara ao migrar sua militância pra anarquia ou sair do partido A pra fundar outro ou ir pro B, ou mudando seu nome pra Chupeta de Baleia e fazer performances acrobáticas na praça XV mudasse um cacete de elemento prático na conjuntura e tornasse a vida coletiva mais ou menos dura no enfrentamento político contra a direita.

Mas reparem que a cada racha ou a cada crítica soltam-se as balalaicas argumentativas dos xóvens do mosteiro vermelho falando da necessidade de “um partido da classe”.

Vejam bem, não falam da necessidade da classe trabalhadora se organizar ao máximo, mas dela ter “um partido”, reparem no numeral “um”, isso mesmo, apenas um, unzinho.

E as diferenças, as dissonâncias, a diversidade, as distinções? Fodam-se elas, só pode existir um.

Tá certo que parte boa da esquerda de hoje cresceu com Highlander no imaginário, mas desde os anos 1960 ao menos temos elementos teóricos pra discutir essa obsessão pela uniformidade na esquerda que dão um novo gás à nossa própria percepção do mundo e rediscutem a obsessão marxista-leninista pelo partido único, centralizadaço, supostamente democrático, não?

A diversidade, as distinções, as diferenças produzem mais diversidade, mais distinções e mais diferenças, e isso tá longe de ser negativo diante da óbvia complexidade da composição da realidade e das classes operárias, dos mundos e fundos que são feitos de gente que luta, se organiza, sobrevive, produz suas próprias pautas e lutas.

E o que isso tem a ver com dar descanso a Temer?

Tudo.

Até porque enquanto a esquerda partidária ignora o mundo externo a ela e o aumento dos crimes de ódio, da sanha bolsonarísta de se impor na porrada sobre mulheres, negros, LGBT, a coletividade transformadora da esquerda não partidária tá por ai enfrentando essa direita sem precisar gritar “Primeiramente Fora Temer”.

E segue a esquerda ignorando essas lutas, tratando-as como “problematização que desvia o foco da luta de classes”, atacando mulheres, atacando indígenas, atacando LGBT que gritam, em grandiloquente razão, sua fome de mudanças e conseguem cercear a direita, emparedar a direita, tornar a vida da direita um inferno enquanto a esquerda partidária agenda uma nova apresentação do Papai Noel de Montevidéu numa tour inútil de louvação tosca a figuras públicas burocratizadas, mas pop.

Ou isso ou lendo um Stalinista pop como Zizek falar bobagens reaças, mas de esquerda, enquanto Temer agenda matar a CLT a pauladas.

Vão esperar perder direitos pra agir? Não é a lição que secundaristas, índios, LGBT e mulheres estão dando.

Mas uma esquerda que ainda acha que só há um caminho pra transformação, e portanto um tipo de conhecimento supostamente racional e organizado pra compreender a realidade, consegue aprender algo que fuja do adestramento?

Difícil.