O Socialismo precisa deixar de ser macho,adulto, cis,hetero e branco

Privilégio branco é uma categoria fundamental para ser discutida em partidos socialistas, inclusive a partir da métrica onde a maior parte da estrutura de pensamento que balança o berço de seus programas é resultado da escrita de homens brancos.

Além disso, a posição da identidade de gênero, orientação sexual e o peso etário é parte um debate fundamental que precisa por em xeque a hierarquia destas condições na construção de privilégios a partir do eixo do macho,adulto, branco, hétero e cis.

E por que essas questões? Porque o debate étnico-racial, de gênero e identidade de gênero são, junto com debate ambiental e questão etária, os pavimentadores de discursos belíssimos que não constroem alicerces dignos dos arabescos escritos e lidos em voz alta nas assembleias.

Em entrevista recente ao podcast Mano a Mano de Mano Brown, Lula se enrolou todo para responder sobre a posição do PT diante da ausência de um número relevante de pessoas pretas nos cargos de direção do partido. 

No PSOL, o debate sobre a negritude é tão insuficiente que só em seu sétimo congresso se chegou a uma resolução que formaliza cotas para igualdade racial e de gênero nas direções, e ainda há uma falta de representação indígena e LGBTQIA +.

Diante da paulatina conquista de peso político na marra por parte das minorias políticas, se faz mais que necessário o debate a respeito da posição no processo revolucionário de quem, como eu, faz o bingo da branquitude masculina cis heteronotmativa. 

Porque é provável que muitos de nós entendem que seu limite é o de sermos espectadores, da mesma forma que uns tão brancos quanto nos acusam de “síndrome de princesa Isabel” ou companheiros pretos e pretas, talvez com razão, de fazermos token com suas dores e trajetórias.

Só que a questão é mais objetiva e menos afeita à falta de razoabilidade de todos os ovos numa mesma cesta de ataques e confusões. Há homens brancos cis hetero na classe trabalhadora, e a não ser que se defenda uma tolice como a de seu extermínio, é preciso que estes estejam alinhados e aliados às lutas das minorias políticas.

Sim, amigos, amigas e amigues, não se fará revolução nenhuma sem gente branca, o que também não significa que essa gente branca,que é sim parte do problema, precise ser eterna protagonista da luta de classes e liderança natural dos processos decisórios,eleitorais, de formação,etc.

Há uma necessidade de abdicação coletiva de protagonismo pela branquitude masculina cis hetero normativa e construção ccncreta das alegorias e adereços do Carnaval de índios, LGBTQIA+, negros, mulheres e adolescentes.

Porque se “numa sociedade racista não basta não ser racista, é preciso ser antirracista”, como escreveu a companheira Angela Davis,  também não basta ser “tolerante” à diversidade de gênero, identidade de gênero, de orientação sexual, de cultura. 

A tarefa da branquitude começa por sair da frente e assumir esse papel necessário de fazer o que é aparente se tornar uma regra. 

Não basta comemorar paridade de gênero e raça na bancada federal se as direções não compõem essa paridade nas suas composições, se os programas não se dobram à relevância dos debates teóricos e políticos de fora do mundo europeu e se os cargos majoritários (e a maioria dos proporcionais) são disputados sempre pro homens cis brancos e heteros.

Tem que ter Marx, Lênin e Trotsky na formação política? Claro, mas porque não ter Fanon, C. L. R. James, Mariátegui, Angela Davis e outros tantos, tantas e tantes que ocupam na marra seu espaço teórico de produção, mas cuja formação tradicional dos partidos políticos e correntes fazem com que os militantes que melhor se informam e formam não conheçam?

Quantas Revoluçẽos são discutidas sem uma menção à imensa Revolução Haitiana? Quantos sabemos das rebeliẽos africanas no Brasil?

Não há caridade ou senso de auto salvamento na defesa que faço aqui, pelo contrário, é o pragmatismo da obviedade que as condições objetivas da conjuntura nos impõe, ou é falso que a branquitude é o que dá lastro ao neoliberalismo fascista de Bolsonaro, Guedes e do PSDB?

A tristeza de perder Marielle produziu o fenômeno palpável, mensurável, da multiplicação de ocupação de mulheres e trans pretas no espaço político. Erika Hilton, Érica Malunguinho, Benny Briolli, Talíria Petrone, Renata Souza, Mônica Francisco, Luana Alves, Áurea Carolina, Karen Santos, são, todas e todes, parte de um fenômeno que faz com que a realidade se imponha como fato.

Esse fato nos obriga a pensar o papel da branquitude,masculina cis heteronormativa como liderança natural dos processos políticos e eleitorais empartidos socialistas sob pena do socialismo defendido sem o elemento crítico da questão étnico-racial, de gênero e identidade de gênero ser um socialismo supremacista branco.

A pena da não observação e discussão da questão, apelando pro discurso vazio e para “inglês ver”, é a ampliação do fosso entre companheiros de diversa tez, cultura, gênero ou identidade de gênero e permissividade que acaba num sectarismo interno e externo que reproduza a secessão que o racismo, a homofobia e misoginia estrutural já produzem no dia a dia.

Se não formos o partido que queremos ser,não poderemos ser a realidade socialista que desejamos construir.

Mais que um golpe, o Brasil corre risco de colombianização

É bastante corrente em textos na imprensa, blogs e de analistas políticos o risco de golpe pró Bolsonaro em 2022.

Nas redes sociais o golpe substitui o fim do mundo na placa do velhinho americano que anda pelas ruas de Nova York anunciando “O FIM DO MUNDO ESTÁ PRÓXIMO!”, e pululam medos a partir de ameaças cada vez mais vazias de Forças Armadas e Bolsonaro.

Já escrevi algumas vezes a respeito porque meu palpite é o de que golpe se constrói, mas só se dá quando há força para isso e a força da ala das Forças Armadas mais arraigadamente pró-Bolsonaro se foi. E com os dados disponíveis nos artigos acadêmicos e na imprensa é difícil se perceber algo além de palpites que corroborem ou desmintam o meu.

Por que diferencio alas pró-Bolsonarismo das Forças Armadas? Porque entendo que esteja bastante explícito que não há essa unidade toda no interior das FA, como via de regra não há em campo social nenhum, tampouco uma unidade política global que o Bolsonarismo catalisa.

Como eu entendo isso? A partir de percepções que a gente vê da enorme diferença entre blocos do próprio Exército e entre as Forças Armadas pela História, coisas que vão desde como interferir na política até a concepção de composição étnico-racial de cada Força.

Há literatura e pesquisa de militares contra a ditadura de 1964, das divisões das FA desde 1954 a respeito da intervenção na política, sobre as distintas interpretações, pela direita, entre Jovens Turcos e Tenentes, a divisão entre militares nacionalistas e pró-EUA durante a transição pós ditadura Vargas e por aí vai.

A gente pode de saída distinguir qualquer grande campo social ou corporação a partir da ideia de que todo coletivo humano complexo contém dissidências. Mas pelas características implícitas nas Forças Armadas fica difícil mensurar o grau de diversidade e diferença de concepções em seu interior. E isso se complica mais ainda quando falamos das polícias militares, porque elas são mais diversas entre si e contemplam uma complexa rede de micropoderes que não respondem de forma orgânica a comandos centrais, além do fato de como todo organismo social de variada composição ter o germe da diferença e da divergência em seu interior.

Esse preâmbulo todo é para discutir aqui a potencialidade de um golpe em um cenário onde o governo derrete, ass Forças Armadas tem um apoio cada vez menor e tem digitais em toda a crise envolvida na pandemia e no vacinoduto.

Além disso, 51% da população brasileira declara ter medo das polícias.

Ou seja, se as Forças Armadas, mesmo gozando ainda de prestígio, vêem  este apoio popular derreter pela adesão ao bolsonarismo, as polícias mais ainda, como grandes forças de opressão à maior parte da população, recebem apoio da cada vez menor classe média de de uma classe alta que sempre adorou apoiar as forças de repressão a pretos e pobres que protegem seu patrimônio contra as hordas bárbaras que produzem sua riqueza.

Mas além da perda de apoio, para cada militar que arrota golpe, outros tantos sinalizam que preferem desembarcar do golpismo para tentar a sorte em outra canoa. Por amor ao país? Não, por medo da lama na cueca.

A fala de militares ameaçando as instituições são para atiçar o cagaço monumental que especialmente a esquerda tem das Forças Armadas, mas inspiram pouca confiança na própria força e alertam mais para sua fragilidade.

A ocupação em massa de militares do Exército em cargos de confiança no governo exṕlica a desenvolvura golpista de parte das Forças Armadas, mas as dissensões públicas dos comandos em episódio recente, a visita do comandante do Exército ao Piratini e até o corajoso discurso do general sem tropa presidente do STM ameaçando golpe se Lula for eleito explicam mais o mato sem cachorro que as FA vivem do que o contrário.

Pujol e cia lá atrás saíram para tirar o próprio da reta, mas significaram que vários tiraram o seu da reta com eles, o foco do golpismo e do bolsonarismo ficou com os militares da reserva e da ativa que bancaram Pazuello e escreveram uma notinha contra o Senador Aziz ontem.

Mas o mais importante é que golpe não só se constrói, mas se dá. quem pode dar golpe dá o golpe, quem ameaça quer ganhar tempo, e tudo o que o Bolsonarismo e as Forças Armadas pró-Bolsonaro não têm é tempo.

Para começar a elite empresarial e a imprensa já escolheram seu campeão: Eduardo Leite.

E com um campeão, com mais de um ano para construí-lo, o que se busca é primeiro ocupar o espaço que Bolsonaro deixará e em segundo lugar é ameaçar Lula à vera com a ampliação das dificuldades de acordo deste com a elite econômica.

E haverá espaço para ocupar o lugar de Bolsonaro? Será uma imensa surpresa se Bolsonaro chegar na eleição de 2022 capitaneando o vacinoduto que tem novos capítulos todos os dias e expõe inclusive as Forças Armadas à lama de uma corrupção que eles juravam que só a esquerda tinha em seu interior.

O recibo do Ministério da Defesa com uma ameaça de golpe para se defender das denúncias de corrupção que chegam cada vez mais perto de Braga Netto só faltou ter CPF na nota.

General também lê jornal, as tropas também vêem TV e tem que ter uma suspensão da descrença enorme para acreditar que ninguém sabia que às barbas milicas  dançavam pedidos de propina, e isso em um governo cujo presidente tem um histórico de denúncias de peculato a partir da rachadinha, funcionários fantasmas,etc.

Para piorar, família de soldado também morre de COVID, com cloroquina e tudo e com mais de 500 mil mortos é cada vez menos provável que as tropas passem ao largo da mortandade que causa o governo que não compra vacina, mas quer ganhar propina em cada compra.

O resultado catastrófico na economia, que só beneficia os muito ricos e a possibilidade nada remota de derrota no primeiro turno em 2022, a ponto do campo neoliberla achar que dá para Leite entrar no jogo, fecham a tampa do processo que provavelmente chegará ao impeachment de Jair.

Isso tudo explica o derretimento de Bolsonaro, a ausência de condições objetivas para um golpe, a falsa unidade militar em torno do governo e a incapacidade de tornar os 25% que ainda apoiam Bolsonaro uma força capaz de dar um golpe de estado.

Mas existe o problema real que os 25% que apoiam Jair podem protagonizar a partir do momento em que se percebe a derrota. E não, não é uma invasão ao Congresso nos moldes trumpista,s isso ai seria a burrice mor que nem o mais estúpido Heleno é capaz de cometer, mas a colombianizaão do Brasil, com acirramento dos ataque à esquerda, a lutadores e avitistas do meio ambiente, direitos humanos e liderançãs populares, inclusive as da direita.

Porque o processo de aumento da violência política não existe nem a unidade das Forças Armada,s menos ainda as das política,s não faltam soldados das cada vezs mais espalhadas nacionalmente e presentes milícias para agir em nome de um projeto de poder que sempre parte da ausência de ordem e é sócio atleta da desestabilização.

É no domínio da arte da desestabilização, da violência política e da construção do caos que Bolsonaro e o Bolsonarismo prosperam.

Não reconhecer a derrota em 2022 é um problema cada vez menor, sendo que a possibilidade de Jair não ser candidato é cada vez maior. Da mesma forma o potencial de derretimento de uma candidatura Bolsonarista torna a derrota no primeiro turno menos dependente dele e mais do desempenho de Eduardo Leite, cuja candidatura tem o mesmo programa econômico bolsonarista, mas ataca na prática os pontos frágeis do programa lulista: a questão LGBT, por exemplo.

Diante disso as forças Bolsonaristas podem optar por agir dentro de um projeto que tem menos preocupação com a eleição em sie mais na construção de um golpe real e concreto que independe de eleições e de seus resultados. Nesse sentido é menor a capacidade de organização de um golpe nos moldes bolivianos e maior a capacidade e potencialidade de desestabilização do fazer política em si, tornando o atuar no mundo democrático um risco de vida.

As ameaças cotidianas de morte a parlamentares da esquerda, em especial os do PSOL, o próprio feminicídio político de Marielle Franco, tudo isso aponta para uma rede de desestabilização que pode nos colocar em um cenário de violência política nos moldes colombianos e mexicanos para as próximas décadas.

As redes de ataque não precisam ser financiadas às claras ou correndo riscos de investigação direta e podem inclusive usar o know how da ditadura que usava financiamento empresarial para clusters clandestinos de tortura, e que espalhou pros esquadrões da morte, e hoje milícias, a forma política das máfias com um projeot político anticomunista, racista, machista e LGBTFóbico histórico.

Golpes nos moldes clássicos já foram abandonados pelas próprias elites e forças Armadas para derrubar Dilma e isso não foi à toa.

 Sem apoio externo, com cláusulas democráticas nos principais acordos comerciais, qualquer movimento golpista com tanques na rua põe em risco modelos econômicos inteiros, em que economias complexas como a nossa não podem enveredar sob risco imenso de perda de mercados.

Em um quadro que o próprio bolsonaro desestruturou a economia com uma política ecocida, genocida, com zero investimento público e sem a menor ideia de como fazer política, mesmo indireta e liberal, de fomento, é cada vez menor a margem de manobra golpista clássica em um ambiente onde o mercado já sofre sançẽos públicas, diretas ou indiretas, com perda substancial de espaço internacional.

Para piorar o cenário pro campo bolsonarista golpista, a conjuntura exige um modelo econômico de fomento ao consumo interno equilibrado com uma diplomacia presidencial , para que a economia devolva à própria elite uma manutenção da taxa de lucros que caiu com a aposta insensata no golpismo necroliberal que nos deu Bolsonaro.

Então até a aposta em Leite tem um significado de construção de uma força para além de 2022, capaz de pelo menos rivalizar economicamente com Lula e o PT. Ou seja, qualquer manobra precisa contemplar a desestabilização do cenário sem a explícita face das instituiçẽos armadas, porque a economia exige que os caminhos pro desenvolvimento dos negócios predatórios não seja mais feitos à luz do dia.

Neste cenário, o que frutifica é a lógica subterrânea da violência política com tintas milicianas e não um golpe nos moldes clássicos com tanque na rua. Esse modelo inclusive sequer precisa ter peso estratégico, ou seja, pode ser o de fundamentar mandatos parlamentares capazes de obter nichos de mercado e de domínio político que atrapalhem a democracia sme a necessidade de um golpe com um ditador lhe liderando.

É preciso atenção sim pras movimentações, mas pensando também nos modelos amplos que nos podem desestabilizar com maior potencial destrutivo que um golpe militar clássico.

A Classe Operária vai na padaria

O título faz uma gracinha com o filme “A Classe operária vai para o Paraíso” de Elio Petri, filme político italiano de 1971, mas o tema não é exatamente uma piada.

A questão é que após eleição pululam análises sobre o quadro geral e que invariavelmente são rasas, porque consideram apenas os vencedores das eleições e não analisam o quadro geral; dramáticas, porque fatalmente se prendem na dor da derrota em vez do sabor dos processos e avanços; e conservadoras, porque tratam política como corrida de cavalo.

O eleitor em geral é tratado como o grande culpado, o grande vilão, o cão, o danado, o sete pele, aquele que trai nosso desejo espantado pela vitória a partir do sonho, aquele que não faz jus ao dom da consciência política.

E os partidos, especialmente da e pela esquerda, são também vilões porque falam pras paredes, dizem idiomas inteligíveis, remetem a sábios vetustos de contos de horror, pútridos em seu isolamento e incapazes de liderar a inerme classe operária rumo ao caminho pavimentado e uma Revolução escolástica, positivista e meio bocó.

Como este que vos escreve acha uma bobagem, sem tamanho a ideia de que quando a gente acerta o mérito é nosso e quando não dá a culpa é do povo e acha que marxismo é positivismo, coisa que é que nem Cachaça com Strogonoff, no mesmo copo, eu passo dessa.

Primeiro que o povo é gente para danar.

Muita mesmo, juro. muita gente para atingir, muita informação para passar, muito programa para discutir, muitos corações e mentes para lidar em cenários imprevisíveis na prática. 

Povo é tanta gente que precisa de muita coisa para mudar marés, precisa de imprensa, texto, subtexto, rádio, tv, dinheiro e perna para transformar conquistas históricas, como o SUS, em vilãs e ter gente que defenda sua destruição.

Até onde eu sei o alcance das mídias da esquerda é muito menor que o das mídias todas da direita.

E também acredito firmemente que o contrafluxo das mensagens seja uma mão de obra danada para reverter década e meia ou mais de sabotagem. Mas  a digressão não ajuda o texto.

A esquerda, que não é una e nem será, porque somos muitos e muitos tem em si divergẽncias de fundo , também não tem o dom mágico da condução porque a população não é estúpida.

Tampouco uma união idolatrada e idílica, meio dodói da cuca, sem olhar as diferenças normais, naturais e saudáveis no interior da esquerda, salva essa lógica de condução.

A esquerda precisa de um monte de coisa para resolver uma pancada de problemas e também vencer eleições, até porque precisa construir a sustentação de vitórias eleitorais para além de uma primavera solta na mão de um bêbado.

O que a esquerda não precisa é um retorno à lógica de que ela é a condutora do processo de revoluções e transformações e não parte deles, de dentro, vivendo o dia a dia e sendo referência e não condutora, de povos que entram em ebulição por chegarem numa consciência política e de classe advinda da experiência e da compreensão do real à sua volta.

E uma esquerda atada em uma unidade sem união é uma esquerda incapaz de se mover em um cenário onde ser diversa a faz melhor e maior.

A Revolução Russa foi feita por Bolcheviques, Mencheviques, Socialistas Revolucionários, Anarquistas, Soldados, Camponeses e Huskies Siberianos e não por um corpo unitário e ciente de um programa único. Quem vende essa ideia tá mentindo ou é tosco.

E as demais Revoluções não foram diferentes, porque as Revoluções não são chá das cinco, brother!

Revoluções não tem um plano, não são um caminho lindinho com flores de fogo, projetado pelo Niemeyer.

Lênin liderou uma revolução com Trotski e outros tantos porque foi sagaz nas costuras, pulou nas tábuas certas, soube ir, vir, rever pontos, insistir em outros e foi visto como referência.

E a gente só sabe disso depois, na hora ninguém sabia de sua liderança mais a fundo do que o impressionismo, e a aposta, permitia.

A quente, geral sabia no íntimo que ir por aquele caminho era uma aposta, por mais racional que ela fosse.

E aqui é que entra nossa necessidade de propor uma reflexão sobre nossa relação com a classe, com as eleições, com o trabalho diário. 

A gente precisa sair do marxismo hegeliano que chuta o real como o Vitinho batendo pênalti em vez de ir pro básico do marxismo: catar dados, olhar para eles, pensar sobre eles e ir pro pau.

Era tão óbvio que a Paula venceria no segundo turno em Pelotas como era muito difícil a virada do Boulos em São Paulo. A gente só conta depois para não reduzir o entusiasmo da rapaziada.

Mas também é imensamente óbvio que a gente tem um caminho menos duro pela frente, há pistas sobre como ir e vir nessa lama diária da luta e porque é importante o que vivemos nos últimos meses.

Porque o saldo organizativo, o crescimento eleitoral, a ampliação da participação de negros e negras, de LGBTQ+, de transgênero, de indígenas, de mulheres, não foi pouca coisa, como não foi pouca coisa o tamanho da virada em Sâo Paulo.

A Classe Operária não tá perdida no tempo, nem vestida para matar ou em um casamento grego sonolento em plena tarde de segunda-feira.

A Classe operária não vai para Paris. 

A Classe Operária vai na padaria, corta o cabelo, pede comida, pede ajuda, faz seus corre, sente o drama, corta a marcação e marca um gol de mão com a mão de Deus.

E para falar com essa Classe Operária a gente precisa ir na padaria e conversar com ela, brigar com ela, trocar com ela, passar  recibo, lidar com o dia a dia. 

A Classe Operária não quer uma fórmula de como lidar com ela, porque ela não é uma entidade esfuziante do marxismo idealizado, ela é aquela gente que toma cerveja com a gente, que faz o pão da gente, que atende a gente no caixa do banco ou do supermercado e que é nosso colega de escola, como aluno ou professor, e de universidade.

A gente não vai liderar essa Classe Operária se a gente tiver com ela uma relação colonizadora e achar que campeonatos se ganham sem ganhar jogo a jogo, metro a metro, casa a casa.

E para ganhar esse jogo precisamos ir além dos méritos nas eleições de gente preta, trans, lgbt, mulheres e indígenas, precisamos ter um partido que concretamente seja um projeto de socialismo antirracista, antiLGBTQfobia e anti misoginia.

Para isso precisamos começar já um planejamento de futuro que mostre um partido mais colorido do que nossas representações, e as da esquerda em geral, são craques em mostrar.

Precisamos fazer do antirracismo um projeto concreto  e para isso precisamos avançar sempre, respeitando o que já construímos, mas olhando para as falhas que sempre tivemos a cada eleição e avançar para um planejamento que seja mais construtor e que revele um partido melhor.

Não é pouco o que o PSOL faz pelas lutas das minorias políticas, mesmo assim não é ideal a forma como ele lida cotidianamente com as demandas necessárias para a superação das opressões.

Isso significa que o partido muda e melhora a cada período, mas que também não se faz absolutamente nada em um passe de mágica.

Acertamos muito nos últimos períodos, mas isso revela também que as tarefas urgentes de ampliação da qualidade de nossos acertos só aumentam de complexidade e de urgência.

Precisamos avançar e para isso precisamos amar, curtir, dançar, discursar, produzir, ocupar como faz um Black, brother!

A gestação da extrema direita e do negacionismo no poder começou na imprensa

Quando você puder assista a minissérie The Loudest Voice que conta a história da fox News e do principal responsável pelo seu sucesso e pela construção do esqueleto de sua linha editorial: Roger Ailes.

Não se preocupe se você não reconhece o nome ou seu papel na história estadunidense ous e a história da Fox News lhe parece distante do seu dia a dia, vocẽ ao assistir o primeiro episódio já vai entender o caminho que a emissora e o personagem tiveram na construção do que vocẽ vive hoje.

Claro, é só uma minissérie, não abarca a totalidade da realidade histórica em torno da ascensão de Trump e de uma lógica de extrema-direita que se organiza na negação de todo o conhecimento estabelecido e científico em nome da tese de que a verdade está em disputa, ou seja, que cada um tem sua verdade e que ela possui assim um peso idêntico, seja você um sujeito razoável que se liga nos limites mensuráveis do real, a ciência, ou você sendo um terraplanista que diz que a Terra é plana e que termômetros roubam sua senha do cartão de crédito.

Claro também que a minissérie revela a visão de autores de um roteiro, que se baseou em um livro que por sua vez é uma percepção que vive no contexto do tempo do autor e de suas relações afetivas, políticas,etc, mas todas as obras sobre todas as coisas precisam receber essa observação.

A visão descrita na minissérie tem todo o conhecimento do hoje sobre o ontem, e esse conhecimento se reflete na leitura da história da Fox e de Roger Ailes.

Só que o retratado na minissérie revela um projeto de linguagem de violência que constrói a narrativa de uma percepção branca, ultra conservadora, de extrema-direita, racista, misógina e homofóbica que evidentemente se relaciona com a ascensão de Trump, Bannon e seus filhotes pelo mundo como Bolsonaro.

E por que evidentemente? 

Porque são documentadas nas participações dos citados, em vídeo, a construção das narrativas, a participação desequilibrada de republicanos fundamentalistas em horários específicos da emissora e até a participação de Trump no pós Obama, quando o ultra conservador Ailes abre a caixa de ferramentas para promover sua agenda de combate ao presidente com requintes de crueldade racista e xenofóbica.

A narrativa, obviamente ficcional, não é um documento cristalino de uma época, nenhum documento na verdade é, mas indica as fontes de observação de processos complexos de paulatina desconstrução da própria ideia de verdade.

Vai aparecer quem diz que a culpa da flexibilização da verdade são dos “identitários”, dos “pós-modernos”, dos Incas Venusianos e de toda a ciência humana que percebe que há recortes de classe, etnia, gênero, identidade de gênero, orientação sexual, etc, em toda a percepção do real? 

Vai, assim como aparecerão os que dirão que a culpa do crescimento do negacionismo científico e da razão é a da produção científica e seus gargalos de divulgação, mas convém ter mais percepção entendendo os processos políticos que produziram, por uma questão de embate e controle hegemônico, a reação à ciência como inimiga como parte de um processo de derrota de qualquer parco cheiro de combate às desigualdades, transformadas em socialismo e comunismo dos EUA à Pindorama.

A minissérie trata detalhadamente das opções de Roger Ailes na constituição de sua Fox News, desde a secundarização das mulheres a papéis de bibelôs de uma audiência que as vê como ajudantes dos âncoras homens até a criação do âncora antípoda aos liberais, munido do que há de pior nas ferramentas de retórica política, e empoderamento de usuários do site de extrema direita Breitbart.

Tá tudo ali. 

A partir da história da Fox News, Roger Ailes e do papel de Rupert Murdoch na constituição de uma frente de extrema-direita na imprensa e na mídia em geral, há todo o caminho para ser analisado e percebido de como esses atores e outros tantos, como os Think tanks liberais que produziram o MBL, influenciaram ondas intensas de desconstrução da democracia em nome da hegemonia branca, ultra conservadora, racista, misógina, LGBTfóbica,etc.

Bannon? Sardinha frita de um mar que começa a produzir tubarão nos anos 1960, faz dos anos 1980 até hoje um caminho de transformação definitiva da imprensa como partido da burguesia, mais ou menos nitidamente.

E é a partir deste tipo de viés e de opção e projeto político que  se fez vivente o negacionismo científico, climático, histórico (já existente na negação do holocausto, mas ampliado) e principalmente político, que trata a democracia, por permitir que opositores ao projeot de extrema-direita exista, como inimiga.

Todo o processo posterior que fez com que observadores menos atentos culpassem a esquerda, Papai Noel, a Cuca, as universidades, pela distância entre o pensamento e o povo, vão ao chão com a percepção de que o que houve e há é uma disputa desigual entre fontes de informação. 

Fontes de informação que sofrem com mecanismos de barragem do escoamento dela,desde os inícios desiguais das posições dos discursos até o grau de capacidade de comunicação a partir das posições de discursos.

As universidades e suas mídias e podcasts, a sociedade civil organizada ou não, disputam com conglomerados com enorme capacidade e equipe, estrutura de difusão da informação que tornam a ciência um pequeno guerreiro de desenho animado contra Gigantes de Marfim armados até os dentes.

Enquanto o conhecimento científico é divulgado nas revistas acadêmicas, que dialogam no interior da comunidade e são mal traduzidas quando passadas para mídia, ou por canais de divulgação científica que buscam traduzir a linguagem acadêmica pro grande público, as grandes emissoras, mesmo as em tese mais bem intencionadas, dão a mesma capacidade de divulgação de discurso pro Dráuzio Varela e pro Osmar Terra, sendo que só o primeiro zela pela honestidade intelectual para produzir conhecimento e informação.

Enquanto há inúmeras variações de debate nas diversas ciências, como a economia, você não vai ver na globonews, ou na CNN, nenhuma linha da economia que não seja a que trabalha com os paradigmas ultra liberais, tornando esse viés o único científico para uma gama enorme da população.

E há mais, há quem trate como normal discursos anticomunistas e trate , como quem mente quem aponta as ditaduras na América Latina ou Churchill como criminosos capitalistas e que promoveram genocídios, ou que apontam a escravidão como uma autoria liberal, capitalista e nao o inverso. 

O discurso anticomunista ganha palco em programas da grade que o comunismo que aponta que Stálin foi um ditador jamais teve e provavelmente terá.

Precisou Caetano Veloso provocar Bial para que algum nível de debate passasse a ocorrer e mesmo assim reduzindo toda a esquerda ao fã clube do ditador georgiano sem qualquer contraponto mais sério.

A construção do discurso que deu em Trump e Bolsonaro, gestado pela Fox News e por sua vez nascido no coração do Partido Republicano dos EUA (Ailes foi assessor do Nixon), tem uma raiz histórica que remete à própria transformação da televisão em uma disputa de nichos e porta voz de conservadorismos diferentes, formados por percepções mais ou menos radicais sobre o capitalismo no interior da lógica liberal. 

Essa raiz histórica, no entanto, não existe apenas no discurso mais negacionista, existe também na normalização do processo de igualar batata frita com Bóson de Higgs que as emissoras e jornais adotaram desde os anos 1990 para cá.

O modelo pode ser encontrado quando Kim Kataguri e Guilherme Boulos escreviam para a Folha ou Olavo de Carvalho para O Globo, Rodrigo Constantino para Veja ou hoje quando o Caio Coppola muge em diferentes níveis de tortura do bom senso contra adversários liberais moderados trocados a todo momento, sem jamais mudar o modelo de igualar os desiguais.

Qual o modelo? 

Tornar palatável dizer que um completo indigente intelectual ou um mentiroso patológico tem o mesmo grau de credibilidade que um sujeito responsável com seu discurso, os dados que emite e a forma de expô-los.

O espaço dado a Rodrigo Constantino e Olavo de Carvalho em O Globo e Veja pavimentou a naturalização de seus livros e  ataques assassinos ao bom senso e à ética pessoal porque serviram de armas contra o PT e a esquerda. 

Alinhar Kataguiri a Boulos, com só o segundo tendo a responsabilidade do espaço, ou Caio Coppola com quem quer que seja que não seja um canalha absoluto e tenha um mínimo de vergonha na cara, serve a um objetivo e este não é o de expor a diversidade de pensamentos na sociedade, até porque há conservadores com honestidade intelectual, política e moral.

E esse modelo nasceu em 1996 com a Fox News e seu projeto de conquista do coração da América em nome de um projeto de setores do Partido Republicano que conseguiram tornar Bush e o McCain figura palatáveis diante do absurdo imoral que se tornou o partido.

A ciência, as universidades, a esquerda, os movimentos, precisam sim aprimorar suas armas na desigual guerra de informação em curso, mas primeiro é preciso saber o peso dessa guerra, o tamanho dela, a desigual estruturação dos campos de batalha e das ferramentas disponíveis.

As universidades produzem conhecimento em larga escala e recebem a menor atenção possível da mesma mídia que se diz democrática e transforma mentira de discurso em defesa em suas capas.

A esquerda é tratada inteira como adversária estúpida, imoral e ilegal,o Pantanal queima e o Presidente da República acusa indígenas da autoria dos desmatamentos e queimadas que seus aliados produzem e a imprensa atua como amenizadora do impacto das vozes que destroem as bases mínimas do respeito ao outro e ao conhecimento.

Quando o Bial leva o Jean Wyllys para um programa com Olavo de Carvalho como voz do mesmo patamar e este último trata o comunismo, sob o silêncio cúmplice de Bial, como portador de discurso de ódio por si só, o mesmo Olavo que usa e abusa de racismo, misoginia, LGBTfobia,etc, o que parece democracia é um discurso e um discurso cujo viés nunca passou perto do Jean.

A imprensa é porta voz do que se tornou o establishment hoje, desde o jornalismo declaratório até o método Ailes de transformar desiguais em portadores do mesmo espaço, e não adianta vestir amarelo, fazer vídeo com dancinha e pedir “dízimo cívico” enquanto trata ataques genocidas e ecocidas como se fossem defesa.

O terraplanismo, para horror do iluminismo de salão cúmplice dele, é filho dileto de um método que todos os jornais e emissoras de Pindorama, ou não, adotaram em suas grades diárias.

A ciência que não cabe na opção ideológica das editoriais sendo tratada a pontapés ajudaria a não existir terraplanismo.

O espaço da crítica pela e para a esquerda é obviamente necessário, sem ela erraremos para sempre, mas o que se viu e vê não é crítica é ataque.

É a exposição de um lado contra outro, é atingir portadores de arco e flecha com canhões, naturalizando o que não pode ser naturalizado para fingir democracia onde há soterramento desqualificador.

Esse viés faz com que jornalistas supostamente arejados e antenados tratem um elogio a Lênin feito pela esquerda como se fosse um elogio a Stálin e sua ditadura.

Mas como explicar para quem se vê cercado de neutralizadores do discurso que comunismo é discurso de ódio que isso é uma estupidez? 

Como explicar para quem diz que a esquerda precisa apagar suas experiências e memórias porque isso, pasmem, “empodera o bolsonarismo” enquanto ignora, por tolice ou oportunismo, todo o passivo da ideologia que defende, mesmo quem finja ou ache que não, o liberalismo?

Engraçado, a esquerda tem trocentas alas que discutem entre si e fazem críticas e autocríticas públicas, tá no manual,desde pelo menos 1848. 

Provavelmente se você sabe patati patatá de todas as cagadas da URSS você viu primeiro numa publicação tão comunista quanto o alvo da crítica. 

Bakunin e Marx se xingaram de forma muito elegante, ou não, em textos maravilhosos, públicos, à disposição de qualquer leitor. 

Rosa brigou com Lênin, Lênin brigou com a Rosa, Trotski brigou com os dois e mais com Stálin e levou uma picaretada.

Ainda tinha Pannekoek brigando com todo mundo.

Todos os frágeis laços que unem a esquerda são embebidos em pancadaria institucionalizada e generalizada entre viés teóricos e organizativos, todos públicos, mas a imprensa insiste em tratar tudo isso e toda a sua complexidade como se fosse a mesma coisa.

E é tratando o diferente como se fosse a mesma coisa que chegamos até aqui.

É nesse caminho que se perdeu o bom senso e se transformou o serviço público em vagabundagem, as universidades em torre de marfim e  a democracia na latrina do negacionismo.

Das Revoluções e dos ventos de golpe

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Há algum tempo me incomodam as falas que misturam o ser revolucionário a um tipo ideal de produtor de revoluções. Da mesma forma as Cassandras do mal maior, dos ventos devastadores das tragédias golpistas, cansam o observador com suas proclamas diárias da volta do Planeta dos Macacos.

Porque via de regra o que une os grupos é a tomada da História como um terreno dado, já lido, e cuja função eterna é produzir um mito do eterno retorno, como se a humanidade fosse uma espécie de Sísifo que no terreno da História se movesse apenas para carregar a pesada pedra da conjuntura até o topo para vê-la cair.

As revoluções nunca me parecerem produzíveis ou reproduzíveis de acordo com fórmulas estritas. E aqui tem uma não sistemática junção de leituras diversas da história e da teoria política pela esquerda.

De Marx a Thompson, de Ginzburg a Bookchin, de Natalie Davis a Michael Lowy, de Giovanni Levi a Daniel Bensaid, de Lênin a Trotsky, nunca consegui ler em nenhum dos que me influenciaram alguma forma de entendimento da revolução como uma obra passível de ser produzida, mas entendi-a como uma onda na qual quem estiver mais acurado na observação tende a possuir o caminho para liderar a navegação nela até o quebra-mar.

Claro, o problema pode ser o leitor, mas é um caminho de análise que sinceramente não consegue entender o tipo de dogmatismo que cita de cabeça trechos inteiros de Lênin, Trotsky e Marx e se recusa a analisar o processo dialético que faz com que seja impossível que a História se repita.

Não adianta citar o 18 Brumário de Luiz Bonaparte de Marx e depois ignorar o sentido da afirmação dele da História se repetir como farsa, ou seja, como uma falsificação histórica de um outro fato com fins simbólicos ou teatrais.

Neste texto ele constrói o significado de bonapartismo que nos leva a Bolsonaros e que tais como elementos que surfam em uma onda de popularidade organizada com específicos trejeitos de tragicomédia ou melodrama, e que tendem a tentar uma aproximação com o aspecto mitológico das relações políticas, mas sem jamais ser exatamente alguém do tamanho do mito que tentam reproduzir.

As revoluções, assim, são uma complexa junção de processos históricos que confluem em um tipo de transformação social, do estado às práticas cotidianas, que mudam de maneira global a sociedade em que ocorrem.

Essa junção de processos, pelas diversidades conjunturais e contextuais em que ocorrem, não tem jamais a mesma face em países, cidades e contextos diferentes. Sequer tem como condição sinequanon a vitória do movimento que a liderar.

Os elementos que as tornam possíveis, e que as definem, são as tempestades perfeitas que as fazem ocorrer entre a mobilização de uma ou mais classes contra o poder estabelecido. A explosão do processo revolucionário em si, as condições históricas que fazem com que as movimentações contra o sistema ganhem as ruas e as organizações dos enfrentamentos que a fazem tomar uma face transformadora visível são os elementos que fazem com que a tempestade perfeita exista e que a definem como portadora de um legado de processos anteriores, como a tomada de consciência por uma classe a partir do compartilhamento de experiências, a paulatina chegada de experiências comuns de mobilização, as transformações de valores que fazem com que a população se entenda como partícipe de uma determinada forma de ver e sentir o mundo.

Um exemplo? As ocupações de escolas, o crescimento da auto identificação populacional como negra, a maior aceitação da população LGBT(a partir de sua luta por visibilidade e direitos), o crescimento da identidade feminista entre mulheres pobres, a consciência de uma maioria negra de mulheres liderando famílias pobres, a maior presença nas universidades de negros e pobres, quase pretos de tão pobres e a identificação do sistema como inimigo (Para o mal e para o bem) são, todos, processos que fazem com que a classe operária, ou as classes operárias (incluindo a pequena burguesia, e sim isso é uma provocação), paulatinamente tomem para si o dever de fazer um estado que as inclua.

O próprio crescimento da extrema-direita como reação aos processos que incluem uma maior identificação de negros, LGBT, mulheres, trans,etc, como atores protagonistas de uma transformação do Brasil, e não só, é um elemento que indica o tamanho da transformação em curso.

Nesse sentido se encaixam as leituras sobre a conjuntura atual onde Jair Bolsonaro se coloca como impedido de governar e onde o congresso se impõe sobre ele barrando seus avanços, ao mesmo tempo em que as ruas demonstram que os limites da reação conservadora chegaram.

Porque se há erros na leitura das manifestações como vitórias exclusivas da esquerda, não há equívocos em tê-las como uma vitória de um tipo de percepção democrática que abre caminho para, ai sim, um avanço da esquerda sobre consciências que se perceberam compartilhando um terreno comum de experiências com quem antes era visto como inimigo.

Ao mesmo tempo outros indício como a movimentação do congresso, dos tribunais, ministério público, a guerra aberta no PSL, demonstram que mesmo no campo da direita há uma percepção dos limites do bonapartismo de Bolsonaro.

Essa movimentação não é fã da esquerda, e abre caminho para outra análise sobre a conjuntura futura, mas não é, e nem pode ser, insensível às ruas.

A trajetória do texto da Revolução á conjuntura não é à toa e é intencionalmente compartilhadora de uma noção geral para elementos conjunturais.

Estou dizendo com isso que há uma contextualização histórica revolucionária? Não, mas que existem elementos que podem vir a se tornar uma revolução, inclusive com as digitais das táticas, a meu ver equivocadas, do governo em confrontar mais do que o sistema, mas as ruas, não negociando sequer com quem lhes tem simpatia e negociava participação no projeto político mais que as filigranas do erário.

Não se pode tentar um golpe organizando um confronto aberto com as forças armadas como Bolsonaro faz e dilapidando o capital eleitoral com meses de inatividade e incompetência para apenas em Maio lançar mão do chamado às ruas para a resistência.

Bolsonaro aqui comete os mesmos erros do PT na reação ao impeachment em 2016. Lançaram mão de uma tentativa de mobilização nas ruas quando era tarde demais e quando perderam até a simpatia de quem poderia estar com eles na defesa do sistema porque construíram um governo que traiu as bases que os elegeu.

Dilma ainda tinha, via PT, uma base social forte que manteve um núcleo de resistência que quase atrapalhou os planos da elite aventureira e do Bolsonarismo que surfou na onda falsificada que culminou em sua vitória. Qual a base social do Bolsonarismo que o defenderá nas ruas?

Se nem a base social do PT foi suficiente para segurar as pontas de Dilma, terá Bolsonaro uma base que nas ruas tenha tamanho para impedir sua derrubada por um congresso que desistiu do governo e negocia direto com guedes, para a sobrevivência deste?

O teste dia 26 de Maio pode ser mais um insuflar das resistências ao governo Bolsonaro na dilapidação da educação e que marcaram atos para dia 30 de Maio, além de ser uma demonstração do real tamanho do inimigo para as forças que já estão abandonando o barco (De militares ao centrão, passando por MBL, Vem pra rua, Novo,etc).

As conjunturas são diferentes, mas os caminhos comparativos entre as inabilidades de Jânio, Collor, Dilma e Bolsonaro transformam a conjuntura atual na tempestade perfeita contra o Bolsonarismo e sequer chegamos em Flávio Bolsonaro e sua organização criminosa no gabinete (O termo escolhido pelo MP-RJ não foi à toa).

E as revoluções? Na conjuntura atual o que se impõe como dado é que os quadros são de paulatino compartilhamento de experiências nas classes trabalhadoras, de identificação de elementos caros à ela (educação e saúde) com um salto organizativo e de percepção do peso destes campos na economia, na cultura, na vida cotidiana.

Isso gera uma percepção do público (roubando um dado de observação do companheiro Célio da Comuna e do PSOL de São Leopoldo) não só nova, como identificável e, mais ainda, disputável.

A culminação narrativa do uber liberalismo como hegemonia cultural a partir das lógicas do empreendedorismo e redução do estado esbarra numa resistência firme e frontal pela primeira vez em, ouso dizer, décadas.

As ruas estão dizendo: Não mexam nas estruturas do estado, elas pesam pro meu cotidiano!

Esta estrutura cultural no entorno das mobilizações e dos atos são um dos elementos fundamentais para a compreensão de qualquer revolução.

As revoluções silenciosas nos comportamentos, nas construções culturais e percepções pela experiência tendem a se tornar explosivas quando passam pro passo seguinte das mobilizações, que é a ocupação das ruas e da política.

E neste sentido o caminho escolhido por Bolsonaro expande o cenário político para a conflagração, não necessariamente violenta, de percepções políticas. Põe pra jogo, como a gíria carioca, uma disputa política outrora dada como livre da esquerda pelo falecimento desta.

A esquerda diria que as noticias sobre sua morte foram manifestamente exageradas.

Não que a esquerda seja a vitoriosa nas mobilizações, mas pelo menos é uma das vitoriosas e se posiciona como elemento disputante do compartilhamento de experiências que explodiu no 15M.

A estética do 15M foi de esquerda, os gritos idem, a defesa do público também. Mas isso não torna nada disso como um ganho definitivo se a esquerda não se reaglutinar de forma radicalmente democrática para receber os novos participantes dos atos que manifestadamente resistem a formatos avesso à oxigenação das ruas.

O mesmo pode-se dizer do conclamação às ruas por Bolsonaro. Seu governo foi flagrantemente contrário ao que defendeu em campanha.

A liberação de armas e outras promessas de campanha não foram nada diante da ausência de uma postura que pelo menos uniria a direita, que respeitaria militares, que faria uma luta para mudar o país. O que se viu, todos viram, foi um caos movido por recalque e que atingiu as chances de crescimento social de pobres, as chances de ganho da elite, a própria ideia de corpo unido dos militares.

E isso diante de uma conjuntura de crise econômica de aumento do desemprego e do desespero, do trabalhador ao pequeno comerciante, que ainda viu a faculdade do seu filho atingida no coração, e seu filho sendo chamado de idiota útil.

Seria um contrassenso entender as resistências do congresso ao governo como dadas apenas pela fome de propina, seria uma negação da própria defesa pela esquerda da política como algo que via além do ganho pequeno e menor.

A resistência veio pela desconfiança de que o governo e seus chefes não iriam compartilhar nada do poder com as demais forças da própria direita. Que inclusive não havia, e não há, plano algum de nada além de destruir tudo o que foi organizado de 1988 em diante. E essa destruição significa a destruição de elementos fundamentais também para a própria elite que os sustenta.

A irresponsabilidade das apostas em Bolsonaro, de parte da elite econômica aos militares, se baseava na possibilidade de doma dele pelos grupamentos da extrema-direita com alguma ideia na cabeça. Não deu.

Primeiro que Bolsonaro e filhos tem uma visão imperial da presidência; segundo que os planos deles nunca foram o de viver na democracia, mas destruí-la qual Orban (Isso vem dos escritos do Celso Barros na Folha com os quais concordo); terceiro que o grupo, que é tido como olavista (à revelia do próprio oportunismo de Olavo que já pulou do barco),tem uma ideia que acreditam real que são majoritários na sociedade, embora tudo, pesquisas, votos e ruas, demonstrem o contrário.

Somem a isso a incompetência geral do governo em governar, pela ausência de qualquer noção a respeito do que significa a máquina pública, e que gerou uma enorme resistência da burocracia de estado, algo que de 1988 para cá ganhou uma faceta própria que nunca se viu na República.

Bolsonaro assim chama as ruas para defendê-lo tendo como base uma minoria com um tom flagrantemente golpista, algo que ele projeta sem uma base real, e que não teria, segundo jornalistas com proximidade com o mundo militar, apoio das casernas, ressentidas pelo confronto aberto e insuflado pelo presidente contra militares da ativa e da reserva que consideram líderes e que também atingem um corporativismo forjado há pelo menos cento e cinquenta anos.

A base de Bolsonaro voltou ao normal e ele se recusa a acreditar, perdido no mundo pessoal em que é fundamental gastar mundos e fundos para receber um prêmio imaginário numa cidade do Texas que não o acolheu, apenas para responder a um prefeito democrata de Nova York e à zoeira das redes sociais que ele ainda acha que domina.

Ao chamar sua defesa no dia 26, quatro dias antes da mobilização chamada antes por uma série de organizações e pela esquerda, Bolsonaro se obriga a ter uma maioria nas ruas que tende a não ter, diante do fracasso numérico das últimas manifestações chamadas por eles e pelo flagrante racha no que o elegeu (Do MBL ao Lobão). E se obriga numa aposta em que se perder só lhe resta a renúncia, saída honrosa, ou apostar a fundo contra um congresso que não vai demorar muito tempo em aceitar pedidos de impeachment.

E as revoluções? Bem, elas se produzem em processos complexos de danças e contra danças, pesos e contrapesos.

1917 só foi possível por 1905. 2013 produziu dos ocupa escola à ascensão de uma direita das ruas. 2019 aponta para uma nova faceta de processos mais complexos e que envolvem uma dinâmica de consolidação de transformações culturais de longo prazo.

Quando índios e padres e bichas, negros e mulheres e adolescentes fazem o carnaval é preciso entender que o que se contrapõe a eles são os homens exercendo seus podres poderes.

Invariavelmente nessa dança as bases carnavalescas se impõem.

Imprensa, democracia e uma crítica ao antipetismo liberal, Tabata Amaral e Malu Gaspar.

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Na última semana vi ótimos jornalistas liberais apoiando golpe na Venezuela porque “Era contra um ditador” e destilando um ódio mal disfarçado a Lula que não destilam em metade ao Bolsonaro, que dizem combater.

Não existe apoio digno a golpe, não existe, mesmo contra ditadores.

A diferença entre golpe e revolução é farta na literatura, basta ler o dicionário de política de Bobbio e se entende a enorme diferença, e o Norberto trata Revolução como um golpe em proporções populacionais de engajamento com transformação estrutural.

Um Putsch, que foi o que tentaram fazer contra a Venezuela, é um atentado á democracia, mesmo uma democracia autoritária, como via de regra desde 2008 todas são, como a de Maduro.

Se Maduro é ditador, Alckmin, Dilma, Tarso, Cabral, e agora Witzel, Bolsonaro e Moro também são.

Perseguiram ativistas, processaram gente por portar Pinho sol, atiraram com bala de borracha e até armamento letal em ativistas, matam a população negra a rodo, em uma escala genocida, usam snipers para matar pretos pobres, estimulam a morte de indígenas e sem terra, atuam para permitir o armamento de milícias rurais para exterminar sem terra e liberar o morticínio de pretos e pobres por policiais,e por ai vai.

Então cês vão me desculpar, mas essa linha lógica de apoiar com fome um golpe de estado patrocinado pelos EUA em nome da “democracia” porque “Maduro é ditador” é um equivoco, pra ser gentil.

Eu apoio Revoluções? Apoio. Revoluções são golpes? Em muitos sentidos? Sim.
A diferença é que ou são apoiados por um levante populacional que ou o precede ou o segue ou são apenas golpes de estado.

Revoluções que o pais passou, se passou, ou foi o mais próximo disso? A Independência, talvez a Abolição ou a Revolução de 1930. que foram precedidas de longos embates, armados inclusive, e transformaram a sociedade como um todo e a própria estrutura do poder, inserindo novos elementos populacionais no cenário político e mexendo com as estruturas sócio-econômicas e culturais, mas isso é papo pra longas horas de debate teórico.

Mas apoiar golpe apenas para derrubar um ditador que se luta contra,ignorando a auto-determinação do povo Venezuelano, que esse ditador foi eleito, e que nenhum dado faz com que se veja um levante popular concreto contra ele, e isso mesmo em estados onde ele tem menos poder e cujo alinhamento não é a Maduro nem a Guaidó, mas a um chavismo anterior a Maduro?

É impressionante como alguns jornalistas trataram a entrevista do Lula com oito Vezes mais dureza do que o dia a dia de Bolsonaro. Bolsonaro é alvo de “ironias finas” e críticas até duras, mas aquém do ódio destilado contra Lula.

Lula precisa fazer penitência, autocrítica, plantar bananeiras recitando a Salve Rainha ajoelhado no milho enquanto se chicoteia, mas a mesma imprensa que faz falsa simetria com “os dois lados do radicalismo político” pra vender Tabatas Amarais se recusa a fazer uma mínima versão disso que chamam de auto-crítica.

Malu Gaspar diz que as críticas da esquerda à Tabata Amaral são porque “ela não é esquerda suficiente”, com altas doses de ironias. Que grande democrata e intelectual temos que sequer consegue conceber que existem divergências mais amplas entre o que eles, da imprensa, chamam de esquerda, não?

Aliás, essa leitura de ser “esquerda” pra parte da imprensa adaptou uma versão estadunidense da divisão política ou é impressão minha?

Sério que entender as proximidades e distâncias com a Tabata Amaral, por ela ser uma liberal e não uma socialista ou comunista ou parte do grupo ideológico tradicional da esquerda, em síntese anticapitalista, é apenas julgá-la “não sendo esquerda suficiente”? Isso é o melhor que uma jornalista especializada em política pode fazer?

Não sei em que ponto faltou leitura, pesquisa ou apenas uma clareza na percepção e exposição do próprio alinhamento ideológico. pra ser gentil.

Não é problema nenhum ser liberal, Malu e a Tabata tem muitos pontos em convergência com a esquerda tradicional (anticapitalista, socialista e comunista) e pontos de divergências centrais, reconhecê-los com respeito é um bom caminho, o desprezo ao que não entende, e nem tenta entender, é um péssimo caminho pra quem prega uma suposta unidade que não pratica.

Aliás, é fundamental que liberais dignos do nome, como a Tabata Amaral, a Malu Gaspar e outros, se assumam como tal, que assumam a defesa do liberalismo na linha Democrata moderada estadunidense no Brasil, cuja direita dificilmente é melhor que um Republicano anti aborto e que via de regra é composta de um Tea Party piorado enquanto brandem um suposto programa “liberal”. Até o conservadorismo no Brasil fede a um integralismo verde-oliva, e é francamente reacionário.

Então é sim bem vinda a Tabata e outros com seu liberalismo socialmente engajado, mas um liberalismo, pró-capitalismo e francamente pouco apegado à percepção do geral como divergência e não como “ideias que não tem mais lugar”. Agir como se a ideologia liberal pré-Marx fosse mais atualizada com seu misticismo teológico da mão invisível do mercado, mas com preocupações sociais, não fosse um socialismo utópico aplicado à contemporaneidade do que uma concepção teórica e política, com enorme base filosófica (Epicuro e Hegel pra começar), organizada por Marx e que é constantemente repensada, debatida, discutida, dentro e fora da academia, inclusive por liberais, por outros ramos da filosofia e da ciência política.

Aliás, ideias tem data de validade? Se tivessem o perfil socrático de Paulo Freire não existiria.

É fundamental que liberais exista,mas seria de bom tom que respeitassem a divergência, inclusive a crítica aos limites de sue alinhamento à esquerda, em vez de ridicularizarem o que os expõe como o que são.

E nãos e iludam, parte do PSOL, PT, PSB,etc são compostas por liberais como a Tabata, se você votou nestes partidos pode ter votado em alguém com u perfil próximo si, não precisa de certificado pra se dizer de esquerda, viu?

A REDE tem esse perfil, programático inclusive.

O que tem que ver é esse antipetismo que transforma o PT no diabo fugindo da cruz e que se torna muito mal disfarçado no discurso, no sentido da análise de discurso, de parte da imprensa, especialmente a que compõe a falsa simetria.

Esse antipetismo fez com que parte dos apoiadores de Marina em 2014, uma liberal com origem na esquerda, tenha apoiado Bolsonaro em 2018 , Abraham Weintraub entre eles.

Inclusive a mesma imprensa faz forfait pra se lembrar exatamente o que fez durante as eleições em nome de uma suposta defesa da democracia, hoje, quando ela precisa ser defendida concretamente, não mexe metade da palha que os demais membros da sociedade mexem.

A democracia quando sob ameaça recebe da imprensa o tratamento que muitos críticos de cinema dão à arte, uma odiosa observação não participante e supostamente crítica.
Precisamos de mais que intérpretes do real, viu? E sim, é um sentido marxista.

Amigos, a crítica ou é acompanhada da ação ou é apenas cagação de regra omissa.

E sigam o exemplo do Jânio de Freitas, do Gaspari, que são ácidos contra todos os governos, sem se omitirem na defesa REAL da democracia.

Não precisamos sequer concordar ideologicamente com eles para sabermos disso, como não precisamos achar Mino Carta o supra sumo da pureza da esquerda para respeitar sua luta em defesa CONCRETA da democracia, como idem o José Roberto Toledo, entre outros.

Mas é preciso sabermos com quem estamos lutando a defender a democracia.

Nós, que fizemos oposição ao PT anos a fio pela esquerda, nunca vimos muitos destes liberais nas nossas trincheiras. É sempre bom termos novidades, mas é preciso que lembremos sim quem esteve onde e quando.

Quem ocupa esta trincheira também ocupa a defesa de golpes contra o que consideram ditadores?

Quem ocupa essa fronteira também ocupa a resistência contra o que os jornais que ajudaram a eleger com falsa simetria e é mais próximo de Maduro do que eles mesmos assumem? Abro mão.

Essa defesa de golpes não é a da democracia.

O messianismo iluminista por trás de “A esquerda está perdida”.

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Se a gente for pesquisar no Google usando a frase “a esquerda está perdida” teremos doze milhões e quinhentas referências. Duvida? Testa, eu te garanto porque testei.

Há referências de 2007 usando esta frase, a mais recente é um artigo da The Intercept, escrito pela Rosana Pinheiro Machado e Tatiana Roque explicando para nós, celerados e completos estúpidos ocasionais, que as esquerdas permanecem perdidas.

O interessante disso tudo é que o argumento muda pouco, muda mais a figura em torno da qual se organizam os argumentos. Antes era Lula e o PT, depois mudou para acrescentar a estes figuras do neo-PDT, como Tabata Amaral e Ciro Gomes, sobre quem atribuem o epíteto de serem “de esquerda”.

O fim do argumento é que a crítica, o posicionamento, a postura contrária até, em vez de configurar democracia e pluralidade configura “fogo amigo”.

Não é surpresa, não só as esquerdas brasileiras, cuja base originária stalinista é difícil de se livrar, têm uma base autoritária, como via de regra a sociedade, como por ser em grande número parte da academia tem o germe da negação do contraponto e do embate como parte da democracia.

A crítica ácida é tida como ataque, a dureza idem, porque ambas, as esquerdas e a academia, tem um modelo de comportamento e convivência que confundem unidade com uniformidade e educação e fraternidade com curso na Socila (antiga escola de “etiqueta” do Rio de Janeiro).

Há um modelo de comportamento que confunde respeito ao outro com aceitação tática e acrítica de seus posicionamentos, quando via de regra é o inverso que configura respeito.

Respeitar a Tabata Amaral deveria consistir em ser duro crítico tanto ao posicionamento liberal dela na educação e na economia quanto a seu relacionamento com a fundação Lehman, ao mesmo tempo em que se valoriza seu preparo, sua inteligência e sua qualidade parlamentar na defesa do que acredita, idem no combate ao autoritarismo e neo-fascismo de Bolsonaro e dos Vélez da vida, as posições são convergentes ao invés de mutuamente excludentes.

Respeitar o outro inclui respeitar as diferenças e sim criticar o outro faz parte do respeito.

A questão é que há mais do que usar discursos como cunhas ou ter posições anti-fascistas como aliadas, há disputas que permeiam a política como um todo e que inclui disputas entre pró e anti-capitalistas.

Não dá pra esquecer que a Deputada Tabata Amaral é a favor da Reforma da Previdência, mesmo discordando da de Bolsonaro e que seu discurso contra Vélez foi tecnicista e tem o perfil de uma defesa de educação liberal, com ênfase no papel das fundações, que consiste na ampliação do papel privado na educação e menos papel do estado e isso, queridos, é algo que nosso programa enquanto PSOL, como a maioria dos programas da esquerda, tem como dever bater de frente.

Até seu elogio ao combate a Vélez tem que ser cuidadoso e parar no que consiste na defesa do estado democrático de direito, quando isso resvala na defesa de um estado tutelado pelo neoliberalismo a gente precisa apontar sim, e faz parte da democracia, pasmem, entender isso.

Mas há outros problemas, como o de parte da imprensa e da academia, e infelizmente de uma suplente de deputado federal pelo PSOL, tratar as esquerdas, que se organizam de formas diversas, como algo a ser tutelado e guiado pelo universo porque “parou no tempo” ou “está cega”, como se houvesse uma percepção extra sensorial em alguns iluminados para dizer o que organizações complexas e cujas representações tem mecanismos seus de construção de atuação como ela se deve comportar e, pior, de fora e de cima.

E vocês vão me desculpar se eu enxergo ai, mal de um historiador que pesca indícios e detalhes e lida com comunicação e discurso, um reflexo da ideia de “digital influencers” que permeou a ascensão da nova direita: não se organiza um núcleo contra nada em lugar nenhum, mas usa o blog, a coluna no site ou o vídeo no you tube para tentar na pancada enfiar uma ideia goela abaixo de organizações complexas com as quais não se dialogou ou se tentou sequer pensar.

Nem com os/as parlamentares dos partidos de esquerda que de alguma forma tentam organizar a esquerda enquanto oposição, com relativo sucesso, nem com movimentos sociais nem com núcleos, nem com militantes se pensa ou senta? É mesmo de cima pra baixo que se mete o discurso e dane-se?

E aí mora a arrogância, intelectual inclusive, de ignorar o contexto, os grupos, as pessoas, o difícil trabalho diário para taxar uma diversidade inteira de “A esquerda” e pior, se posicionar como douto professor e guia de caminhos.

E isso se espalha por blogs, podcasts, contas pessoais dos divulgadores de jornais, jornalões, que fazem isso com interesse editorial,etc como se tudo isso fosse apenas algo corriqueiro e não um posicionar-se como criador de regras gerais para problemas complexos que sequer os analisou para compreender.

E tem mais, há posições editoriais que adoram essas opiniões supremas e suspensas no ar da arrogância político-intelectual e que se fingem de uma isenção superior sem assumir um lado diretamente, no caso em específico o apoio direto a um perfil liberal democrata que se enfia na esquerda sei lá porque cargas d’água, como se um oligarca como Ciro Gomes fosse parte de uma tradição de diversidade que inclui Brizola, Prestes, Lula, Chico Mendes, Freixo,etc.

Sem contar que é óbvio que essas posições editoriais tem um lado político e fazem parte de uma disputa simbólica pela hegemonia do que é “esquerda”.

Respeito isso, é parte do jogo, o que não dá é não assumir o lado, não entender as diferentes formas de atuar nas esquerda e taxar como uma grande lei dogmática que “A esquerda está perdida”. Está? Que esquerda? O que é esquerda? Você está falando com os anarquistas antifa que perambulam todo dia caindo na porrada com neonazi, os membros socialistas do PSOL, a esquerda que tangencia o liberalismo do mesmo partido, os capas do PT, os núcleos militantes socialistas do PT, os prestistas no PDT, a Tabata Amaral, o MPL, os autonomistas, com quem você tá falando? De todos ou de nenhum deles?

E perdida porque? Há um guia que ignora as diferenças contextuais e conjunturais, os micro combates, as disputas simbólicas, as leituras de realidade em conflito e que contém também a disputa pela hegemonia cultural em torno de uma percepção neoliberal da realidade e uma diversa, que aponta para um anticapitalismo, e muitas vezes para um anticapitalismo ecossocialista? Que guia mágico é esse que faz tábula rasa de toda a complexidade em uma lei geral inóspita, redutora e estupidificante de todo um complexo ideológico?

A própria tese de perdição da esquerda propõe um dogma guia. E nem precisa ser analista de discurso pra perceber que isso rima demais com o marxismo vulgar ortodoxo que secundariza lutas e divergências em nome de “algo maior”, que só é definível pelos interesses imediatos do grupo político que defende aquele algo.

Nada mais parecido com este discurso do que o discurso que culpou o #Elenao pela vitória de Bolsonaro porque precisava-se “de pautas econômicas’, ou o que ficou treze anos dizendo “não é hora de criticar o governo, precisamos lutar contra a direita” enquanto Lula abraçava o Maluf.

Deve ser por isso que a pesquisa no Google sobre “a esquerda está perdida” tem doze milhões e quinhentos resultados, porque faz aniversário percepção autoritária da diversidade que confunde unidade com uniformidade.

A esquerda não precisa de guia, precisa de organização e organicidade, trabalho de base e trabalho diário.

Perdido está quem ainda acha, mesmo com todos os doutoramentos, que existe um guia possível para situações e organizações complexas.

A esquerda e a Reforma da Previdência

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Um dos debates mais prementes da atual conjuntura, ou melhor, da história recente, é a Reforma da Previdência.

Nos últimos trinta anos a Reforma da Previdência é um assunto que a cada novo governo toma a forma de um ataque cotidiano à própria ideia da Previdência social como repartição de responsabilidades da sociedade com seus idosos a partir da repartição solidária de ganhos.

Em meio a tantas especialidades postas à mesa falando do envelhecimento da população, do suposto deficit da previdência, da inviabilidade da própria ideia da previdência como repartição solidária rumo a uma ideia de capitalização, se finge ignorar que há em paralelo à própria destruição da parte social da previdência, engajada no discurso individualista irresponsável coletivamente que atribui uma qualificação de suposta liberdade ao trabalhador na escolha de em que previdência ele quer contribuir, se a que é lastreada pela gerência do Estado ou por previdências privadas que serão organizadas pela via da capitalização.

No meio de tudo isso pouco se discutem as repetidas formas de ataques e ampliações do suposto deficit da previdência a partir de medidas que reduzem o engajamento de trabalhadores na formalidade que financia a mesma previdência, se esconde que o discurso do empreendedorismo que em tese geraria novos ricos é um discurso de pressão na previdência, de descolamento das CLT, financiado pela formação de mundos de PJ super explorados e sem direitos, e que reduz a massa de contribuidores solidários à previdência atual. A Contra Reforma Trabalhista aumentou a quantidade de pressão à previdência, prejudicando mais ainda o lastro de financiamento dela pela destruição do emprego regular

Em resumo: As seguidas Reformas da Previdência e a Trabalhista produziram um quadro de sucateamento de direitos que cumularam no sucateamento da Previdência  Social, e a nova Reforma amplia isso com um ataque feroz para destruí-la, torná-la inútil, uma casca vazia, precarizando mais ainda os tipos de emprego que a financiariam, modulando-os para vagas que só aceitariam contribuir para a previdência capitalizada dos bancos. É só ler a Laura Carvalho e o Nelson Barbosa que você terá essa percepção crítica da proposta criminosa de Bolsonaro. Economistas da UFRJ, DIEESE, etc apontam para o problema da capitalização desmontar não só a Previdência Social, mas também o próprio futuro dos contribuintes.

Mas não é preciso ser economista para discutir a Reforma da Previdência e a meu ver é fundamental que a esquerda o faça, inclusive discutindo sua própria ideia de reforma, porque não é algo completamente alheio que há uma percepção de injustiça pelo povo com relação à Previdência, o que consideram distorções,etc. E é essa percepção, que colada ao discurso do empreendedorismo, que faz com que Bolsonaros tenham tido um apoio muito grande da população pra mudar “tudo isso que tá aí.”

O discurso de criminalização de servidores, de pesquisadores e professores não é exatamente impopular e faz tempo, e parte fundamental da hegemonia neoliberal na cultura brasileira, da proliferação de coaches, a cogitação do abandono de direitos em nome do “sucesso”, de uma ideia de self made people tupiniquim, da opção por ser PJ em vez de CLT, sem se preocupar com o que virá, é tudo parte do processo de desconstrução do sistema de pensamento da solidariedade entre as pessoas e a geração que fornece combustível para as seguidas reformas da previdência.

E basta negar a Reforma para reverter isso ou precisamos ir além da negativa? Para parte da esquerda parece que é preciso propor uma Reforma da Previdência de esquerda, e a ideia é até boa, só que ela não tangencia sequer a própria concepção da Reforma como algo diferente em estrutura das Reformas neoliberais.  A ideia de propor uma Reforma própria é interessante, mas se ela não reverte em um debate profundo sobre o papel da previdência ampliando a solidariedade inter geracional é melhor nem começar.

É exatamente ai que mora o perigo que desde Lula e Dilma atropelaram a esquerda em nome de sua necessidade de tentar conciliar com a burguesia em vez de disputar politicamente a própria condução política do estado e da ideia das reformas. Ciro Gomes, o PCdoB e parte do PSB parecem ir por esse mesmo caminho do PT, e não se discute algo que fundamentalmente venha a partir da perspectiva da classe trabalhadora.

Vamos entender que é necessária a Reforma? Pode ser, mas primeiro sem que o tal deficit seja o responsável por ela, porque ele é, no mínimo, discutível. Em segundo lugar vamos propor financiamento da previdência a partir da taxação de grandes fortunas e dos lucros, também da taxação do mercado financeiro. Ainda há o suposto deficit e ele não foi coberto nem pela cobrança das dívidas ou mesmo com tudo isso há a previsão de deficit futuro? Ok, então vamos discutir menos uma idade mínima e uma redução de benefícios que para os mais pobre se mais uma solidariedade entre classes para o financiamento da previdência tornando o bloco que mais ganha responsável pelo financiamento da previdência do bloco que menos ganha.

Sim, propor que não se mexa nem em idade mínima, nem em tempo de contribuição de quem ganha até um limite de, digamos, cinco salários mínimos, mas que a partir daí se comece progressivamente a impor idade mínima, aumentar a contribuição e propor que a contribuição permaneça quando se aposenta, especialmente os mega salários a partir dos vinte mil mensais. Também vamos propor que a taxa de quem recebe acima dos cinquenta mil mensais seja focada em financiar aposentadores e benefícios, uma sobre taxa. Ai iríamos discutir desigualdade e soluções para ela. E exporíamos a hipocrisia criminosa das reformas que só punem quem trabalha na base.

Não podemos esquecer do fim das pensões eternas a filhas de militares e de promotores, juízes e afins. Tampouco ignorar que há diferença entre o procurador com salário de trinta mil ou mais e o professor titular de universidade que se chegar um dia a isso o fez depois de trabalhar no mínimo o triplo, com o triplo de carga de trabalho, horária,etc de pesquisa e ensino.

O principal aqui é parar de estarmos sempre na defensiva que atua para discutir a Reforma Previdenciária só pela negativa, tornados pela mídia como vilões de filme B a partir da chantagem que ou reformamos a previdência ou a hecatombe econômica chegará.

Vamos discutir uma Reforma Previdenciária que se propõe a partir dos trabalhadores e que reduz desigualdades concretamente? É uma proposta, e uma ideia que é fundamental por em prática para que atuemos também na disputa por hegemonia a partir de um confronto contra a lógica do empreendedorismo que descola o povo do debate, que impõe uma negação do futuro a partir de um individualismo que atua no presente ignorando preços futuros.

Se organize, rapaz!

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No rescaldo da derrota na eleição de 2018 para a extrema-direita muitas receitas foram dadas para como superar o profundo pântano dos dias e anos seguintes, muitas análises estruturando uma tentativa de percepção do que causou o caos e como e porque resistir.

Da mesma forma muitas análises forma feitas indicando o horror que está por vir e o quanto será difícil atravessá-lo, como eles são terríveis, como querem nos eliminar, como são burros, etc.

Não fui exatamente na contramão dessas análises e nem pretendo criar uma receita que fará um bolo melhor, mas proponho uma alternativa às posturas olímpicas, que eu mesmo tive, e ao choro e ranger de dentes.

Minha proposta aqui se resume ao título, embora descreva uma série de questões e posturas que muitas vezes afastam as pessoas da proposta contida nele: se organizem para lutar.

E por que se organizar é importante? Porque a dura maturidade nos ensina que por mais que a gente seja iconoclasta, difícil, duro, mimado, etc a gente atua melhor estando entre companheiros do que sozinhos. Atuar organizado nos permite uma série de redes de amparo, apoio, acolhimento e suporte que são transversais às questões políticas, teóricas, psicológicas e emocionais e nos ajudam a viver e a lutar por um mundo melhor e contra sistemas e condições que aviltam a nós mesmos, a nossos companheiros e aos seres humanos como um todo.

Você nunca encontrou um partido ou uma organização que seja perfeita para você? Uma dica, rapaz: provavelmente é porque nada disso existe.

Somos únicos, isso significa que cada um de nós tem características que nos diferem uns dos outros de maneira a tornar uma perfeição para que nos adequemos a uma organização uma espécie de clonagem de nossos egos, o que é impossível e sequer desejável. Até mesmo as convergências políticas são adaptações de percepções individuais à questões mais amplas de acordo com as tradições, bases teóricas, aspectos organizativos, critérios e regras, e ocorrem por uma série de mecanismos que envolvem cessão de princípios individuais em nome de percepções coletivas, que são negociações individuais agregadas, e afetos, alinhamentos emocionais, pertencimento e identificação.

Em resumo: a organização perfeita para você é uma organização com a qual você concordou em negociar sua adaptação de percepções individuais às tradições, regras, ideias coletivas que fundamentam cada uma destas entidades ou grupos. E sim, existe uma organização pertinho de vocês que é perfeita pra ti.

O principal critério para evitar que uma organização te atropele ou te faça desistir de se organizar porque elas rompem com sua ideia de existência é conhecê-las para além das superficialidades. Não basta assinar ficha de filiação em partido ou ir em todas as reuniões do grupo anarquista já se entendendo como tal, ou frequentando a feira de economia solidária comprando e se assumindo cooperativista solidário. É preciso travar o diálogo amplo com os aspectos “técnicos” da organização e os afetivos, emocionais, buscar os autores base da organização, se eles existirem, lê-los com cuidado, decifrá-los, frequentar reuniões, analisar a complexidade de todas as organizações, perceber-se na organização, sua confiança pessoal, teórica e emocional nela. Tudo isso cabe de partido e correntes internas a associações de economia solidária ou de moradores.

Claro, algumas organizações não possuem uma base teórica nítida ou um conjunto de regras identificáveis, mas as redes de sociabilidade podem ser parte da tradição teórico-política dela e são detectáveis pelo grau de identificação e solidariedade existente nelas.

Existem organizações onde o perfil mais hierárquico e competitivo é mais perfeito e outras onde a supremacia de doses cavalares de afeto são mais presentes.

O principal é que é preciso construir com cada organização o processo que nos fez permitir a existência ao nosso redor de nossas redes de amigos. O processo de compreensão e aceitação das diferenças, a percepção da linha de identificação entre indivíduos que existe em cada roda de socialização, os comportamentos e afinidades, as diferenças e alinhar a isso as concepções filosóficas que os unem, e as que os separam.

Organizações são mais complexas do que rodas de relação, mas a percepção que faz com que os grupos sociais se assemelhem é a de que todos eles produzem redes de sociabilidade perceptíveis.

Mesmo os jogos de poder, as lutas internas em torno de cargos e posições decisórias, ocorrem em todos os grupos sociais. A questão é que em organizações por vezes quem não é exatamente seu maior objeto de afeto pode ser um aliado em nome de uma concepção ideológica ou percepção do real que os une em um espaço comum de compreensão da ação política.

E o principal em momentos como o de hoje é que isolados, como continuamente estamos neste contexto de percepção da atividade política como parte de uma rede de exposições de posturas e opiniões em redes sociais, somos alvo fácil não só da ira política de inimigos e adversários, mas de depressões, medos, desequilíbrios advindos da falta de apoio e especialmente das ações práticas de adversários contra nós.

A postura de isolamento inclusive fomenta as percepções de voto que passam ao largo de qualquer ideia de análise do real de largo espectro e que são presas fáceis de facilismos e impressionismos como as que eleições após eleições fazem com que se pressione por votos úteis já no primeiro turno sacrificando concepções de política e até sobre eleições, criminalizando votos nulos (anarquista ou não) ou votos por programa ou foco ideológico, como nos partidos menores, chamados de forma pejorativa como “não competitivos”, como se eleição fosse corrida de cavalo.

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Isolados somo presas fáceis das pressões e do impressionismo movido a medo, temos menso relações diretas com o debate político de fôlego, análise de conjuntura compartilhada ou mesmo a ideia de um dever para com nossos projetos políticos que nos fazem ter posições que estejam alinhadas de forma coerente com nossos projetos de sociedade e de mundo.

Juntos, em debate, analisando conjunturas para termos posições coerentes entre nós, trocamos ideias, assumimos posições que são coerentes com o resultado de nosso debate ou com as resoluções de nossas organizações, dependendo das características de cada grupo social. Isolados só temos a nós e nossas emoções como base, então o medo pode virar o principal conselheiro, enquanto em grupos sociais o medo pode ter, pelo menos, competidores ou um compartilhamento de sensações que amplia a segurança da decisão.

E partidos, correntes, coletivos, grupos de debate ou Conjunto de posições políticas neobudista Frida Kahlo, não importa a coloração ideológica ou a-ideológica, organizações, grupos sociais, nos permitem ter suporte, apoio e concentração de percepções políticas que nos auxiliam nos combates diuturnos.

O fundamental aqui é que para enfrentar oque temos pela frente não podemos continuar isolados xingando muito no twitter, é preciso procurar amparo, ajuda e base de ação nos partidos, sindicatos, organizações, coletivos, correntes, grupos de debate, grupos de meditação, movimentos, para que nossa ação construa uma sólida barreira ao avanço dos que nos querem destruir.

Então, se organize, rapaz!

Greve geral é tabu, impossibilidade conjuntural ou a esquerda tem medo dela?

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NENHUM PARTIDO DE ESQUERDA hoje discute, debate, escreve sobre greve geral. Sequer abre espaço pra começar alguma coisa nesse sentido.

E estamos falando de quem participa de CUT, CSP-CONLUTAS, INTERSINDICAL,etc, nenhum.

O debate tá proibido?

Por que?
 
Por que esse silêncio?
Será que da geleia geral do PSOL aos stalinistas ou trotkistas PCB e PSTU, passando pelo necrogovernismo petista e do PCdoB ninguém tentou debater isso ou pensou nisso?
 
O que está acontecendo?
Não me venham falar em “ausência de conjuntura”, please.
  • O ANDES há meses discute greve geral, sindicatos de servidores públicos de vários estados idem; escolas estão há meses ocupadas;
  • Índígenas e quilombolas em polvorosa pelas mudanças nas titulações de terra;
  • Mulheres e militância trans e lgbt em mobilização constante;
  • O governo tem a mais alta rejeição em décadas, maior que a da Dilma;
  • As PEC do Teto e da Reforma da Previdência são rejeitadas por mais de 60% da população, assim como a MP do ensino médio;
  • O congresso nacional tem a mais alta rejeição em décadas também

Cadê a chamada de unidade de ação para uma greve geral?

Por que esse silêncio?
Sabe quem fala em greve geral recentemente além dos sindicatos, alguns? A direita via MBL, etc.
Desde quando esse tema não só virou tabu para a esquerda partidária como além de manterem seus sites e páginas em redes sociais alheios a este debate, seus militantes se esmeram em transformar todo mundo que sugere greve geral como saída em “malucos”?
Não é pouca coisa isso e sugere sim um movimento articulado de silenciamento ou um nível de imobilização ancorado numa militância  e direções partidárias estupefatas e paralisadas nunca antes visto na história deste país.
A população cada vez mais radicalizada indo às ruas, as periferias idem, repressão comendo solta e a militância esperando a CUT se mobilizar por uma greve geral?
Jura que nenhum partido entende que pode ter papel preponderante neste debate e construir em conjunto uma conjuntura que permita uma greve geral?
Anarquistas e autonomistas tão praticamente diariamente neste enfrentamento e neste debate desde pelo menos 2015, é só olhar os textos das organizações anarquistas e autonomistas, fora a lembrança da greve geral de 1917, porque os partidos não começam também a organizarem suas forças para isso?
Jura que se PSOL, PSTU e PCB centrarem forças pra construção coletiva de uma greve geral não há condições objetivas de algum barulho?
O PSOL que faz propaganda de suas primaveras eleitorais não tem como deslocar as forças e pernas que as produziram para iniciar um debate franco sobre greve geral, mesmo num quadro de profunda descrença na via partidária?
E o PSTU e PCB?
Sim, vai ser difícil quebrar a desconfiança com as demais forças da esquerda, ainda mais quando todo dia militantes do socialismo amarelo fazem um esforço corno pra tentar desestimular qualquer radicalidade, transformando radicais em idiotas alucinados, ou pior, escrevem textos criminalizando autonomistas e anarquistas que adotam a tática Black Block, defendendo um tipo de manifestação que precisa ser muito descolado do real para não perceber que a PM não deixa acontecer: a manifestação pacífica contra o governo.
Mas vale um esforço mínimo construir a partir da convocação de TODAS as forças de esquerda ou historicamente ligadas a ela pra um debate convocatório de construção de greve geral.
Há uma conjuntura hoje de latência da rebelião, e ele fatalmente acabará acontecendo em algum momento, não por mágica, mas por uma conjunção de fatores que prejudicam demais grandes contingentes populacionais e em meio a uma profunda e galopante crise de representatividade. Se não é este o momento pra tentar organizar alguma mobilização de vulto, e consistência, como uma greve geral, qual seria o momento?
Claro, uma mobilização desta monta exige uma série de esforços históricos que compreenda as diferenças entre forças políticas, que vete conscientemente qualquer tentativa de hegemonização de atos e organizações, que silencie cooptações para que ocorram seriamente ações que construam uma greve geral ou atos de impacto similar.
Há sindicatos de professores discutindo auto-defesa diante da violência policial, por exemplo, o nível de tensão chegou ao ponto de deslocar pro centro gravitacional da revolta contingentes populacionais outrora avessos a ela.
É fundamental que alguém construa as pontes, seja  a CAB, a FIP, o PSOL, o PT, o PCB, sei lá, mas existe a necessidade de um novo CONCLAT com um aviso na entrada “Por favor pendurem aqui suas vaidades”.
É fundamental que a APIB seja compreendida não como um movimento social fofo,mas como um dos principais atores da retomada de mobilizações populares desde 2013.
É fundamental que a CAB e outras confederações e organizações anarquistas sejam respeitadas como parte fundamental da retomada de organizações em favelas, de mobilizações estudantis de fôlego e sucesso no último triênio.
É fundamental que os partidos da ordem que se reivindicam esquerda também desmontem a aversão a quem se organiza através da ação direta, porque o momento exige, porque o momento grita e pede por uma ação como uma greve geral.
Ah, greve geral é fetiche? Beleza, então organizemos coletivamente algo que tenha o impacto e o peso de uma greve geral. Têm ideia melhor? Opa, manda ver. Não tem? Então continuemos com o debate e a construção de uma greve geral.
Quer fazer um Cirandão país afora que atrapalhe o trânsito por 24 horas e impeça produção de rolar? Tamo junto,mas tem de impactar a produção.
O que não dá pra entender é a negação do debate, o elogio à loucura do imobilismo em um momento ímpar, na dor e no prazer, da existência das forças organizadas da esquerda.
A perda da eleição doeu,mas doerá mais perder o bonde da indignação popular.
Não dá pra eternamente ficar esperando a tempestade perfeita conjuntural.
Também não dá pra ignorar que haverão críticas a todos, como a Dilma ter feito a lei antiterrorismo e também iniciado a PEC do fim do mundo, ou do PSOL e PSTU serem cúmplices da criminalização de movimentos e ativistas que deram na lei antiterrorismo que fode a todos coletivamente hoje.
E anarquistas e autonomistas também sabem das críticas dirigidas a eles por parte da esquerda partidária, então fiquem tranquilos.
A questão é: vamos pro pau e pras ruas realmente ou é só meme?