Greve geral é tabu, impossibilidade conjuntural ou a esquerda tem medo dela?

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NENHUM PARTIDO DE ESQUERDA hoje discute, debate, escreve sobre greve geral. Sequer abre espaço pra começar alguma coisa nesse sentido.

E estamos falando de quem participa de CUT, CSP-CONLUTAS, INTERSINDICAL,etc, nenhum.

O debate tá proibido?

Por que?
 
Por que esse silêncio?
Será que da geleia geral do PSOL aos stalinistas ou trotkistas PCB e PSTU, passando pelo necrogovernismo petista e do PCdoB ninguém tentou debater isso ou pensou nisso?
 
O que está acontecendo?
Não me venham falar em “ausência de conjuntura”, please.
  • O ANDES há meses discute greve geral, sindicatos de servidores públicos de vários estados idem; escolas estão há meses ocupadas;
  • Índígenas e quilombolas em polvorosa pelas mudanças nas titulações de terra;
  • Mulheres e militância trans e lgbt em mobilização constante;
  • O governo tem a mais alta rejeição em décadas, maior que a da Dilma;
  • As PEC do Teto e da Reforma da Previdência são rejeitadas por mais de 60% da população, assim como a MP do ensino médio;
  • O congresso nacional tem a mais alta rejeição em décadas também

Cadê a chamada de unidade de ação para uma greve geral?

Por que esse silêncio?
Sabe quem fala em greve geral recentemente além dos sindicatos, alguns? A direita via MBL, etc.
Desde quando esse tema não só virou tabu para a esquerda partidária como além de manterem seus sites e páginas em redes sociais alheios a este debate, seus militantes se esmeram em transformar todo mundo que sugere greve geral como saída em “malucos”?
Não é pouca coisa isso e sugere sim um movimento articulado de silenciamento ou um nível de imobilização ancorado numa militância  e direções partidárias estupefatas e paralisadas nunca antes visto na história deste país.
A população cada vez mais radicalizada indo às ruas, as periferias idem, repressão comendo solta e a militância esperando a CUT se mobilizar por uma greve geral?
Jura que nenhum partido entende que pode ter papel preponderante neste debate e construir em conjunto uma conjuntura que permita uma greve geral?
Anarquistas e autonomistas tão praticamente diariamente neste enfrentamento e neste debate desde pelo menos 2015, é só olhar os textos das organizações anarquistas e autonomistas, fora a lembrança da greve geral de 1917, porque os partidos não começam também a organizarem suas forças para isso?
Jura que se PSOL, PSTU e PCB centrarem forças pra construção coletiva de uma greve geral não há condições objetivas de algum barulho?
O PSOL que faz propaganda de suas primaveras eleitorais não tem como deslocar as forças e pernas que as produziram para iniciar um debate franco sobre greve geral, mesmo num quadro de profunda descrença na via partidária?
E o PSTU e PCB?
Sim, vai ser difícil quebrar a desconfiança com as demais forças da esquerda, ainda mais quando todo dia militantes do socialismo amarelo fazem um esforço corno pra tentar desestimular qualquer radicalidade, transformando radicais em idiotas alucinados, ou pior, escrevem textos criminalizando autonomistas e anarquistas que adotam a tática Black Block, defendendo um tipo de manifestação que precisa ser muito descolado do real para não perceber que a PM não deixa acontecer: a manifestação pacífica contra o governo.
Mas vale um esforço mínimo construir a partir da convocação de TODAS as forças de esquerda ou historicamente ligadas a ela pra um debate convocatório de construção de greve geral.
Há uma conjuntura hoje de latência da rebelião, e ele fatalmente acabará acontecendo em algum momento, não por mágica, mas por uma conjunção de fatores que prejudicam demais grandes contingentes populacionais e em meio a uma profunda e galopante crise de representatividade. Se não é este o momento pra tentar organizar alguma mobilização de vulto, e consistência, como uma greve geral, qual seria o momento?
Claro, uma mobilização desta monta exige uma série de esforços históricos que compreenda as diferenças entre forças políticas, que vete conscientemente qualquer tentativa de hegemonização de atos e organizações, que silencie cooptações para que ocorram seriamente ações que construam uma greve geral ou atos de impacto similar.
Há sindicatos de professores discutindo auto-defesa diante da violência policial, por exemplo, o nível de tensão chegou ao ponto de deslocar pro centro gravitacional da revolta contingentes populacionais outrora avessos a ela.
É fundamental que alguém construa as pontes, seja  a CAB, a FIP, o PSOL, o PT, o PCB, sei lá, mas existe a necessidade de um novo CONCLAT com um aviso na entrada “Por favor pendurem aqui suas vaidades”.
É fundamental que a APIB seja compreendida não como um movimento social fofo,mas como um dos principais atores da retomada de mobilizações populares desde 2013.
É fundamental que a CAB e outras confederações e organizações anarquistas sejam respeitadas como parte fundamental da retomada de organizações em favelas, de mobilizações estudantis de fôlego e sucesso no último triênio.
É fundamental que os partidos da ordem que se reivindicam esquerda também desmontem a aversão a quem se organiza através da ação direta, porque o momento exige, porque o momento grita e pede por uma ação como uma greve geral.
Ah, greve geral é fetiche? Beleza, então organizemos coletivamente algo que tenha o impacto e o peso de uma greve geral. Têm ideia melhor? Opa, manda ver. Não tem? Então continuemos com o debate e a construção de uma greve geral.
Quer fazer um Cirandão país afora que atrapalhe o trânsito por 24 horas e impeça produção de rolar? Tamo junto,mas tem de impactar a produção.
O que não dá pra entender é a negação do debate, o elogio à loucura do imobilismo em um momento ímpar, na dor e no prazer, da existência das forças organizadas da esquerda.
A perda da eleição doeu,mas doerá mais perder o bonde da indignação popular.
Não dá pra eternamente ficar esperando a tempestade perfeita conjuntural.
Também não dá pra ignorar que haverão críticas a todos, como a Dilma ter feito a lei antiterrorismo e também iniciado a PEC do fim do mundo, ou do PSOL e PSTU serem cúmplices da criminalização de movimentos e ativistas que deram na lei antiterrorismo que fode a todos coletivamente hoje.
E anarquistas e autonomistas também sabem das críticas dirigidas a eles por parte da esquerda partidária, então fiquem tranquilos.
A questão é: vamos pro pau e pras ruas realmente ou é só meme?

The Bookchin is on the table

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Pensar ecologicamente é descentralizar, é construir holisticamente e descentralizadamente um processo coletivo de interação. É gerir-se e gerir a política para além da dialética e do diálogo, buscando a polifonia onde não que tente e nem se construa a síntese, mas se produza um processo que vá além da síntese, do amálgama do processo coletivo e horizontal em um processo amputado, sintético que que se conclui com a tentativa de unidade opinativa e não de construção coletiva concreta onde a isegoria se transforma em liberdade.

Ecologia demanda pensar de forma descentralizada e decentralizante, anti estatal, anti capitalista, indo além da proposta centralizadora da maior parte dos partidos e do próprio ethos partidário, de manter o estado e reformar o método de gerenciamento dele a partir de parâmetros socialmente avançados.

É preciso desconstruir a ideia de mudança pela gestão do estado sem mudar a estrutura, buscando dentro da institucionalidade centralizadora e hierarquizante construir um mundo idealmente descentralizado e comunal.

Se o ecossocialismo despertou em mim esta compreensão, a partir de Tanuro e Lowy, ao ler Bookchin entendi que ser ecológico é ser anticapitalista e antiestatista e que o centro das transformações está na tomada de poder pelas comunidades, pelas aldeias, pelos bairros, pelas mulheres, pelos velhos, pelos índios, pelos quilombolas, pelas crianças.

Se a anarquia despertou de novo em mim o antiestatismo que nunca foi embora e a ideia radical de que sem destruir a hierarquia não se tem anarquia, em Bookchin entendi que além de anarquizar é preciso ecologizar, é preciso ir além de ser horizontal sendo ecológico, participando ativamente da relação integral entre espécies, entre reinos, entre as diversas formas de existência presentes no mundo dito natural.

A ideia de Bookchin é revolucionária por si só quando ele discute a cidade e a ecologia a partir da necessária defesa da diversidade, do papel revolucionário dos bairros e das cidades na luta contra o estado e pela relação de vizinhança, de solidariedade comunal, que rejeita a hierarquia do estado impulsionando a opressão. A partir deste eixo ele constrói a teoria onde bebe em fontes amplas, desde a democracia grega até se referenciar nas associações comunais da Nova Inglaterra, presentes até hoje de alguma forma como eixo de tensionamento com o estado estadunidense em suas diversas esferas, especialmente nos condados e municípios, mas indo até mais longe que isso.

A ecologização da política se reflete para além do discurso, e mais, ataca o eixo de compreensão do estado, coletivos, comunidades partindo da lógica anti hierárquica. Este efeito influenciou os Zapatistas no México, os revolucionários curdos de Rojava e diversos coletivos anarquistas ou não mundo afora. E influencia, pois radicaliza na defesa da horizontalidade e da ideia revolucionária que sem diversidade e ecologia o pensamento anti hierarquia morre por falência múltipla de órgãos.

E por que morre? Porque é fundamental para a sobrevivência de um bioma que ali exista diversidade, ausência de hierarquia, relação de isonomia entre os entes que ali vivem, acesso a alimento, água, presença de múltiplas e igualitárias regras de existência paras que da árvore ao esquilo todos vivam para que nutram-se em equilíbrio.

A tosca analogia entre predador e predado esquece que o predador morre, apodrece, vira adubo que alimenta as árvores, que fornecem vegetais que alimentam os animais menores que alimentam os predadores. Com o perdão da analogia também tosca, mas a ecologia deixa claro que o mais forte não sobrevive sem uma relação de simbiose em algum nível com o mais fraco e que esta relação não é necessariamente opressora e nem precisa ser.

Não há como permanecer uma separação entre produção, economia, consumo, processos decisórios, judiciário, segurança, alimentação e saúde sem a compreensão dos efeitos de interligação entre cada elemento destes, de nossas vidas e do mundo dito natural.

Não há mais espaço, na verdade nunca houve, para humoristas ironizarem em rede nacional em programa de entrevista a luta contra a caça às baleias perguntando para que elas servem (Chico Anysio no programa “Jô onze e meia”).

Não há mais espaços para a defesa de crescimento econômico, de reformas urbanas, políticas, sociais sem a discussão sobre recursos naturais, responsabilidade no consumo, papel da indústria, da cultura de fábrica, direitos comunitários, laços de solidariedade comunal, conhecimentos tradicionais, clima, hidrologia,etc.

Não se pode defender um crescimento econômico a todo custo projetando-se no macro ignorando-se o efeito disso no cotidiano populacional. Mais, é criminoso pensar o macro ignorando-se o somatório de efeitos de processos decisórios nas múltiplas realidades do micro e seus efeitos.

Em suma, não é possível que se mantenha a cegueira optativa de entender que a ampliação de hidrelétricas na Amazônia tem efeitos daninhos lá e esses efeitos ecoam na crise hídrica do sudeste.

Não é possível ignorar que a ampliação do consumo de energia que segundo os “planejadores” da economia obrigam a investimento na ampliação de hidrelétricas e térmicas ocasiona ampliação do aquecimento global, mudanças ecológicas que interferem no regime de chuvas, na sobrevivência de espécias e que isso tem efeito amplo que vai da crise hídrica à ampliação de presença de contaminação por doenças antes desconhecidas a partir de insetos, por exemplo.

A centralização e hierarquização da política, dos processos decisórios, da própria lógica econômica, do estado, dos governos, da ideia de PIB, tudo isso é em si anti ecológico e por consequência criminoso e anti vida.

Enquanto a Economia busca a normatização,regulação e administração (Oikos = Casa; nomos = Costume ou lei) do lugar onde se vive, a Ecologia busca entender o funcionamento do lugar onde se vive (Oikos = Casa; logos = estudo ou lei). E quando a normatização ocorre antes da compreensão a coisa toda degringola.

Com o devido perdão da simplificação filosófica a partir da semântica, a ideia não distancia-se de uma análise mais profunda da relação entre percepção hierarquizante, centralizadora e autoritária do estado e a ausência nas tradições políticas estatistas de qualquer compreensão ecológica e resistência à ideia de horizontalidade, de gestão comunitária, citadina, de bairro, de rua a rua, de recursos, direitos, justiça, segurança, saúde.

Essa ausência de percepção, essa ausência de entendimento do coletivo, do comunitário, da cidade, bairros, vilas e ruas como eixo da vida cotidiana, das organizações sociais, dos grupos sociais, como fundamentos e não como elementos secundarizantes e secundarizados, provocam a percepção de que é lógica a instalação de grandes siderúrgicas que destroem a vida de pescadores artesanais e o bioma de Santa Cruz, como no caso da TKCSA ou implantam termelétricas como a de Pecém no Ceará, que se alimenta de enorme quantidade de água em uma localidade com enorme carência de recursos hídricos ou ainda pior no caso de Belo Monte, onde além de destroçar a vida de comunidades indígenas e populações tradicionais ainda secam uma grande área do rio Xingu atingindo desde aldeias indígenas até o óbvio, a vida animal e vegetal ali presente, sem considerar em nenhum momento o que isso vem a causar nos demais biomas, nas demais relações ecológicas que respondem pela sobrevivência do planeta e na nossa própria sobrevivência.

Esse descolamento não é sintoma, é a causa do processo de crise ecológica que se tornam visíveis com a crise hídrica e climática, mas cujos efeitos são muito mais amplos, talvez sequer tenhamos a compreensão total destes efeitos.

Até hoje não se tem compreensão completa dos efeitos do vazamento de petróleo das plataformas da British Petroleum no golfo do México. Os efeitos das mudanças climáticas, causadas pela ação humana em especial pela queima de petróleo e outros combustíveis fósseis, possuem efeitos claros e em andamento (Como a crise hídrica mundial, e mais especificamente no sudeste brasileiro), já denunciados e anunciados, porém há uma relação de reação em cadeia para cada efeito deste, a partir do somatório de danos ambientais localizados, que não se pode nem matematicamente medir, dada a grandiosidade.

Essa grandiosidade ocorre porque se pensa o macro ignorando os efeitos de cada ação no âmbito micro e como isso se reflete a partir do somatório de efeitos e das reações em cadeia produzidas. Pensa-se no macro sem na verdade se pensar no macro, ou entende-se o macro sem entendê-lo como um somatório de micros.

A chuva que falta e causa a crise hídrica também seca plantas que deixam de alimentar animais que deixam de ser alimentos de outros animais maiores. E o problema ai não é o aumento de preço no mercado, é a possível extinção de espécies, cujos efeitos não são facilmente mensuráveis e tem tudo pra produzir mudanças no meio ambiente que causam outros tantos danos e mais reação em cadeia.

Em resumo a partir do desprezo pelos processos micro históricos, no interior dos grupos sociais, dos biomas localizados, das micro relações no meio ambiente, a partir da estruturação de uma ideia de relações sociais, econômicas,etc que ignoram a vila, a planta, o bicho e só pensem no nacional, no estado, na transnacional, no continental e no mundial, mas do jeito errado, o que se pavimenta é a destruição estrutural e totalizante de tudo isso.

Por isso the Bookchin is on the table, porque é preciso descentralizar, ecologizar, organizar a transmutação de baixo pra cima, destroçando a generalização, a hierarquização, a ausência de diversidade, o autoritarismo da sociedade que naturaliza o estado e do estado propriamente dito.

É preciso ser mais vila e menos Governo, mais planta e menos plantação, mais bicho e menos manada.

The Bookchin is on the table, basta ler, basta agir, basta ser ecológico e horizontal, porque é lógico, porque é eco.

A verdade, o unilateralismo, a beleza, o índio, o negro e o black Bloc

images (1)Todo pensamento unilateral contém o inevitável autoritarismo. O entendimento de algo como uma verdade única, centrada em uma objetivação da realidade é automaticamente inibidor da diversidade e portanto da democracia.

Esta “ditadura” reflete-se na sociedade de muitas formas, desde a lógica do padrão de beleza unitário, que exclui gordas e negras do belo, até o entendimento da ideia de progresso como ligada intimamente ao aquecimento da economia, ao aumento de consumo, ao aumento e desenvolvimento das “forças produtivas”, como se fosse um ligar de uma locomotiva faminta e sem freios na direção do abismo.

201109070815340000004175Produzir significa acumular capital, conforme o pensamento hegemônico, produzir significa consumir matéria-prima e energia para que bens sejam construídos, consumidos em nome de um bem-estar intimamente ligado ao ter. Esta ideia de produção é o carro-chefe de uma ditadura de entendimento da realidade, de um pensamento único, que se vale da concepção que produzir, viver, ter, estar, morar são estados relacionados diretamente com a ideia de propriedade, com a ideia de economia com valoração de cada elemento ao redor do homem, inclusive ele, seja terra, ar, água, bichos, plantas, como se todos tivessem um preço, como se o valor de uso e troca fosse natural, nascesse com cada item da realidade ao redor do homem, líder máximo de uma lógica onde o homem é o centro do universo.

la-pensee-uniqueEsse entendimento é complementado com a recusa de percepção de qualquer outra forma de entender a realidade, de qualquer percepção cultural divergente, como passível de alguma “razão” ou sentido. A concepção de etnias indígenas da terra como parte de um organismo vivo, como elemento fulcral da existência deles para além da economia, da produção, do valor continente no uso da terra, vira anátema, pois bate de frente com a lógica, o pensamento único em torno do qual se ergue a economia e a lógica de vida ocidental, cristã, branca.

Outro aspecto da ditadura do pensamento único é a ótica do que é bom ou não para segmentos inteiros da população. Pobre morar na favela? Não pode e jamais passa na cabeça das pessoas a possibilidade urbanizar a favela, de que favela seja cidade. Greve? Atrapalha o trânsito. Proibir carro no centro das cidades? Atrapalha o direito individual da posse do automóvel, dane-se se o transporte coletivo permanece secundarizado em nome do individualismo egoísta, consumidor de combustíveis fósseis que aceleram os efeitos do aquecimento global. Lutar pelo fim dos combustíveis fósseis? Maluquice, a economia EXIGE crescimento e isso EXIGE energia, EXIGE, o conforto individual, a matriz energética em uso é o petróleo e não se fala mais nisso, energia renovável e alternativa são caras demais!

20090207_non.pensamento.unico.grandeE palavra em torno de muitas destas questões é “custo”, é a centralidade do “custo”, do aspecto monetário sobre todo e qualquer entendimento relativo à lógica do bem viver como mudança dos paradigmas de civilização, para além da precificação da vida, das pessoas, das cidades, da terra, das matas, do existir. O “custo” das coisas é central, o “custo” das coisas é o eixo em torno do qual giram a lógica que prioriza, hierarquiza o que deve ou não ter a economia direcionada para realizá-lo, ou seja, o que é prioritário para a população e sociedade é decidido em torno de “custo”.

E quem decide? Como se dá o processo “democrático” de decisão? Há democracia? Se chega ao todo todas as informações, todos os meios de decidir, o que está em jogo?

imagesPoderíamos elencar também problemas relacionados ao processo de veto à homossexualidade, de repressão à orientações sexuais diversas, à transsexualidade, à ideia do papel da mulher, à lógica de respeito à diversidade étnica, ao racismo, ao racismo ambiental e tantos outros efeitos da ditadura do pensamento único, que parte de uma hegemonia cultural elitista e chega aos jornais e Tvs e é reproduzida, naturalizada, tornada como um elemento dado da vida cotidiana, imutável, asfixiante.

E todo pensamento contra hegemônico é crime, é criminalizado.

Todo método contra hegemônico é crime, é afastamento do povo das lutas, é afastamento da regra, da lei, do bom comportamento, dos bons modos, do bom senso.

E é por isso que toda criminalização dos Black Bloc tem um pouco de navio negreiro.

Os Black Bloc, a ladainha e o chatolino

downloadBem, sob pena de ser chato e repetitivo: Os Black Bloc não são um movimento. Sem nenhuma tentativa de ironizar ou desqualificar o interlocutor: Me surpreende a dificuldade que parte da esquerda tem de entender que os Black Bloc não são um movimento e não possuem táticas que visem acúmulo pras lutas.

Além disso, os Black Bloc não necessariamente são os mesmos que quebram Bancos, pontos de ônibus e MacDonalds, embora em Seattle e Genova esse tipo de protesto tenha ocorrido por uma parte das pessoas que se organizavam no bloco preto, que é o que na verdade são os black bloc.

black-blocBlack Bloc é uma identificação externa de um bloco dentro de uma manifestação que se organiza de forma defensiva, de forma a impedir o avanço dos choques. A tática de movimento é ocasional, é organizarem-se a cada manifestação de forma a defenderem o resto do ato dos avanços das polícias. A lógica começou nos anos 1970 por autonomistas alemães, a maioria marxistas, e ganhou na Europa outras cores com adesão de anarquistas, anarco punks e punks, muitas vezes organizados também nas ocupações urbanas.

Nas manifestações antiglobalização dos anos 90/2000 se espalharam mundo afora e no Brasil começaram a aparecer.

À rigor os Black Bloc não tem diferença tática de queimar pneu em avenida ou quebrar cabine de pedágio ou ocupar terra ou ocupar edifício. E não tem nenhum tipo de acúmulo imediato pra luta. Qual o acúmulo pra luta teve a ação da via campesina em quebrar o laboratório da Aracruz ou dos índios do Xingu detonarem a ensecadeira do Rio Xingu na obra de Belo Monte? E como se define “Acúmulo pra luta”?

3d8facd6f2c20f669666e55e5ccc81b3_500A luta não é um banco onde só ações táticas diretas ganhas a partir do contrato adquirido pós-greve se acumulam na acumulação primitiva de capital político.

Na luta aspectos simbólicos se juntam com aspectos objetivos do cotidiano e da luta política e o que se busca aqui, no imediatismo que nos toma, talvez nos cegue para o que se ganha lá na frente.

E antes de mais nada o primeiro grande acúmulo pras lutas que os Black Bloc nos deram é nos tirar do imobilismo analítico e estanque, que aponta a ação direta como um câncer para um processo revolucionário amorfo e mezzo idílico que na maioria das vezes não passa de fantasia.

Educação para professar a mudança

black-bloc-rio-de-janeiro-20130812-30-size-598O ar é sólido, irrespirável, arde, arde em quem está nas praças e em quem assiste de casa.

O ar é pesado, é duro, é nitidamente absurdo, concreto.

Essa é a sensação do desgoverno autoritário que vivemos no Rio de Janeiro, do desgoverno abraçado à Abril Educação, Fundação Roberto Marinho, acobertado pela mídia, pela covardia do PT local e nacional, pelas alianças, pelas amizades, pelas empreiteiras, pelas ânsias, pelas máquinas.

Essa é a sensação de quem vê governos optando por pagar ao professor quase o mesmo que pagam em cada bomba de gás lançadas sobre manifestantes, educadores, merendeiras, e isso independente de serem agressivos espantalhos mascarados ou mulheres, homens, jovens ou não, professores acampados, pacificamente acampados e exercendo o direito constitucional de manifestarem-se.

Essa é a sensação de quem vê a omissão do ministério Público do Rio de Janeiro, do Ministério Público Federal, de lutadores e lutadores, ou ex-lutadores e ex-lutadoras, que optam conscientemente pelo cálculo eleitoral que sustenta esta máquina de absurdos que emulam ditaduras.

O ar é pesado, o ar é rígido, o ar é de luto e de luta, mas uma luta que cria raivas, raivas que separam, raivas que juntam.

caetano-veloso_black-blocJá disse o poeta Aldir Blanc: “A fome tem de ter raiva para interromper, a raiva é a fome de interromper, a raiva e a fome é coisa dos home”.

E é essa raiva que se espalha, nas velhas ruas vacinadas de revoltas, pelas velhas ruas vacinadas por baterem-se contra almofadinhas “modernizantes”, contra soldados, contra marmanjos fardados, contra vidigais, contra miliciais e sargentos.

“A fome tem de ter raiva para interromper” e a raiva cresce.

O chão da Cinelândia cheira a pimenta, pimenta que verte sangue e que no sangue verte força. Força que verte mudança e a cada mudança o grito ecoa.

Ouvimos as vozes que nos dizem que o Rei está nú e por isso é chegada a hora da reeducação de alguém.

A dimensão da utopia, a revolução e os novos Lênins

 Road_to_utopiaTratar de mudança política não é exatamente simples, tampouco receita de bolo. A dimensão da transformação tem tantas miríades de sentidos possíveis subjetivos a serem lidos em atos, palavras e movimentos, que a simplificação de um método ou de uma ideia de estado, ou de mesmo uma só ideia de revolução é delírio simplificador.

Se ler a realidade concreta fosse fácil e apontasse para um só sentido unitário não haveria desde sempre um mar de pensadores mundo e história afora, cada um com sua percepção de uma realidade, de uma verdade ou até da não-verdade.

A questão é que cada contexto histórico, cada conjuntura, aponta sinais identificáveis de novas formas que a multidão de gentes por vezes denominada “povo”, “massa”, “massona” ou “povão” (quase sempre por quem se aparta dela para defini-la com distância segura) interpreta se não o real a ruptura com o que entende como sistema ou peso opressivo de alguma realidade.

Cada contexto histórico traz suas insurgências, traz suas permanências, traz suas rupturas e conservações e é necessário que cada pensador ou militante que pretenda transformar este real lê-las, olhá-las nos olhos, preocupados menos com encontrar a verdade verdadeira única de todas as coisas e mais com antecipar minimamente uma tática de intervenção que consiga atrair o máximo de gente possível para oque defende como eixo de ações transformadoras.

É, amigão, to falando de convencer pessoas que tua tática revolucionária é o lance.

img_ju427-06bNeste contexto atual, por exemplo, o próprio questionamento da relação entre movimentos, partidos e ativistas com o cotidiano político é questionado. A própria relação entre os movimentos, as pessoas e a atividade política é jogada aos leões em busca de demolir concepções quadradas de vida, de militância, de relação com vidros, vidraças, mundo, ambiente, amor, mídia.

A dimensão contestatória não tá ai para fingir que não vê a frase maldita cheia de homofobia do sujeito que em tese diz que quer mudar o mundo.

A contestação, caras pálidas, não tá vestindo o fraque mediado do fanfarrão da esquina, tampouco o papo brabo de que “povão é assim”.

A contestação quebra vidraça do Itaú,a contestação arrebenta a secadora do Xingu, invade usina, ocupa Câmaras, derrete leninismos de salão querendo mais que conversinha nas terras Quilombolas, na avenida Paulista ou na praça onde Feliciano-RS prendem pessoas que se beijam em um espaço público ocupado por ele indevidamente em nome de uma só vertente de uma só fé, atropelando a laicidade do estado, atropelando a democracia de um estado cujo emblemático simbolismo de um Pastor Deputado (jamais um Deputado Pastor) chamando a polícia para reprimir lésbicas se beijando EM ESPAÇO PÚBLICO é eloquente.

street_art_24A contestação não trata a dimensão do sonho como um “Além da Imaginação”, uma “Twilight Zone” promovida por esquerdóides, amiguinhos. A contestação chegou à sala de aula, e não na cabeça de estudantes, mas na de professores precarizados em greve numa das principais cidades do país.

A contestação tá na rua derrubando um dos governadores centrais para a política do PT e para concepção de cidade mercadoria, de mundo mercadoria, de Brasil Grande neodesenvolvimentista com fome de petróleo, com fome de carbono, de escolas, de postos de saúde, de consumo que nos consome enquanto gentes a trabalhar doze, treze, quatorze horas para pagar os carnês das dívidas enquanto deixamos a vida no prelo.

A contestação pegou a dimensão do sonho gritando que não era por vinte centavos enquanto militantes amestrados pro revistas, blogs e sites de partidos acostumados com a cadeira acolchoada do poder dizia se tratar de Vândalos e Baderneiros.

imagesA dimensão do sonho voltou numa contestação mascarada que lei nenhuma vai desmascarar e enquanto isso ainda existem citadores compulsivos de Lênin procurando pelo em ovo pra justificar qualquer coisa em nome de mandatos acomodados, acostumados a pedir em vez de exigir, a criar espantalhos para a fome de moral e bons costumes de quem pede o fim da corrupção como se pedisse pães franceses na padaria mais próxima.

E enquanto a dimensão do sonho renasce com utopias múltiplas, dissonantes e polifônicas, como deve ser, a exigência de novos Lênins é clara, imensa, nítida. Mas exigem-se novos Lênins com menos fome por construir estacas fundadores de novos países e novos estados, mas canais para o fluxo contestatório passar derrubando represas.

São precisos Lênins que construam o diálogo, um diálogo amplo, que aprendam, que ensinem, que se joguem, que quebrem, que requebrem, que riam, que sambem, que ouçam a polifonia menos buscando a síntese perfeita e mais aprendendo que ruptura pode sim rimar com gostosura, com liberdade, com vontade e com verdades, sim com s, por muitas, imensas, gigantes, que nunca dorme, que se soltam noite afora quebrando tudo até a última ponta para derrubar Cabrais e outros ditadores mal-acostumados a achar que a voz das ruas é rouca, enquanto sempre foi doce.

images (3)São precisos novos Lênins prontos a divertirem-se recuperando a utopia, a dimensão do sonho em que Garibaldis, Bakunins, Marx, Engels fizeram a primavera dos povos.

Porque sempre precisamos de mais primaveras.

Brasil: Um País de esqueletos no armário #desarquivandoBR

tumblr_m2clmrKfeC1qejpkbo1_500A história do Brasil é repleta de esqueletos no armário, do impedimento do encontro das muitas faces da verdade ocultadas em armários, gabinetes, medos e pavores dos que comandam a pátria mãe tão distraída.

Da Abolição a Canudos, do Contestado à Revolta da Vacina, da Revolta da Chibata à Vargas, de Vargas a 64, de 64 até 2013, o número de esqueletos no armário só aumenta, fazendo com que o país necessite de muitas comissões da verdade para extirpar as manchas indeléveis que permanecem nítidas em sua história e são reproduzidas no cotidiano da sociedade através das eras.

Charge 1As torturas nas delegacias de hoje são frutos da reprodução das práticas das tantas ditaduras ou do passado escravista onde o outro devia ser reduzido pela dor à uma peça obediente para que o controle social fosse efetivo?

As mortes cotidianas de jovens negros são fruto da política das ditaduras sendo mantidas com as mesmas táticas e diretrizes ou da criminalização de negros e pardos como pobres, e portanto criminosos, que se iniciou ainda no pré-abolição?

imagesA secessão entre pobres e ricos, as restrições de protestos, as restrições de expressão, a violência cotidiana com relação a direitos das minorias majoritárias, a manutenção na porrada dos padrões de comportamento em uma disciplina social ferrenha, autoritária e violenta são fruto dos resquícios da ditadura de 64 ou dos muros invisíveis erguidos para justificar a escravidão e manter o controle social sobre escravos, pretos, pobres e mulheres por uma sociedade escravista onde o macho adulto branco não fazia a menor questão de não reivindicar seu lugar no topo da cadeia alimentar?

São muitas as perguntas e nenhuma das respostas deveria ignorar que cada esqueleto guardado no armário torna o Brasil um país com uma das sociedades mais injustas do mundo, e que não só não resolve seus problemas do passado como se esforça para alimentar o faminto armário de mais esqueletos para a manutenção da nódoa de lama e sangue a qual nomeia História.

images3A manutenção dos ossos no armário não permite o reconhecimento da história do Morro da Providência e a presença fundamental daquela população onde está para manutenção da memória dos primeiros atingidos pelas inúmeras reformas urbanas do Rio de Janeiro e pela memória da guerra do Paraguai e Canudos.

A manutenção dos esqueletos no armário permitiu que João Cândido morresse na miséria, sendo mantido pela marinha como criminoso, mesmo tendo sido um herói da luta antirracismo naquela força armada.

jt11_ditaduraA fome do armário de ossos também mantém a lógica de resistência a uma fictícia guerra entre comunistas e a “nação” que produz Bolsonaros e Felicianos e também mantém Canudos e Contestado como anátemas para um exército acostumado e pisar na cabeça da população que cisma em fugir de uma ordem platônica erguida pela corporação e cujo lema Ordem e Progresso não se furta a atropelar peles pretas e pobres que por acidente estejam em seu caminho.

militaresarquivosditaduOs esqueletos no armário também mantém até um governo, onde boa parte de seus membros é vinculado diretamente à resistência contra a ditadura de 1964, refém de um pragmatismo torpe e cúmplice da manutenção dos esqueletos dos mortos e desaparecidos pela ditadura militar ocultos sob camadas e camadas de arquivos fechados e cujo teatro da Comissão Nacional da Verdade nem de leve pensa em remover o pó que os oculta, um pó repleto da tradicional injustiça de nosso Estado, de nossa Pátria, que devia ser fratria e nem mátria é.

ditadura1Enquanto os homens exercem seus podres poderes o armário permanece alimentado de esqueletos, alguns muito antigos, e o país rico, que se pretende sem pobreza, segue batendo em índios, negros, gays e mulheres. Segue mantendo a injustiça e prosseguindo sob uma lenga lenga de “Mudamos a vida das pessoas” deixando os rastros de sangue de uma ausência de qualquer mediação entre a violência conservadora do status quo e os inúmeros atingidos pelo seu voraz caminho de enriquecimento dos barões e amigos do rei.

esqueleto limparEnquanto os homens exercem seus podres poderes e buscamos fazer renascer nosso carnaval o grito de “Apesar de você” segue preso numa garganta acostumada a romper o silêncio da paz de cemitérios que é nosso país na marra, na rua, numa raça que só quem possui a estranha mania de ter fé na vida poderia ter.

Os arquivos são muitos, os esqueletos são muitos e serão mantidos fechados enquanto não entendermos que a morte dos Juvenais e Raimundos, de tantos Julios de Santana, se refletem no Xingu, em Belo Monte, na Providência, em Manguinhos, no Capão Redondo, em Porto Alegre, no Mato Grosso, na Avenida Paulista.

frase-se-voce-nao-se-pode-livrar-do-esqueleto-que-esta-no-seu-armario-e-melhor-que-o-ensine-a-george-bernard-shaw-154307Para amanhã ser outro dia é preciso que entendamos quem manda na chave dos armários onde os esqueletos estão guardados, é preciso que entendamos quem se mantém guardando os esqueletos desde o Império e ainda hoje, em um governo do ex-Partido dos Trabalhadores, possui o poder para continuar alimentando-o com novos ossos.

ditaduraÉ preciso que lembremos sempre a memória de tempos onde lutar por seu direito era um defeito que mata, e para isso é preciso que lembremos o tamanho do armário de ossos, os tantos ossos ali ocultos, que lembremos quem guarda a chave, para que o abramos e deixemos sair nossos heróis que não morreram de overdose, mas de História, e nos aguardam para que os façamos ver o sol nascer a nosso lado, como memória, como verdade, como justiça.

Post participante da VII Blogagem Coletiva #desarquivandoBR..

A esquerda, o gueto, o PSOL e a galera

Por Gilson Moura Junior

imagesExiste um problema na esquerda brasileira que exige de nós uma análise mais profunda que impressionismos localizados.

Há uma profunda necessidade de mudança estrutural na esquerda e esta mudança passa pela rediscussão teórica, passa pelo repensar da organização e pela opção consciente de manter uma relação com a institucionalidade burguesa com um profundo grau de autocrítica. Vou mais longe, é preciso que se reconstrua a discussão sobre o papel da democracia sob o ponto de vista da democracia burguesa e que exija também a manutenção da democracia como valor universal da esquerda, com a recondução dos valores democráticos conduzidos pela mão de um debate à esquerda.

A questão não é só de mudança estrutural do PSOL, mas da própria esquerda marxista no Brasil e talvez no mundo. Esta demanda inclusive é uma demanda que está dada é desde a queda do muro de Berlim.

Estamos tentando, estamos na luta, é preciso sim refletir sobre o papel do PSOL nisso, e mais, do papel da Esquerda pós-PT, da crise do socialismo no mundo. Não é só o PSOL, o PSOL é um dos elementos de uma crise até mundial da esquerda.

how_communism_worksA esquerda mundial está em crise, buscando rumo, desde os anos 90, desde o avanço do neoliberalismo e capitulação de parte da esquerda à social democracia. O PSOL faz parte disso com o agravante de ter sido alvo de duas tsunamis que atingiram a esquerda, a crise mundial da esquerda e a crise do PT.


O PSOL pode ser inclusive lido como fruto seminal da crise iniciada no meio dos anos 1990 dentro do PT e que junto com a crise mundial da esquerda marxista engessou boa parte dela no eleitoralismo e na luta institucional. Há inclusive o risco do PSOL nem superar isso, e um risco nada pequeno, caindo na vala comum da burocratização e cooptação do estado burguês como outras experiências mundo afora.

A lógica de que “precisamos sair do gueto” vem desta mudança ocorrida desde meados dos anos 1990 aqui no Brasil, via PT, da esquerda ancorar seu projeto na institucionalidade. Ai o sindical virou correia de transmissão do eleitoral, o Movimento Estudantil idem, o movimento Feminista idem e por ai vai. Até o MST de certa forma é atraído para esta lógica e se engendra de tal forma que se perde no imobilismo.


20120719032823_cv_randolfe_gdeNesse sentido a insistência de parte do PSOL, representada pela ala onde as referências são a Vereadora Marinor Brito e o Senador Randolfe Rodrigues, a respeito do sair do gueto é fruto da identificação do “sair do gueto” com sucesso eleitoral. Também confundem penetração e capilarização política com voto em eleição. Por isso o desespero e isso é um problema de fundo, fruto da miopia que não enxerga a necessidade de busca de construção de uma contra hegemonia e por isso repete como farsa os caminhos do PT.

Se perde a possibilidade de transformação e oxigenação das lutas, das organizações, para ampliar a participação popular e disputar mentes e corações com um neoliberalismo que no Brasil tá muito mais enraizado que em outras experiências, dado que como não se aprofundou tanto quanto na Argentina, por exemplo.

images2Na ânsia de obter o resultado eleitoral, visto como tática única, se acaba sendo absorvido pela hegemonia neoliberal, se é absorvido pelo mesmo viés do neoliberalismo que não é demonizado como antes depois de ser objetivamente confundido com ações “de esquerda” por uma máquina de propaganda do governo petista.

O Neoliberalismo mascarado por políticas de compensação assim se torna “palatável” e ao cair na busca do eleitoralismo puro e simples se opta por não contrapô-lo a partir de uma política de contra hegemonia, se opta por reduzir à critica a ele com pavor de perder um possível voto.

Por isso os governos do PT não são confrontados com uma resistência popular por terem mantido o eixo macroeconômico com ajustes de gestão do capitalismo para incluir programas de, tímida, redistribuição de renda. Por isso os governos do PT tem parte da oposição de esquerda a eles atuando timidamente no que tange à profundidade da crítica ao modelo de gestão do capital levado a cabo por eles.


prostituta01Por isso a busca de “sair do gueto” acaba se confundindo menos com uma busca de construção de um discurso contra hegemônico e mais com uma conquista de uma base social do PT dentro do discurso abraçado hoje pelo PT e pelo convencimento não pela oposição política, mas pela oposição moral, sem no entanto rediscutir estruturalmente a hegemonia neoliberal mantida pelo PT com reformas na forma.


Como o horizonte político de boa parte da esquerda se enraizou no eleitoral, na institucionalidade, a lógica passa a se basear na conquista da institucionalidade, de votos e de penetração eleitoral nos campos que o PT deixou pra trás, só que para isso não se pensa estruturalmente numa estratégica de contra hegemonia, se busca a reprodução para conquistar quem o PT perdeu sem modificar o discurso de forma a clivar a hegemonia ideológica mantida pelo PT.

“Sair do gueto” ai é ir pra galera, seguindo o fluxo, não buscando se opor a ele.


images4Além disso, há um aspecto que não se prende só no discurso de “sair do gueto”, poucas correntes do próprio PSOL e da esquerda pensam para além do eleitoral. Mesmo o PSTU, o mais radical dos partidos antes do limite do delírio do PCO, tem o marco eleitoral como âncora. E não sei se o problema é organização, no sentido de instâncias,etc.

Talvez o problema seja antes de tudo redefinição do papel da esquerda, discutir a fundo isso e mais além, definir de forma clara uma concepção de partido que funciona doa a quem doer no PSOL e de atuação de esquerda pra fora do PSOL.

Sem uma rediscussão profunda inclusive do próprio marxismo enquanto teoria política, repensando e reavaliando opções táticas tradicionalmente levadas a cabo por organizações, partidos e movimentos, especialmente enfatizando uma crítica da relação entre socialismo e estado, socialismo e meio ambiente, socialismo e gênero, socialismo e racismo e socialismo e democracia, a repetição como farsa das falhas anteriores não é um risco pequeno.

images3Sem uma profunda retomada do socialismo como bandeira estratégica e reformulado a partir da radicalização democrática e da reformulação à luz das contribuições teóricas historicamente construídas no plano do marxismo e com o acréscimo da crítica às obras de Lênin, Trotsky, Rosa Luxemburgo levadas a cabo por teóricos que tem em vista as transformações por que passou o mundo desde o início do século XX e em especial pós-queda da URSS, sem isso a tendência é a permanência desta crise na esquerda e a manutenção de uma relação de repetição ad eternum da absorção pelo estado burguês e pelo capital de quem se propôs transformar a realidade.

Não há revolução sem poesia

imagesÀs vezes quando me sento pra escrever sobre política procuro manter uma mediana entre a prática analítica de frieza quase científica com a dimensão emocional da utopia e da liberdade, que dança ali no olho, que mesmo fechado mantém-na dançando.

A dureza do cotidiano não é nem de longe comparável com o que viveram outros tantos militantes que entre ditaduras, Tzares sanguinários, totalitários dirigentes nazi-fascistas ou comunistas, passearam sua analítica utopia mesclada com a esperança voraz na transformação do mundo como meninos que brincam de soltar pipa em verões acalorados das ruas suburbanas do Rio de onde vim.

tumblr_m63n4dQrQP1rq18mto1_500Só que o cotidiano é em si duro na luta que temos de travar contra um sistema e suas vozes repetidas, reproduzidas no homem comum brutalizado pela retirada de sua força de trabalho dia a dia, ano a ano, até que ele em máquina se torna, se torna apenas um voraz aguardador do seu quinhão consumível.

Este cotidiano duro, mesmo mais simples que o de Che, nos afeta e por vezes também nos brutaliza no enfrentamento que vai além da votação, do eleitor, do grêmio, do DCE, do sindicato, da luta antirracista, antifascista, antimachista, anti-homofobia, uma luta e um enfrentamento que vivem em nós, atentos que somos (ou deveríamos ser) ao que nós mesmos reproduzimos.

A felicidade vai desabar sobre os homensNesta batalha constante entre diversas frentes de superação do sistema pro vezes nos olhamos no espelho e nos esquecemos amantes, livres, soltos, vivos e risonhos. Nos tornamos pro vezes frios e cruéis lutadores, velhos guerreiros, soldados de Lênin, amantes da motosserra.

Isso, óbvio, se nos deixarmos esquecer aquele momento em que fomos tocados pela utopia, a utopia que nos fez comunistas, anarquistas, socialistas, libertários.

foto_mat_26868Se lembramos porque lutamos e onde, quando e porque nos tornamos comunistas, a utopia vem e nos preenche e assim relembramos que antes de vencermos é preciso saber como.

Porque não há revolução sem poesia.

PS: Este texto foi inspirado por esta entrevista da Clara Charf

A Aldeia Maracanã, Guarani Kaiowa, Belo monte: Símbolos de uma capitulação

img_161144_andios-contra-demoliaao-da-aldeia-maracanaO que ocorreu ontem na Aldeia Maracanã é simbólico não só da capitulação do Governo Federal e do Partido dos Trabalhadores (que apoiam e participam dos Governo Cabral e Paes) como da profunda raiz racista e produtivista que o lema “Ordem & Progresso” traz consigo nas lábias de antigos reaças e neo-petistas que abraçam a lógica “Ame-o ou deixe-o” típica dos reacionários e um ódio irracional ao que atravanca o avanço do que consideram progresso.

À omissão oficial do Partido dos Trabalhadores e seus parlamentares, vice-prefeito e figuras públicas cariocas se juntou o silêncio de seus próceres Blogueiros Progressistas, seus atores de estimação ou o pior, uma atitude de verborragia direitista de parte dos “líderes” de sua ruidosa e hidrófoba tropa virtual.

317999_534256953265472_1148990033_nEsta atitude não é nova, da mesma forma que silenciaram por longo tempo diante do drama dos Guarani Kaiwoa, que atingia no peito o governo federal, calaram ou repetiram mantras direitistas de cunho racista anti-indígenas que considera que aos povos originários é resguardada a pecha imbecil de “Nômades’ e que vivam nas florestas de tanga coletando, caçando e pescando no caos Belo Monte, ontem a omissão e o silêncio se juntaram a mares de apoiadores do “desenvolvimento que salva 30 milhões da miséria” repetindo o mantra de “índios nômades” ou “índio na cidade é piada’ ou o mais dantesco “índio tem de viver na selva e não em palácio”.

Esta atitude repete mantras racistas que qualificam etnias diferentes, culturas diferentes com pechas totalizantes, reducionistas e não raramente animalizantes. Não é surpresa nenhuma que é uma ação idêntica ao chamamento de negros de macacos, judeus de ratos e índios de “selvagens”, considerados não comparáveis a um animal específico, mas sim um tipo de animal próprio, inumano, mas similar, uma espécie de macaco com nome “índio”. Esta ação também é similar aos rótulos resguardados às minorias, como a lógica de que LGBT é “viado” ou “fresco”, Feminista é “galinha” ou “piranha”. A lógica de redução do diverso é a mesma e o racismo é patente no caso dos indígenas.

aldeia-maracanãEste discurso é representante claro da capitulação da maior experiência da esquerda mundial aos ditames da ordem e da transformação do pragmatismo em modus operandi, representa a opção militante de abdicar da defesa das minorias, dos direitos humanos, da universalização dos direitos civis e do respeito aos povos originários.

O Partido dos Trabalhadores abandonou todas as bandeiras de forma patente e definitiva.

12jan2013---agentes-da-guarda-civil-metropolitana-entraram-em-confronto-com-manifestantes-durante-protesto-contra-o-aumento-da-tarifa-de-onibus-em-maua-na-grande-sao-paulo-neste-sabado-12-a-1358031513843_300x200Paralelo ao endosso da brutalidade que só não foi cometida ontem contra a Aldeia Maracanã pela inteferência de parlamentares e da sociedade civil, o Partido dos Trabalhadores ainda comete em Mauá-SP algo que já simboliza sua capitulação desde episódios semelhantes em Fortaleza e Salvador, mas convém destacar: Lançou aparato repressivo contra manifestantes que lutavam contra o aumento da passagem.

Residents of the Pinheirinho slum walk away from a fire set by other residents resisting police arrival to evict them in Sao Jose dos CamposNeste contexto fica impossível não ver uma hipocrisia oportunista e de indignação seletiva a lembrança de Pinheirinho, que completa um ano do massacre por esses dias , e que teve a máquina de propaganda do Partido dos Trabalhadores voltada, feroz e gritando, para a sagrada denúncia da barbaridade que levou a cabo o Governo Alkmin. Diante do silêncio ou apoio direto ao que ocorre na Aldeia Maracanã fica patente que ao PT não é exatamente cara a resistência ao autoritarismo e a abusos contra os direitos humanos, o que é cara é a oposição aos Tucanos.

pinheirinho-3A Aldeia Maracanã não se compara a Pinheirinho, e Deus queira que não venha a se comparar, mas são ações similares no abuso aos direitos humanos e na truculência do aparato repressivo usado por governos para atender aos interesses do capital. Gritar diante de um e silenciar diante do outro, ou apoiar, que é pior, devido à diferença de escala é ato de vileza indescritível.

pinheirinhoÀ nós e à Aldeia Maracanã cabe apenas a resistência, não só pontual, relacionada a esta luta, mas no todo, para que evitemos que além de trair a luta da esquerda após 30 anos de construção, o PT não ajude também a patrocinar um recuo ainda maior.

Nosso dever é resistir.