Lula: reforço na oposição a Bolsonaro, o neostalinismo e o desnecessário alinhamento automático ao PT.

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A libertação de Lula trouxe novos e velhos desafios à esquerda brasileira, mas em especial à esquerda que se construiu sendo oposição aos governos do PT pela esquerda.

O principal desafio é não cair no alinhamento automático confundindo unidade com uniformidade e construção de combate a Bolsonaro com aliancismo acrítico.

Lula é um óbvio reforço à oposição a Bolsonaro, mas alianças com o PT podem inclusive enfraquecer qualquer construção coletiva de resistência se não for acompanhada com a devida reflexão do ganho político imediato para a transformação de qualquer peso eleitoral, quando essa aproximação trouxer, em saldo organizativo pra uma oposição antifascista brasileira.

Lula é uma voz potente de oposição, mas ao iniciar colocando um respeito supostamente republicano à eleição de Bolsonaro com suas enormes tintas de fraude e disposição para ampliar a desestabilização política do país se fosse derrotado, disposição que permanece, é um tiro no pé.

Primeiro que Bolsonaro foi eleito com base em uma óbvia e documentada manobra de ampliação do golpe de 2016 e que organizou a depredação de reputações, o aprisionamento do primeiro colocado à eleição de 2018 com base em um inquérito no mínimo distorcido, pra não dizer falseado e fraudado. Segundo que nada na elite política e na mídia se dá no respeito à República e às instituições, pelo contrário, a escolha muito difícil de Estadão e companhia permanece em curso e patrocina até debates sobre destroçamento de cláusula pétrea para garantir a prisão de Lula novamente. Terceiro que o país em pleno destroçamento institucional, ambiental, moral, ético e político sob o governo Bolsonaro não tem garantia alguma de aguentar mais um ano que seja sob um governo criminoso e com digitais em vários crimes, não só de responsabilidade, incluindo entre eles suspeitas de participação no feminicídio político de Marielle.

Poderíamos escrever uma tese sobre os problemas da escolha de Lula, inciando pela tolice de achar que ele não partindo pra defesa da remoção de Bolsonaro seria tratado como algo palatável por quem quer que seja na mídia e elite, tanto que não foi, ma só principal é enxergar o motivo da fala, que nunca foi o cuidado dom a imagem, mas o apelo à conciliação, de novo.

Em um vinte de novembro que foi precedido por um deputado do PSL quebrando uma placa com um cartum que denunciada o genocídio do povo preto e outro do mesmo partido dizendo que negros são mais assassinados pela polícia porque tem mais criminosos entre eles, ambos contando com a proverbial covardia de Rodrigo Maia e das instituições, é sintomático deixar claro que a opção de Lula e do PT, que desde o início do ano explicitaram que tem como objetivo ver Bolsonaro sangrar, é um erro, como tantos outros.

Então o reforço na oposição o fogo cerrado nas políticas de paulo Guedes é um acerto, nos impõe a necessária crítica sobre até que ponto esse reforço se constitui de “um camisa dez em campo” como infantilmente declarou o presidente do PSOL em entrevista ao UOL.

A não ser que Juliano Medeiros esteja falando de um camisa dez estilo Ganso em um time do Guardiola, estamos cometendo um equívoco que se fosse pessoal estaria de boa, mas me parece ser coletivo, vide o anúncio de Freixo de que seria o candidato à prefeitura do RJ com o apoio do PT, sem consultar suas bases.

Freixo e Juliano tem todo direito de explicitar suas preferências, mas com o cuidado de se lembrarem que ainda fazem parte de um partido que não decidiu ainda publicamente se os vai acompanhar ou não, especialmente porque a não ser que eles entendam sua militância como meros entregadores de panfleto, ainda se precisam fazer congresso e conferências para decidir o que eles querem impor como fato consumado.

A questão mor é que temos problemas a resolver com o PT que perpassam por mais do que a autocrítica sobre a corrupção que jornalões exigem do partido. Isos lá é problema deles, PT e jornais.

Nosso problema é sobre as autocríticas necessárias às omissões e ações do partido com relação às questões ambientais, sobre direitos indígenas quilombolas, sobre a questão de gênero, sobre os direitos LGBT e de transgêneros; sobre o empoderamento de Bolsonaro, Feliciano e o PSC na CDHM; sobre o uso de uma militância digital pra assassinar reputações (inclusive as de Freixo e Jean) indo da homofobia ao racismo que até o surgimento das milícias bolsonaristas eram as mais rápidas do mercado.

E mais precisamente hoje, sobre o alinhamento de Camilo e Rui Costa no Ceará ena Bahia com o discurso da necropolítica. Somos oposição ao PT e parte importante do país, fazemos como?

E no RJ, o PT que foi base fundadora e mantenedora de Cabral e cia até os 49 do segundo tempo, com Quaquá e Benedita sustentando essa graciosidade, vai ser solenemente empoderado com o esforço coletivo do PSOL carioca em ir na contramão dos amores do PT com Cabral e Paes, sendo escorraçado, chamado de nazifascista por blogueiros a soldo do petismo?

Não é mágoa de caboclo não, é entender como a gente explica na ponta o atropelo da cúpula.

Em Porto Alegre vamos explicar pra nossa própria militância e base que adoraremos receber o apoio do PT de Tarso Genro que persegui companheiros nossos com a brigada militar até suas casas em 2013?

Vamos achar bonito em Pelotas sairmos abraçados com o PT que com Marcola é sidekick, quase um Robin desnutrido, de um PSDB abraçado ao Bolsonarismo? Vamos achar que Marroni patrocinador de Marcola, é a última bolacha do pacote?

Poderia listar aqui onde começam os problemas e terminam as soluções por horas a fio, mas ficou entendido como é um problema a aliança acrítica. E aqui entra a motivação do debate sobre neostalinismo neste texto.

A ideia de uma causa soberana que atropela todas as outras, essa centralização decisória censória e silenciadora, de cima pra baixo à direita de quem está na esquerda, é a fuça do stalinismo redivivo pela conjuntura, mas vivente desde que Dirceu e cia resolveram perder na política interna para eleger o presidente da república.

Porque é a cara do stalinismo de galinheiro o revisionismo histórico pra vender uma narrativa, vai de quem trata a Coreia do Norte coof arol do socialismo e nega a existência do Massacre da Praça da Paz celestial como quem trata Lula como esquerda radical e revolucionária e produtor de um Estado de bem-estar social que ele nem implementou e nem avançou para além do mínimo, a ponto de permitir que TODAS as suas medidas positivas fossem revertidas em menos de dez anos.

Sim, o governo Lula foi o melhor da história do país, especialmente por ter sido um democrata em uma democracia, mas esteve aquém, mas muito aquém de bom sob o ponto de vista da esquerda.

Ah, mas não se governa sem ceder ao status quo? Esse é o agá revisionista mais escroto de todos os tempos, porque era possível discutir e dialogar com MDB e outras forças democratas sem cooptar e absorver a direita no interior do PT e empoderá-la nos estados e municípios. Vide a queda de participação do PT na câmara a cada eleição, e perda também de governos de estado e municípios também a cada eleição.

E não, não é coincidência, quando você opta por fortalecer menos sua base orgânica que caciques de oligarquias antigas do país pra assegurar uma base artificial que na primeira crise te passará a perna é exatamente o que acontece.

E foi o que aconteceu em 2016, porque o limite da conciliação, avisado pelo menos desde 2006 pelo PSOL e demais membros da esquerda, ia chegar, chegou e era disso que nosso pedido de autocrítica deveria falar aqui.

Corrupção? Efeito colateral.

O neostalinismo se reforça em um ambiente onde a louvação sebastianista ao ídolo supera a necessária análise da forte figura pública e a teoria perde espaço pra hagiografia (estudo da história de santos sob o ponto de vista da fé).

Lula é um ser controverso, mas é o nosso ser controverso, com isso ele é de suma utilidade como força de oposição ao fascismo e um ambiente em que a unidade NA LUTA ANTIFASCISTA se faz necessária, mas isso não pode ser transformado de forma acrítica em um processo de alianças eleitorais, especialmente em um quadro de diversidade orgânica e organizacional.

Nós temos problemas sérios de divergências programáticas com o PCdoB e o PT e não são na perfumaria.

O PCdoB votou a favor do acordo EUA-Brasil de uso da base de alcântara, atacando direitos de quilombolas e indígenas, nós somos frontalmente contra e nos alinhamos com a luta dos povos originários.

O PT tem em seus governos de estado um alinhamento com o discurso da necropolítica na segurança pública, vide Rui Costa e policiais assassinos tratados como “artilheiros em frente ao gol” depois de uma chacina de gente preta.

Em 2018 o PT-RJ não apenas lançou Márcia Tiburi à governadora do estado, como além de a abandonar aos ventos fortes da canalhice ainda o fez por quadros seus apoiarem na surdina Eduardo Paes, do DEM. Quaquá ainda fez a gracinha de dizer que apoiaria o PSOL se o candidato fosse Freixo, como se ele na posição de destruidor do partido dos trabalhadores no RJ tivesse em posição de exigir qualquer cosia do partido de esquerda que mais cresceu no estado. O PT ainda usou de um artifício de confundir Chico Alencar com Lindbergh Farias como se fosse uma chapa que ajudou a eleger Flávio Bolsonaro e Arolde oliveira. E agente nem precisa falar aqui da participação do PT no empoderamento de milicianos com a filiação dos Irmãos Babu a partir da militância ligada à Benedita da Silva.

Ter em mente que onde for possível é interessante a unidade das lutas também se ruma unidade eleitoral tem um oceano de distância de tratar Lula como camisa dez de um tine que joga com uma organização ofensiva que parte da ponta esquerda e não do centro.

Lula pode ser um Gérson, jogando no meio cadenciando o jogo, mas o PSOL joga como Canhoteiro, avançando acelerado pela esquerda e driblando até chegar no gol, nosso jogo é rápido, de transição ofensiva, e não um jogo que devagar tenta envolver o adversário até a bola entrar na rede, esse necessário envolvendo a direita.

Precisamos de menos recursos pirotécnicos pra inventar uma unidade que não foi construída de baixo pra cima, sob pena de em caso de vitória ela ser de Pirro, e mais de um debate aberto, com menos culto à personalidade e mais programa, com menos revisionismo histórico e mais análise, com menos preocupação com a perfumaria da mitologia e mais com a compreensão histórica da conjuntura.

Um debate aberto sobre a unidade da esquerda é fundamental, mas enquanto não envolver o conjunto da militância construindo a resistência para além do voto e estabelecendo pontos de ação na prática cotidiana para além das campanhas eleitorais, o que estamos vendo é a redução da esquerda a um fã clube de figuras públicas. E isso não dura.

A conjuntura de hoje exige que enfrentemos duras batalhas, mas elas precisam partir da rua pro voto.

Não temos garantia alguma de que as eleições serão limpas, também precisamos enfrentar demandas atuais e concretas de resistência que são impostas pela conjuntura, desde o genocídio do povo preto à devastação ambiental, e precisamos fazer dessa luta uma produtora de saldo organizativo.

Agora, neste momento, estamos atrasados e Lula não vai ajudar nessa construção, pois não somos do PT.

O apoio a Freixo é o movimento óbvio, mas apoios à Sâmia ou a Fernanda Melchiona não são tão óbvios e podem não vir a ocorrer, mesmo nem PT nem o PCdoB terem em SP candidato competitivo e a Manuela ser competitiva, mas tendo uma base orgânica de construção menor que a do PSOL em PoA.

No RJ é mole ter “unidade” em torno de Freixo, só os oportunistas que buscavam cargos no suposto governo Paes ignoraram isso em 2018, menos interessados em construir resistência que poupança, mas que unidade é essa? Que custo terá?

Em Pelotas a presença do Marroni no palanque de Lula quando ele siau da prisão nos envolve em um debate se queremos estar do lado de quem foi franco patrocinador de uma política covarde de oposição ao PSDB na cidade.

Em uma cidade onde o único nome competitivo é o PSOL, o partido, vamos fazer policial washing no Partido dos Trabalhadores que desde o começo diz que tirar Bolsonaro é ruim porque nos daria Mourão de presidente?

O PSOL precisa discutir claramente e de baixo pra cima suas práticas e táticas relacionadas à sua ideia de unidade. Porque senão vamos de camisa dez das antigas em um time que precisa jogar em velocidade e pela esquerda.

Das Revoluções e dos ventos de golpe

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Há algum tempo me incomodam as falas que misturam o ser revolucionário a um tipo ideal de produtor de revoluções. Da mesma forma as Cassandras do mal maior, dos ventos devastadores das tragédias golpistas, cansam o observador com suas proclamas diárias da volta do Planeta dos Macacos.

Porque via de regra o que une os grupos é a tomada da História como um terreno dado, já lido, e cuja função eterna é produzir um mito do eterno retorno, como se a humanidade fosse uma espécie de Sísifo que no terreno da História se movesse apenas para carregar a pesada pedra da conjuntura até o topo para vê-la cair.

As revoluções nunca me parecerem produzíveis ou reproduzíveis de acordo com fórmulas estritas. E aqui tem uma não sistemática junção de leituras diversas da história e da teoria política pela esquerda.

De Marx a Thompson, de Ginzburg a Bookchin, de Natalie Davis a Michael Lowy, de Giovanni Levi a Daniel Bensaid, de Lênin a Trotsky, nunca consegui ler em nenhum dos que me influenciaram alguma forma de entendimento da revolução como uma obra passível de ser produzida, mas entendi-a como uma onda na qual quem estiver mais acurado na observação tende a possuir o caminho para liderar a navegação nela até o quebra-mar.

Claro, o problema pode ser o leitor, mas é um caminho de análise que sinceramente não consegue entender o tipo de dogmatismo que cita de cabeça trechos inteiros de Lênin, Trotsky e Marx e se recusa a analisar o processo dialético que faz com que seja impossível que a História se repita.

Não adianta citar o 18 Brumário de Luiz Bonaparte de Marx e depois ignorar o sentido da afirmação dele da História se repetir como farsa, ou seja, como uma falsificação histórica de um outro fato com fins simbólicos ou teatrais.

Neste texto ele constrói o significado de bonapartismo que nos leva a Bolsonaros e que tais como elementos que surfam em uma onda de popularidade organizada com específicos trejeitos de tragicomédia ou melodrama, e que tendem a tentar uma aproximação com o aspecto mitológico das relações políticas, mas sem jamais ser exatamente alguém do tamanho do mito que tentam reproduzir.

As revoluções, assim, são uma complexa junção de processos históricos que confluem em um tipo de transformação social, do estado às práticas cotidianas, que mudam de maneira global a sociedade em que ocorrem.

Essa junção de processos, pelas diversidades conjunturais e contextuais em que ocorrem, não tem jamais a mesma face em países, cidades e contextos diferentes. Sequer tem como condição sinequanon a vitória do movimento que a liderar.

Os elementos que as tornam possíveis, e que as definem, são as tempestades perfeitas que as fazem ocorrer entre a mobilização de uma ou mais classes contra o poder estabelecido. A explosão do processo revolucionário em si, as condições históricas que fazem com que as movimentações contra o sistema ganhem as ruas e as organizações dos enfrentamentos que a fazem tomar uma face transformadora visível são os elementos que fazem com que a tempestade perfeita exista e que a definem como portadora de um legado de processos anteriores, como a tomada de consciência por uma classe a partir do compartilhamento de experiências, a paulatina chegada de experiências comuns de mobilização, as transformações de valores que fazem com que a população se entenda como partícipe de uma determinada forma de ver e sentir o mundo.

Um exemplo? As ocupações de escolas, o crescimento da auto identificação populacional como negra, a maior aceitação da população LGBT(a partir de sua luta por visibilidade e direitos), o crescimento da identidade feminista entre mulheres pobres, a consciência de uma maioria negra de mulheres liderando famílias pobres, a maior presença nas universidades de negros e pobres, quase pretos de tão pobres e a identificação do sistema como inimigo (Para o mal e para o bem) são, todos, processos que fazem com que a classe operária, ou as classes operárias (incluindo a pequena burguesia, e sim isso é uma provocação), paulatinamente tomem para si o dever de fazer um estado que as inclua.

O próprio crescimento da extrema-direita como reação aos processos que incluem uma maior identificação de negros, LGBT, mulheres, trans,etc, como atores protagonistas de uma transformação do Brasil, e não só, é um elemento que indica o tamanho da transformação em curso.

Nesse sentido se encaixam as leituras sobre a conjuntura atual onde Jair Bolsonaro se coloca como impedido de governar e onde o congresso se impõe sobre ele barrando seus avanços, ao mesmo tempo em que as ruas demonstram que os limites da reação conservadora chegaram.

Porque se há erros na leitura das manifestações como vitórias exclusivas da esquerda, não há equívocos em tê-las como uma vitória de um tipo de percepção democrática que abre caminho para, ai sim, um avanço da esquerda sobre consciências que se perceberam compartilhando um terreno comum de experiências com quem antes era visto como inimigo.

Ao mesmo tempo outros indício como a movimentação do congresso, dos tribunais, ministério público, a guerra aberta no PSL, demonstram que mesmo no campo da direita há uma percepção dos limites do bonapartismo de Bolsonaro.

Essa movimentação não é fã da esquerda, e abre caminho para outra análise sobre a conjuntura futura, mas não é, e nem pode ser, insensível às ruas.

A trajetória do texto da Revolução á conjuntura não é à toa e é intencionalmente compartilhadora de uma noção geral para elementos conjunturais.

Estou dizendo com isso que há uma contextualização histórica revolucionária? Não, mas que existem elementos que podem vir a se tornar uma revolução, inclusive com as digitais das táticas, a meu ver equivocadas, do governo em confrontar mais do que o sistema, mas as ruas, não negociando sequer com quem lhes tem simpatia e negociava participação no projeto político mais que as filigranas do erário.

Não se pode tentar um golpe organizando um confronto aberto com as forças armadas como Bolsonaro faz e dilapidando o capital eleitoral com meses de inatividade e incompetência para apenas em Maio lançar mão do chamado às ruas para a resistência.

Bolsonaro aqui comete os mesmos erros do PT na reação ao impeachment em 2016. Lançaram mão de uma tentativa de mobilização nas ruas quando era tarde demais e quando perderam até a simpatia de quem poderia estar com eles na defesa do sistema porque construíram um governo que traiu as bases que os elegeu.

Dilma ainda tinha, via PT, uma base social forte que manteve um núcleo de resistência que quase atrapalhou os planos da elite aventureira e do Bolsonarismo que surfou na onda falsificada que culminou em sua vitória. Qual a base social do Bolsonarismo que o defenderá nas ruas?

Se nem a base social do PT foi suficiente para segurar as pontas de Dilma, terá Bolsonaro uma base que nas ruas tenha tamanho para impedir sua derrubada por um congresso que desistiu do governo e negocia direto com guedes, para a sobrevivência deste?

O teste dia 26 de Maio pode ser mais um insuflar das resistências ao governo Bolsonaro na dilapidação da educação e que marcaram atos para dia 30 de Maio, além de ser uma demonstração do real tamanho do inimigo para as forças que já estão abandonando o barco (De militares ao centrão, passando por MBL, Vem pra rua, Novo,etc).

As conjunturas são diferentes, mas os caminhos comparativos entre as inabilidades de Jânio, Collor, Dilma e Bolsonaro transformam a conjuntura atual na tempestade perfeita contra o Bolsonarismo e sequer chegamos em Flávio Bolsonaro e sua organização criminosa no gabinete (O termo escolhido pelo MP-RJ não foi à toa).

E as revoluções? Na conjuntura atual o que se impõe como dado é que os quadros são de paulatino compartilhamento de experiências nas classes trabalhadoras, de identificação de elementos caros à ela (educação e saúde) com um salto organizativo e de percepção do peso destes campos na economia, na cultura, na vida cotidiana.

Isso gera uma percepção do público (roubando um dado de observação do companheiro Célio da Comuna e do PSOL de São Leopoldo) não só nova, como identificável e, mais ainda, disputável.

A culminação narrativa do uber liberalismo como hegemonia cultural a partir das lógicas do empreendedorismo e redução do estado esbarra numa resistência firme e frontal pela primeira vez em, ouso dizer, décadas.

As ruas estão dizendo: Não mexam nas estruturas do estado, elas pesam pro meu cotidiano!

Esta estrutura cultural no entorno das mobilizações e dos atos são um dos elementos fundamentais para a compreensão de qualquer revolução.

As revoluções silenciosas nos comportamentos, nas construções culturais e percepções pela experiência tendem a se tornar explosivas quando passam pro passo seguinte das mobilizações, que é a ocupação das ruas e da política.

E neste sentido o caminho escolhido por Bolsonaro expande o cenário político para a conflagração, não necessariamente violenta, de percepções políticas. Põe pra jogo, como a gíria carioca, uma disputa política outrora dada como livre da esquerda pelo falecimento desta.

A esquerda diria que as noticias sobre sua morte foram manifestamente exageradas.

Não que a esquerda seja a vitoriosa nas mobilizações, mas pelo menos é uma das vitoriosas e se posiciona como elemento disputante do compartilhamento de experiências que explodiu no 15M.

A estética do 15M foi de esquerda, os gritos idem, a defesa do público também. Mas isso não torna nada disso como um ganho definitivo se a esquerda não se reaglutinar de forma radicalmente democrática para receber os novos participantes dos atos que manifestadamente resistem a formatos avesso à oxigenação das ruas.

O mesmo pode-se dizer do conclamação às ruas por Bolsonaro. Seu governo foi flagrantemente contrário ao que defendeu em campanha.

A liberação de armas e outras promessas de campanha não foram nada diante da ausência de uma postura que pelo menos uniria a direita, que respeitaria militares, que faria uma luta para mudar o país. O que se viu, todos viram, foi um caos movido por recalque e que atingiu as chances de crescimento social de pobres, as chances de ganho da elite, a própria ideia de corpo unido dos militares.

E isso diante de uma conjuntura de crise econômica de aumento do desemprego e do desespero, do trabalhador ao pequeno comerciante, que ainda viu a faculdade do seu filho atingida no coração, e seu filho sendo chamado de idiota útil.

Seria um contrassenso entender as resistências do congresso ao governo como dadas apenas pela fome de propina, seria uma negação da própria defesa pela esquerda da política como algo que via além do ganho pequeno e menor.

A resistência veio pela desconfiança de que o governo e seus chefes não iriam compartilhar nada do poder com as demais forças da própria direita. Que inclusive não havia, e não há, plano algum de nada além de destruir tudo o que foi organizado de 1988 em diante. E essa destruição significa a destruição de elementos fundamentais também para a própria elite que os sustenta.

A irresponsabilidade das apostas em Bolsonaro, de parte da elite econômica aos militares, se baseava na possibilidade de doma dele pelos grupamentos da extrema-direita com alguma ideia na cabeça. Não deu.

Primeiro que Bolsonaro e filhos tem uma visão imperial da presidência; segundo que os planos deles nunca foram o de viver na democracia, mas destruí-la qual Orban (Isso vem dos escritos do Celso Barros na Folha com os quais concordo); terceiro que o grupo, que é tido como olavista (à revelia do próprio oportunismo de Olavo que já pulou do barco),tem uma ideia que acreditam real que são majoritários na sociedade, embora tudo, pesquisas, votos e ruas, demonstrem o contrário.

Somem a isso a incompetência geral do governo em governar, pela ausência de qualquer noção a respeito do que significa a máquina pública, e que gerou uma enorme resistência da burocracia de estado, algo que de 1988 para cá ganhou uma faceta própria que nunca se viu na República.

Bolsonaro assim chama as ruas para defendê-lo tendo como base uma minoria com um tom flagrantemente golpista, algo que ele projeta sem uma base real, e que não teria, segundo jornalistas com proximidade com o mundo militar, apoio das casernas, ressentidas pelo confronto aberto e insuflado pelo presidente contra militares da ativa e da reserva que consideram líderes e que também atingem um corporativismo forjado há pelo menos cento e cinquenta anos.

A base de Bolsonaro voltou ao normal e ele se recusa a acreditar, perdido no mundo pessoal em que é fundamental gastar mundos e fundos para receber um prêmio imaginário numa cidade do Texas que não o acolheu, apenas para responder a um prefeito democrata de Nova York e à zoeira das redes sociais que ele ainda acha que domina.

Ao chamar sua defesa no dia 26, quatro dias antes da mobilização chamada antes por uma série de organizações e pela esquerda, Bolsonaro se obriga a ter uma maioria nas ruas que tende a não ter, diante do fracasso numérico das últimas manifestações chamadas por eles e pelo flagrante racha no que o elegeu (Do MBL ao Lobão). E se obriga numa aposta em que se perder só lhe resta a renúncia, saída honrosa, ou apostar a fundo contra um congresso que não vai demorar muito tempo em aceitar pedidos de impeachment.

E as revoluções? Bem, elas se produzem em processos complexos de danças e contra danças, pesos e contrapesos.

1917 só foi possível por 1905. 2013 produziu dos ocupa escola à ascensão de uma direita das ruas. 2019 aponta para uma nova faceta de processos mais complexos e que envolvem uma dinâmica de consolidação de transformações culturais de longo prazo.

Quando índios e padres e bichas, negros e mulheres e adolescentes fazem o carnaval é preciso entender que o que se contrapõe a eles são os homens exercendo seus podres poderes.

Invariavelmente nessa dança as bases carnavalescas se impõem.

Imprensa, democracia e uma crítica ao antipetismo liberal, Tabata Amaral e Malu Gaspar.

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Na última semana vi ótimos jornalistas liberais apoiando golpe na Venezuela porque “Era contra um ditador” e destilando um ódio mal disfarçado a Lula que não destilam em metade ao Bolsonaro, que dizem combater.

Não existe apoio digno a golpe, não existe, mesmo contra ditadores.

A diferença entre golpe e revolução é farta na literatura, basta ler o dicionário de política de Bobbio e se entende a enorme diferença, e o Norberto trata Revolução como um golpe em proporções populacionais de engajamento com transformação estrutural.

Um Putsch, que foi o que tentaram fazer contra a Venezuela, é um atentado á democracia, mesmo uma democracia autoritária, como via de regra desde 2008 todas são, como a de Maduro.

Se Maduro é ditador, Alckmin, Dilma, Tarso, Cabral, e agora Witzel, Bolsonaro e Moro também são.

Perseguiram ativistas, processaram gente por portar Pinho sol, atiraram com bala de borracha e até armamento letal em ativistas, matam a população negra a rodo, em uma escala genocida, usam snipers para matar pretos pobres, estimulam a morte de indígenas e sem terra, atuam para permitir o armamento de milícias rurais para exterminar sem terra e liberar o morticínio de pretos e pobres por policiais,e por ai vai.

Então cês vão me desculpar, mas essa linha lógica de apoiar com fome um golpe de estado patrocinado pelos EUA em nome da “democracia” porque “Maduro é ditador” é um equivoco, pra ser gentil.

Eu apoio Revoluções? Apoio. Revoluções são golpes? Em muitos sentidos? Sim.
A diferença é que ou são apoiados por um levante populacional que ou o precede ou o segue ou são apenas golpes de estado.

Revoluções que o pais passou, se passou, ou foi o mais próximo disso? A Independência, talvez a Abolição ou a Revolução de 1930. que foram precedidas de longos embates, armados inclusive, e transformaram a sociedade como um todo e a própria estrutura do poder, inserindo novos elementos populacionais no cenário político e mexendo com as estruturas sócio-econômicas e culturais, mas isso é papo pra longas horas de debate teórico.

Mas apoiar golpe apenas para derrubar um ditador que se luta contra,ignorando a auto-determinação do povo Venezuelano, que esse ditador foi eleito, e que nenhum dado faz com que se veja um levante popular concreto contra ele, e isso mesmo em estados onde ele tem menos poder e cujo alinhamento não é a Maduro nem a Guaidó, mas a um chavismo anterior a Maduro?

É impressionante como alguns jornalistas trataram a entrevista do Lula com oito Vezes mais dureza do que o dia a dia de Bolsonaro. Bolsonaro é alvo de “ironias finas” e críticas até duras, mas aquém do ódio destilado contra Lula.

Lula precisa fazer penitência, autocrítica, plantar bananeiras recitando a Salve Rainha ajoelhado no milho enquanto se chicoteia, mas a mesma imprensa que faz falsa simetria com “os dois lados do radicalismo político” pra vender Tabatas Amarais se recusa a fazer uma mínima versão disso que chamam de auto-crítica.

Malu Gaspar diz que as críticas da esquerda à Tabata Amaral são porque “ela não é esquerda suficiente”, com altas doses de ironias. Que grande democrata e intelectual temos que sequer consegue conceber que existem divergências mais amplas entre o que eles, da imprensa, chamam de esquerda, não?

Aliás, essa leitura de ser “esquerda” pra parte da imprensa adaptou uma versão estadunidense da divisão política ou é impressão minha?

Sério que entender as proximidades e distâncias com a Tabata Amaral, por ela ser uma liberal e não uma socialista ou comunista ou parte do grupo ideológico tradicional da esquerda, em síntese anticapitalista, é apenas julgá-la “não sendo esquerda suficiente”? Isso é o melhor que uma jornalista especializada em política pode fazer?

Não sei em que ponto faltou leitura, pesquisa ou apenas uma clareza na percepção e exposição do próprio alinhamento ideológico. pra ser gentil.

Não é problema nenhum ser liberal, Malu e a Tabata tem muitos pontos em convergência com a esquerda tradicional (anticapitalista, socialista e comunista) e pontos de divergências centrais, reconhecê-los com respeito é um bom caminho, o desprezo ao que não entende, e nem tenta entender, é um péssimo caminho pra quem prega uma suposta unidade que não pratica.

Aliás, é fundamental que liberais dignos do nome, como a Tabata Amaral, a Malu Gaspar e outros, se assumam como tal, que assumam a defesa do liberalismo na linha Democrata moderada estadunidense no Brasil, cuja direita dificilmente é melhor que um Republicano anti aborto e que via de regra é composta de um Tea Party piorado enquanto brandem um suposto programa “liberal”. Até o conservadorismo no Brasil fede a um integralismo verde-oliva, e é francamente reacionário.

Então é sim bem vinda a Tabata e outros com seu liberalismo socialmente engajado, mas um liberalismo, pró-capitalismo e francamente pouco apegado à percepção do geral como divergência e não como “ideias que não tem mais lugar”. Agir como se a ideologia liberal pré-Marx fosse mais atualizada com seu misticismo teológico da mão invisível do mercado, mas com preocupações sociais, não fosse um socialismo utópico aplicado à contemporaneidade do que uma concepção teórica e política, com enorme base filosófica (Epicuro e Hegel pra começar), organizada por Marx e que é constantemente repensada, debatida, discutida, dentro e fora da academia, inclusive por liberais, por outros ramos da filosofia e da ciência política.

Aliás, ideias tem data de validade? Se tivessem o perfil socrático de Paulo Freire não existiria.

É fundamental que liberais exista,mas seria de bom tom que respeitassem a divergência, inclusive a crítica aos limites de sue alinhamento à esquerda, em vez de ridicularizarem o que os expõe como o que são.

E nãos e iludam, parte do PSOL, PT, PSB,etc são compostas por liberais como a Tabata, se você votou nestes partidos pode ter votado em alguém com u perfil próximo si, não precisa de certificado pra se dizer de esquerda, viu?

A REDE tem esse perfil, programático inclusive.

O que tem que ver é esse antipetismo que transforma o PT no diabo fugindo da cruz e que se torna muito mal disfarçado no discurso, no sentido da análise de discurso, de parte da imprensa, especialmente a que compõe a falsa simetria.

Esse antipetismo fez com que parte dos apoiadores de Marina em 2014, uma liberal com origem na esquerda, tenha apoiado Bolsonaro em 2018 , Abraham Weintraub entre eles.

Inclusive a mesma imprensa faz forfait pra se lembrar exatamente o que fez durante as eleições em nome de uma suposta defesa da democracia, hoje, quando ela precisa ser defendida concretamente, não mexe metade da palha que os demais membros da sociedade mexem.

A democracia quando sob ameaça recebe da imprensa o tratamento que muitos críticos de cinema dão à arte, uma odiosa observação não participante e supostamente crítica.
Precisamos de mais que intérpretes do real, viu? E sim, é um sentido marxista.

Amigos, a crítica ou é acompanhada da ação ou é apenas cagação de regra omissa.

E sigam o exemplo do Jânio de Freitas, do Gaspari, que são ácidos contra todos os governos, sem se omitirem na defesa REAL da democracia.

Não precisamos sequer concordar ideologicamente com eles para sabermos disso, como não precisamos achar Mino Carta o supra sumo da pureza da esquerda para respeitar sua luta em defesa CONCRETA da democracia, como idem o José Roberto Toledo, entre outros.

Mas é preciso sabermos com quem estamos lutando a defender a democracia.

Nós, que fizemos oposição ao PT anos a fio pela esquerda, nunca vimos muitos destes liberais nas nossas trincheiras. É sempre bom termos novidades, mas é preciso que lembremos sim quem esteve onde e quando.

Quem ocupa esta trincheira também ocupa a defesa de golpes contra o que consideram ditadores?

Quem ocupa essa fronteira também ocupa a resistência contra o que os jornais que ajudaram a eleger com falsa simetria e é mais próximo de Maduro do que eles mesmos assumem? Abro mão.

Essa defesa de golpes não é a da democracia.