PODEMOS conversar? Sobre Burocratização da esquerda e Carangos & Motocas

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Outro dia falando de PODEMOS, Syriza, PSOL,PT um amigo me chamou de Gilson “Robert Michels” Júnior por abordar a burocratização destes partidos e da ausência de investigação por intelectuais socialistas e marxistas a respeito dessa já comum presença da burocratização na vida da esquerda partidária.

Não li Michels e fico feliz ao saber de sua existência, porque assim o que eu coloco não fica sem nenhuma base teórica prévia e pode ajudar a intelectuais realmente envolvidos nas transformações sociais a investigar os processos que levam movimentos que nascem libertários a fazer o que PODEMOS e Syriza (E PT e PSOL,etc) fizeram a si mesmos e aos movimentos que os apoiam ao ocupar o poder ou mesmo antes disso.

Prometo um dia ler Michels, mas a coisa é tão óbvia que garanto que não precisa exatamente ser um brilhante intelectual ou ter a carga de leitura de um bibliófilo para enxergar que há um elemento em comum em todas as capitulações da esquerda partidária ao capital, do SPD alemão ao PODEMOS.

Michels pode fornecer elementos técnicos para essa observação, corram lá pra lê-lo! Mas com quarenta anos de vida e alguma leitura já dá pra perceber que há algo de muito errado na estrutura dos partidos da esquerda socialista a no poder transformarem-se em agentes do capitalismo e gerentes implacáveis do estado, traduzindo tudo isso em planos de austeridade econômica, repressão policial,etc..

Dói perceber? Opa, se dói. Em cerca de vinte anos da minha pobre vida bati cabeça tentando justificar cada recuo em nome de um avanço posterior que jamais vinha. Justificava isso com “a conjuntura não ajuda” ou outra desculpa à mão.

É preciso questionar o que leva a alguém viver no eterno trabalho de Sísifo de “reconstruir o projeto” .

Serião que ninguém nota que há sempre uma parte de partidos lutando para “resgatar o projeto original” contra outro que tenta dilapidá-lo? Não notam a coincidência? Não comparam isso com trocentas ações similares história afora?

Em toda a diversidade dos processos históricos que mandaram pro caralho experiências da esquerda partidária, a participação no estado é o único ponto em comum a PT, Syriza,etc e tals (PSOL,PSTU inclusive), coincidência?

Outros ainda fazem isso, assinam manifestos buscando “recuperar bandeiras originais” ou “alertar os companheiros do equívoco”, todos tentam “resgatar” algo da esquerda partidária que caiu em desuso por, ops, burocratização e participação junto ao estado.. Só que parece suspensão da descrença.

Tudo isso parece suspensão da descrença diante de uma repetição ad infinitum de uma metodologia de ação constituída na construção de ferramentas de ocupação do estado, de gerência dele, de transformação do Estado no objeto fim de todo trabalho político partidário,ao contrário do concreto reconhecimento do empoderamento popular a partir da própria população organizada.

Brada-se “a revolução será realizada pelas mãos do próprio proletariado”, mas vive-se a construir sua substituição como agente das transformações a partir da fundamentação de figuras públicas e representações que paulatinamente transformarão o proletariado, o povo, em plateia de supostas transformações que ao fim e ao cabo dão quase sempre (E isso pra ser fofo) em traição.

Do SPD alemão nos anos 1930 ao PODEMOS em 2015,passando por Syriza, PT, PSOL, PSTU, PCB (Especialmente dos anos 1950 aos anos 1980) todos buscavam em suas teses a construção de revoluções e se propunham guias genias dos povos. Foram?

Sabe a definição de loucura do Einstein? É “fazer a mesma coisa esperando resultados diferentes”. Pois é, então podemos definir estas estruturas partidárias da esquerda socialista como monomania?

Há todo um arcabouço teórico e prático que permite investigação a respeito de estruturas burocráticas e como se dá o processo de burocratização de partidos socialistas, assim como tem intelectual a dar com o pau em todos os partidos socialistas existentes no planeta. Não é possível que com tudo isso não se consiga buscar, teórica e praticamente, transformação destes processos ou chegar à alguma conclusão sobre os motivos estruturais dos processos que dão em traição.

Será que os intelectuais que produzem descobertas fundamentais sobre Marx e Ecologia ou sobre a necessária defesa de uma luta cotidiana contra o aquecimento global e os combustíveis fósseis não com seguem enxergar elementos de burocratização estrutural nos partidos socialistas? Ligam o foda-se ou a suspensão da descrença?

E não me venham dizer que a ocupação do estado é fundamental para as transformações, pois não é. Abundam exemplos de articulação popular externamente ao Estado e que funcionam muito mais nas transformações concretas que mandatos,governos,etc.

E tem pra todos os gostos; De Oaxaca ao exército Zapatista de libertação nacional; do Curdistão Livre do PKK e do YPG ao Municipalismo Libertário da esquerda estadunidense; Das Okupas anarquistas do Rio e SP aos “Squats” Europeus; Dos Conselhos Municipais ocupados por cidadãos a associações de moradores das periferias. Nem falei das ONGs, perfil liberal de participação extra estado e que tem lá sua funcionalidade.

Então, PODEMOS conversar?

Porque é preciso bundinha na cadeira e diálogo franco, pesquisa, debate prático e teórico pra resolver um problema histórico,estrutural e que parece destino, mas é insanidade mesmo.

Até porque pra população alimentar com fé e energia estruturas partidárias é parecido com alimentar Leão com Brócolis. No fim ele acorda e come a mão que o alimenta.


É um mecanismo maluco que torna o funcionamento da esquerda marxista partidária em relação a movimentos e figuras públicas no mundo todo, maluco, mas é até fácil de organizar num esquema:

  1. Se tem a sensibilidade de entender demandas sociais;

  2. Parte dos partidos atuam nestas demandas;

  3. Organizam-se coletivos para atuar nas demandas populares, nas lutas;

  4. Coletivos horizontais com democracia interna atuam e fortalecem as lutas;

  5. Membros eloquentes surgem dos coletivos, das lutas ou são deslocados para atuar nelas;

  6. Militantes da esquerda partidária começam a atuar no movimento para fortalecer o movimento ancorando isso na alimentação da figura pública construída no movimento;

  7. A figura pública se “torna maior” que a luta,os coletivos,etc, secundarizando a massa militante do próprio partido como efeito da própria prática e dos demais movimentos como efeito de ação coercitiva levada a cabo pela militância partidária companheira da figura pública;

  8. Sucesso eleitoral ocorre, e em sentido inverso o paulatino descolamento da militância partidária e da figura pública dos coletivos e movimentos;

  9. O esforço eleitoral torna-se esforço para manutenção no governo e com isso torna-se esforço para a defesa do estado;

  10. O esforço para a defesa do estado (E do capital) dinamitam a própria base partidária, mas também pontes da base partidária com o restante dos movimentos,grupos e lutas;

  11. A base partidária racha, restante da esquerda passa a incluir o partido como inimigo de classe,que se tornou de fato;

  12. A base partidária rachada se divide entre quem amplia sua burocratização e entre quem procura “refundar a esquerda”;

  13. Volte para o número um.

Serve pro PT, serve pro PSOL, serve pro Syriza e é expressionante como ninguém na esquerda partidária do “socialismo científico” investiga à vera os motivos e cria soluções.

Bem anarquistas tem suas análises sobre,mas anarquista é maluco,né?

Bakunin mandou muito bem aqui:

A razão principal porque todas as autoridades revolucionárias de todo o mundo fizeram sempre tão pouca revolução, é porque elas sempre quiseram fazê-la elas próprias, com a sua autoridade, e com a sua força, o que nunca deixou… de estreitar excessivamente a ação revolucionária, pois é impossível mesmo para a autoridade revolucionária mais inteligente, mais enérgica, mais franca, abraçar ao mesmo tempo muitas questões e interesses, sendo qualquer ditadura, tanto individual como coletiva, enquanto composta por vários personagens oficiais, necessariamente muito limitada, muito cega, e incapaz tanto de penetrar nas profundezas como de abraçar toda a amplidão da vida popular…”

A lógica de hierarquização presente, a reprodução da cultura hierárquica de fábrica ajuda a entender os processos de burocratização. Ah, não serve? A base teórica é anarquista e ofende marxistas? Porra, então por que não buscam investigar com a versão marxista?

Agora resta a pergunta: Com essa cagada do Tsipras e do Iglesias, carregados nos ombros pela esquerda europeia nas últimas eleições do parlamento europeu e usados como anabolizante eleitoral do PODEMOS ao Bloco de Esquerda de Portugal,a esquerda partidária mundial vai acordar pra vida como é derrota a dependência de figuras públicas?

A Resposta? Não.

Então fiquem ai com o aviso quando se decepcionarem outra vez: